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Grito silencioso em memória do Holocausto

(sv)10 de maio de 2005

Quase duas décadas de controvérsia após o início dos debates a respeito, é inaugurado em Berlim o Memorial do Holocausto. As 2711 colunas espalhadas pelo arquiteto Peter Eisenman servem como metáfora do horror.

Eisenman: 'Simplicidade é o que provoca'Foto: AP

O temor dos que desde o início viam o projeto de um Memorial do Holocausto na capital alemã com reservas é o de que, daqui a alguns anos, hordas de turistas desavisados por ali circulem sem saber para que servem "aquelas colunas". Pois o destino de vários monumentos, ensina a História, é "petrificar-se com o tempo", perder-se na paisagem, sem que as pessoas que circulam ao redor saibam o porquê de sua existência.

Espetáculo de mídia?

Memorial do Holocausto: retratos de vítimasFoto: dpa

Hoje, no dia de sua inauguração, o Memorial aos judeus mortos durante o Holocausto da Segunda Guerra ocupa o centro das atenções de uma Alemanha que, oficialmente, procura retratar-se. "Intermediação da mídia e representação estética escorregaram para o primeiro plano", analisa o diário Frankfurter Rundschau.

"Será que vai ser um lugar para onde as visitas oficiais serão levadas?", pergunta o jornal berlinense taz. Ou o Memorial deverá ser, a partir de agora, o concreto sobre o qual o turista vai tropeçar quando estiver dando voltas por Berlim e passar automaticamente pelo espaço situado nas proximidades do Portão de Brandemburgo, Potsdamer Platz e Reichstag?

Construção de um não-lugar

Foram 17 anos de críticas, debates, escândalos e concessões ao que o mainstream político permitiu. O resultado é um lugar construído, quase um não-lugar, uma lembrança dedicada aos judeus assassinados e não um registro das barbaridades em si.

Em 90 mil metros quadrados, 2711 colunas. A cor, o cinza escuro. A referência automática, um cemitério, mesmo que esta associação seja revidada por Eisenman. "A simplicidade é talvez o que provoca", assinala o arquiteto.

Personificação do horror

Memorial do HolocaustoFoto: dpa

No subterrâneo, ao qual se chega através de uma escada que se encontra quase "de repente", o Centro de Informações. Nenhuma placa, nenhuma indicação. Na entrada, seis rostos, com nomes e origem, personificam de forma direta a morte dos seis milhões de judeus. As cores: preto, branco e cinza. São quatro espaços quadrados.

"É um grito silencioso no espaço climatizado. As imagens são relativamente pequenas, há poucos registros das montanhas de cadáveres, quase nada do horror das câmaras de gás, dos tiros, dos espancamentos, enforcamentos, torturas até a morte. À abstração do Memorial corresponde uma certa decência da documentação", observa o diário Der Tagesspiegel.

Um banco de dados dispõe cerca de 700 biografias, uma amostra do total de seis milhões de vítimas da Shoa. A partir do momento em que estes indivíduos, com seus nomes e dados biográficos – idade, profissão, estado civil e condições em que morreram – são extraídos do todo, o visitante se vê confrontado com histórias individuais, pessoais. "As biografias foram escolhidas ao acaso, mas respeitam um certo sistema. Elas espelham a estrutura das nacionalidades das vítimas judias. Isso significa que metade das biografias ali apresentadas é de judeus poloneses", conta o historiador Jürgen Lillteicher, responsável pela escolha.

Dimensões da memória

Para o visitante que circula entre as colunas e depois desce "aos porões", a existência do Memorial provoca, como descreve o diário Der Tagesspiegel, "uma pequena viagem: do nós até o eu. Visto de fora, o Memorial é dominado pela massa pura, por suas dimensões, pela amplitude do campo de colunas em cinza escuro. Neste momento, a percepção tende a ser coletiva, abstrata, geral – não importa se gostando ou não da arquitetura de Eisenman. Dentro, o indivíduo entra em contato com as lembranças individuais".

O filósofo italiano Giorgio Agamben, em texto publicado sobre o Memorial no semanário Die Zeit, vê o mérito da obra de Eisenman exatamente "no limiar entre as duas dimensões topográficas: uma sobre o solo, exposta, mas na qual nada se lê. E outra subterrânea, onde se tem acesso à leitura".

Estetização da História

Memorial do Holocausto pouco antes da inauguraçãoFoto: dpa

Outra preocupação dos críticos avessos à existência do Memorial é o medo de que os cenários originais dos horrores do Holocausto fiquem esquecidos, quase "às moscas", como denunciam alguns. E isso sem esquecer que muitos deles ficam às portas de Berlim, como Sachsenhausen. "Não seria apenas lamentável, mas escandaloso, se os outros pequenos memoriais que existem nos cenários originais, a longo prazo, viessem a pagar o preço pela construção do Memorial em Berlim", observou Paul Spiegel, presidente do Conselho Central dos Judeus na Alemanha.

Outras questões vêm inevitavelmente à tona: Será o Memorial uma forma de representar publicamente a culpa, como forma de selar o passado de "normal"? Trata-se de expor a História, para dela se livrar? "As lembranças dos sobreviventes do nazismo desaparecem. A lembrança imediata do vivido é midiatizada. A História se transforma em imagem. Com o Memorial do Holocausto os cenários originais e os campos de concentração perdem em interesse. O espaço urbano encenado passa a ocupar, para muitos, o lugar dos cenários originais. A História é estetizada", conclui o diário taz.

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