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Turquia e Primavera Árabe

12 de setembro de 2011

À medida que se distancia e provoca Israel, premiê Recep Tayyip Erdogan sinaliza desejo de participar das mudanças trazidas pela Primavera Árabe. E de lucrar com elas. Porém seu estilo populista representa riscos.

Turkish Prime Minister Recep Tayyip Erdogan speaks during a meeting in Ankara, Turkey, Friday, May 6, 2011. Erdogan looms over Turkish political life, a combative figure with a gift for oratory who talks about building a "Great Turkey" by 2023, the country's 100th birthday. Some analysts believe he wants to stay in power until then, an outsized goal that raises concerns about democracy in NATO's biggest Muslim ally.(Foto:Burhan Ozbilici/AP/dapd)
Recep Tayyip Erdoğan visita vizinhos árabesFoto: dapd

Quem faz uma viagem está em busca de algo. Com o giro que se inicia nesta segunda-feira (12/09), o premiê da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, procura se aproximar dos países da assim chamada Primavera Árabe. Desde os revolucionários eventos, ele é o primeiro chefe de governo a viajar com grande comitiva pelo Egito, Tunísia e Líbia. Seus principais ministros o acompanham, em especial o chefe da diplomacia turca, Ahmet Davutoglu.

Este foi o arquiteto da política nacional de "Nada de problemas com os vizinhos". Foi ele quem inaugurou um novo capítulo da política no Oriente Médio em 2 de setembro último, ao declarar: "As relações israelo-turcas serão rebaixadas a um segundo nível. Todo pessoal acima desse segundo escalão de secretários deverá retornar a seu país de origem. Todos os acordos militares entre a Turquia e Israel serão suspensos".

"Perda da amizade"


Durante décadas, grande parte dos árabes olhou com extrema desconfiança para a Turquia. Em 1949 ela foi a primeira nação de maioria muçulmana a estabelecer relações diplomáticas com Israel; e desde meados dos anos 80 construiu uma parceria estratégica com o país.

Ambos os Estados colaboraram intensamente no combate ao terrorismo, em questões de segurança e armamentistas, e transformaram-se em parceiros econômicos próximos. A Turquia é, hoje, o terceiro maior destino de exportações israelenses: o volume de negócios entre os dois países alcança cerca de 3 bilhões de dólares anuais. Mas tudo indica que a era do crescimento constante chegou ao fim.

"Alcançamos um ponto", explicou Davutoglu, "em que Israel rejeitou todas as ofertas. Agora é hora de o governo israelense pagar o preço por se considerar acima da lei, e por realizar ações ilegais sem levar em consideração a consciência humana. O preço a ser pago é a perda da amizade turca."



Críticas a Israel

Desde essa declaração, o governo Erdogan segue colocando quase diariamente mais lenha na fogueira da escalada diplomática. O primeiro-ministro se ressente por Tel Aviv não ter se desculpado pela morte de nove ativistas pró-Gaza, nem pago indenização a seus familiares, e ataca:

"Até agora, Israel se comportou como uma criança mimada em relação às resoluções das Nações Unidas que lhe dizem respeito!". Em outras palavras: na opinião do chefe de governo turco, Tel Aviv ignora as resoluções do Conselho de Segurança da ONU e só conhece uma premissa: a própria segurança.

Há décadas, líderes de Estados árabes fazem as mesmas acusações. Contudo não dispunham de qualquer mecanismo contra Israel, cuja superioridade militar era enorme. Recep Tayyip Erdogan crê poder pressionar os israelenses com sanções e palavras fortes. E, além disso, joga a carta do patriotismo: "Quero enfatizar o seguinte: para a Turquia tanto faz se esse conflito vai custar 15 ou 150 milhões de dólares. Nossa dignidade e nosso orgulho não têm preço".

Redistribuição de cartas no Oriente Médio

Apenas três anos atrás, Erdogan agiu como mediador entre Israel e a Síria. Aí veio a guerra de Israel na Faixa de Gaza – para os turcos, de maneira totalmente inesperada. Ao ver rejeitado seu engajamento pelo processo de paz no Oriente Médio, o chefe de governo se sentiu também pessoalmente ofendido por Tel Aviv.

Contudo, a escalada direcionada destes dias tem sobretudo motivos políticos, estratégicos e econômicos. A Primavera Árabe vem se encarregando de redistribuir as cartas no Oriente Médio, analisa Huseyin Çelik, vice-presidente do partido AKP, que detém o governo da Turquia. "Israel teme a Primavera Árabe, teme a democratização do mundo islâmico. Israel não quer isso."

A Turquia deseja participar das revoluções nas nações árabes vizinhas, beneficiar-se delas do ponto de vista político e, sobretudo, econômico. Mas o curso escolhido por Erdogan também encontra opositores em Ancara.

O líder oposicionista Kemal Kilicdarogu acusa o governo turco de haver fracassado: a derrota frente a Israel no conflito de Gaza é o pior fiasco na política externa da República Turca, diz. E as supostas sanções do país não passam de manobra para impressionar a opinião pública.

Táticas populistas

"O senhor Erdogan encontrou um novo campo para exercitar seu populismo: a 'rua árabe'", afirma Kilicdarogu. Esta "se transformou em tema primordial para a política externa" do chefe de governo. "Mas não há como fazer política com as prioridades das ruas", adverte o oposicionista.

A invasão da embaixada israelense no Cairo, neste fim de semana, demonstrou do que é capaz a "rua" egípcia. O premiê da Turquia tem que atentar para – com seu jeito grosseiro e populista – não invocar fantasmas dos quais depois não conseguirá mais se livrar.

Há um bom tempo, muitos no Egito e na Líbia anseiam por um líder político capaz de harmonizar o islã e a democracia. Em seus anos de governo, o turco Erdogan tem conseguido bem esse feito.

Autoria: Reinhard Baumgarten (av)
Revisão: Carlos Albuquerque

Invasão da embaixada israelense no CairoFoto: AP
Ministro turco do Exterior, Ahmet DavutogluFoto: picture alliance/abaca
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