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HistóriaPolônia

Há 40 anos Polônia silenciava a oposição com lei marcial

Jacek Lepiarz
13 de dezembro de 2021

Ascensão do movimento sindical anticomunista Solidariedade levou general Wojciech Jaruzelski a restringir drasticamente os direitos dos cidadãos em 1981. Milhares foram detidos e condenados por tribunais militares.

Tanque de guerra em rua de Varsóvia, capital da Polônia, poucos dias depois de o chefe de governo, Wojciech Jaruzelski, declarar a lei marcial para controlar a ascensão do movimento sindical anticomunista Solidarność no país, em 1981.
Tanques tomaram as ruas cheias de neve de Varsóvia após decreto da lei marcialFoto: AP

O dia 13 de dezembro de 1981 foi um domingo frio e ensolarado em Varsóvia, bom para um passeio pela cidade. Mas quem saiu de casa naquele dia, seja para ir à igreja – era o terceiro domingo do advento, de contagem regressiva até o Natal –, patinar no gelo com as crianças ou comprar o jornal, deu meia-volta assustado.

Em vez de carros e ônibus, tanques de guerra circulavam pelas ruas cheias de neve da capital polonesa. Soldados armados vigiavam prédios do governo e outros locais estratégicos. Milicianos controlavam veículos e transeuntes. Quem foi encontrado com panfletos na bolsa foi detido.

Telefones mudos e general na TV

Mais tarde, aqueles que tentaram contatar amigos pelo telefone perceberam que todas as conexões tinham sido cortadas. À procura de informações pela televisão, o que se viu foi um general: o então chefe de governo Wojciech Jaruzelski, que anunciou a lei marcial (entrada em vigor de leis militares) em sua fala.

"Nossa pátria está à beira do abismo", vociferou o político e militar. "Não são dias, mas apenas horas que nos separam de uma catástrofe de dimensões nacionais", afirmou, para justificar sua decisão. O então chefe de governo culpou o movimento sindical de oposição Solidariedade (Solidarność) pela ameaça de declínio da Polônia.

A onda de greves no litoral polonês do Mar Báltico, em meados de 1980, levou ao reconhecimento do sindicato Solidarność, capitaneado por Lech Walesa, e criou uma espécie de dupla liderança na Polônia.

O movimento nacional, que não tardou a contar com dez milhões de membros e não escondia sua postura anticomunista, conseguiu ampliar seus poderes gradualmente por meio de greves e protestos. Mais tarde, jornalistas chamariam o período de "Carnaval da Liberdade".

Confronto entre polícia e manifestantes em 1982. Lei marcial vigorou até 1983Foto: picture-alliance/ dpa

Enfraquecida e dividida, a legenda comunista governista Partido Operário Unificado Polonês (PZPR) recuava cada vez mais, mas não estava disposta a dividir o poder com a oposição, muito menos de entregar as rédeas do país.

Para amenizar os gargalos de fornecimento, o governo voltou a distribuir cupons de alimentos, como durante a Segunda Guerra Mundial – em vão. As imagens de lojas com prateleiras vazias e de pessoas que traziam papel higiênico para casa como grande troféu se tornaram os tristes ícones da miséria econômica da época.

Camaradas poloneses suscitam a ira de Moscou

Os camaradas em Moscou fizeram questão de deixar clara sua insatisfação com os poloneses. Manobras conjuntas das tropas do Pacto de Varsóvia (aliança militar formada pelos países socialistas do Leste Europeu e liderada pelo Partido Comunista Soviético) em dezembro de 1980 e em março e abril do ano seguinte serviram de ferramenta de pressão sobre o governo polonês e lembraram – talvez propositadamente – a invasão à Tchecoslováquia em 1968, durante a qual a então União Soviética reprimiu a chamada Primavera de Praga, época em que foram introduzidas mais liberdades no país integrante do antigo bloco soviético.

"Precisamos pressionar constantemente", disse Leonid Brejnev, secretário-geral do Partido Comunista da União Soviética, segundo protocolo do politburo (comitê executivo da agremiação) datado de 16 de abril de 1981. Até hoje, porém, historiadores divergem sobre a questão se Moscou estava realmente disposta a invadoir a Polônia para intimidar os camaradas em Varsóvia.

Uma vez que ficou evidente que o partido fracassou ao tentar controlar o Solidarność, chegou a hora dos militares. Primeiro, Jaruzelski foi nomeado chefe de governo. Mais tarde, assumiu também a liderança do partido e concentrou todo o poder em suas mãos, ocupando todos os postos estratégicos da administração com homens de uniforme de sua confiança.

Golpe contra o Solidariedade

Na madrugada de 13 de dezembro de 1981, o Conselho Militar de Salvação Nacional (WRON, na sigla em polonês) assumiu o poder na Polônia. Para acabar com a resistência da oposição, 70 mil soldados com 1.750 tanques de guerra e mais 30 mil milicianos foram mobilizados nacionalmente.

Nas primeiras horas após a entrada em vigor do estado de guerra, 3 mil ativistas do Solidarność, incluindo quase toda a liderança do movimento, com Lech Walesa à frente, foram detidos.

Foram proibidos os direitos à greve e a liberdade de associação e introduziu-se um toque de recolher. O Solidarność foi proibido e, mais tarde, dissolvido.

Apesar do efeito surpresa, o Solidarność conseguiu mobilizar ativistas em algumas empresas para defendê-las do avanço de unidades militares e de milícias. Os piores confrontos começaram em 16 de dezembro de 1981 pela mina de carvão Wujek, na cidade industrial de Katowice. Durante a invasão do local, nove mineiros foram mortos a tiros.

Vitória ostensiva dos militares

A Junta militar conseguiu neutralizar rapidamente o Solidarność como movimento de massas anticomunista, restabelecendo o poder do antigo sistema. Até o fim de 1982, cerca de 10 mil pessoas foram detidas e quase 12 mil condenadas por tribunais militares. A lei marcial foi revogada em julho de 1983.

O general Wojciech Jaruzelski ao impor lei marcial em fala pela televisão, em 1981Foto: picture-alliance/ dpa

O país caiu numa estagnação tanto econômica quanto social. Centenas de milhares de jovens poloneses e polonesas viraram as costas para o país e emigraram, especialmente para a Alemanha. A dívida externa subiu para a então gigantesca soma de 40 milhões de dólares. O país estava praticamente falido e isolado politicamente.

Além disso, vários assassinatos políticos como o do padre Jerzy Popiełuszko, morto por funcionários do Ministério do Interior, abalaram a opinião pública polonesa.

Gorbatchov entra em cena

Foram apenas as mudanças no palco político mundial que trouxeram esperança. As políticas de abertura (Glasnost) e de reconstrução (Perestroika) do reformista Mikhail Gorbatchov, líder no Kremlin desde 1985, voltaram a abrir margem de manobra para a oposição polonesa.

Duas ondas de greve em 1988 mostraram que o Solidarność havia sido esmagado, mas não vencido. Uma nova geração de trabalhadores resistia ao poder estatal. A percepção levou a diálogos na chamada Mesa Redonda e à primeira eleição parlamentar parcialmente livre em todo o bloco soviético em 1989.

Quase oito anos após sua detenção, o intelectual Tadeusz Mazowiecki, conselheiro do Solidarność, foi eleito primeiro-ministro da Polônia. Um ano depois, o herói dos trabalhistas, Lech Walesa, se tornou presidente.

Traidor ou herói?

Até sua morte, em 2014, políticos e historiadores discutiram o papel de Jaruzelski. Muitos viram nele um traidor da pátria que mandou tanques e soldados contra o próprio povo para salvar o poder do partido. Outros o celebravam como um herói que salvou o país de uma invasão soviética e, assim, de um banho de sangue.

Em 2011, Lech Walesa visitou o general gravemente doente no hospital e deu-lhe a mão. Não se sabe se ele o perdoou. Em entrevista à DW, Walesa disse que Jaruzelski também foi um patriota que queria salvar seu país dos soviéticos – mas à sua própria maneira. "Não lutei contra Jaruzelski, contra a segurança do Estado ou contra agentes. Lutei contra o sistema", afirmou Walesa.

Em seu livro Envelheci 30 anos, em tradução livre, Jaruzelski escreveu: "Peço desculpas pelas consequências radicais do estado de guerra (...). Mas foi a única saída e ela fez sentido. Foi o menor dos males – mas mesmo esse tipo de mal é sempre ruim."

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