Onze atletas israelenses e um policial morreram no ataque de terroristas palestinos aos Jogos Olímpicos de Munique em 5 de setembro de 1972. Ninguém assumiu a responsabilidade pela desastrosa tentativa de libertação.
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Ainda hoje Hans Völkl tem calafrios quando ouve o barulho de rotores. Eles despertam em sua memória o ruído dos dois helicópteros Bell-UH 1 que o sobressaltaram na noite de 5 de setembro de 1972.
Na época, Völkl era soldado da Bundeswehr, as Forças Armadas alemãs, e estava estacionado na base aérea de Fürstenfeldbruck, perto de Munique. No turno da noite na torre, sua missão era atender os pilotos que pousavam.
O então jovem de 21 anos acompanhou pela televisão o drama na Vila Olímpica, a apenas 20 quilômetros dali. Naquela manhã, terroristas palestinos invadiram os aposentos da equipe olímpica israelense. Após matar a tiros o halterofilista Josef Romano e o treinador de luta livre Mosche Weinberg, raptaram outros nove israelenses.
Horas de medo na Vila Olímpica
À noite, os oito terroristas e seus nove reféns se encontravam em dois helicópteros. Os raptores não haviam conseguido o cumprimento de sua exigência, de libertar correligionários presos em Israel e na Alemanha.
Após horas de negociações, o então ministro do Interior alemão, Hans-Dietrich Genscher, prometeu-lhes passagem segura para a capital egípcia, Cairo. Helicópteros os levariam até o aeroporto de Riem, onde um avião de passageiros estaria esperando por eles.
Em vez disso, no entanto, os pilotos da Polícia de Fronteiras os levaram para a base aérea da Bundeswehr em Fürstenfeldbruck. Lá, como Völkl lembrou em entrevista à DW, os helicópteros emergiram de uma parede de neblina por volta das 22h30 e pousaram bem em frente a sua janela.
Fiasco da tentativa de resgate
Lá, a força-tarefa policial decidira que franco-atiradores matariam os terroristas e libertariam os reféns. Mas o plano deu errado: os sequestradores revidaram os tiros. Do lado alemão, completa confusão, nunca antes se havia treinado a libertação de reféns. Os policiais não tinham contato por rádio, alguns chegaram a ficar sob o fogo dos colegas.
Völkl e seus camaradas da Bundeswehr sequer foram informados de que os terroristas e seus reféns estavam chegando: "Fomos envolvidos porque estávamos no turno da noite. Ninguém nos disse nada antes."
Völkl procurou cobertura num nicho do aquecedor, enquanto as balas assobiavam no ar. A poucos metros dele, um ricochete atingiu um policial, Anton Fliegerbauer: "Lá estava ele, caído. As paredes estavam cobertas de lascas de ossos. Um tiro na cabeça."
Ataque à "celebração da paz"
Rajadas de fogo ecoaram pelo aeródromo até meia-noite. Em seguida, uma explosão. Um terrorista havia lançado uma granada num dos helicópteros, contra os reféns ainda amarrados. Quando o dia amanheceu, ficou claro: além do policial Fliegerbauer, haviam morrido cinco terroristas. E nenhum dos reféns israelenses sobrevivera.
Com os Jogos Olímpicos de Munique, a Alemanha queria mostrar ao mundo uma cara de simpatia. O evento esportivo deveria ser uma "celebração da paz", apenas 27 anos após o fim da Segunda Guerra Mundial e o assassinato de 6 milhões de judeus pelos alemães. Mas agora judeus voltavam a ser mortos em solo alemão − e o Estado não fora capaz de protegê-los.
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Quarenta anos de silêncio
Após um dia de descanso e uma cerimônia fúnebre, as competições olímpicas em Munique prosseguiram. Não houve pedido de desculpas por parte de políticos ou da polícia pelo fiasco de Fürstenfeldbruck. Nenhuma comissão de inquérito foi criada, ninguém assumiu a responsabilidade pela libertação fracassada, ou por não aceitar ajuda de especialistas israelenses.
Os parentes das vítimas tiveram que lutar por décadas para ter acesso aos arquivos da investigação, e até hoje ainda lutam por uma indenização maior. E querem ficar longe de uma cerimônia do 50º aniversário em Munique.
"As testemunhas, as vítimas e suas famílias foram tratadas quase como aqueles parentes chatos da casa dos fundos", resume Ludwig Spaenle. Encarregado de assuntos de antissemitismo da Baviera, ele está empenhado em processar a memória do ataque. Na época, a Alemanha fracassou diante do terrorismo.
"O que aconteceu depois também é uma falha dramática do Estado", afirma à DW. "Fez-se questão de esquecer as coisas muito rapidamente, calar sobre o assunto. E não se criou uma memória pública." Só há apenas cerca de dez anos houve esforços para reavaliar e recordar, por exemplo com um memorial no Parque Olímpico.
O trauma é suprimido
De volta à normalidade o mais rápido possível: isso também se aplica a Völkl em 1972. As operações de voo foram retomadas em Fürstenfeldbruck, enquanto os destroços ainda estavam diante da torre, lembra . Não houve atendimento psicológico, os médicos costumavam recomendar um copo de conhaque para superar o choque.
"A pessoa tenta recalcar experiências traumáticas assim", diz Anna Ulrike Bergheim. Há anos, a presidente da Associação Histórica de Fürstenfeldbruck procura testemunhas do assassinato, e foi assim que encontrou Hans Völkl. Percorrendo os corredores da torre da base aérea, ela consegue dizer os nomes de quase todos os ocupantes dos cômodos na madrugada de 6 de setembro de 1972.
"Definitivamente, quem estava lá não conseguiu processar o que aconteceu. Muitas testemunhas da época só estão aparecendo agora, porque só agora estão prontas para falar sobre isso." Não apenas os parentes das vítimas foram negligenciados por muito tempo, diz Bergheim.
"Em 50 anos, o lado oficial nunca se preocupou com quem estava lá naquela noite: policiais, membros da força aérea, bombeiros que foram alvejados enquanto apagavam o fogo. Em 50 anos, nenhum deles foi jamais indagado: como você está mesmo lidando com essa lembrança?"
Hoje, Hans Völkl fala publicamente sobre suas experiências naquela noite. Por exemplo, sobre como viu os corpos de André Spitzer e Yossef Gutfreund nos helicópteros com as mãos algemadas.
Ele não procurou contato com os familiares das vítimas, pois não quer se intrometer. Mas se alguém toca no assunto com ele, isso é outra coisa: mesmo 50 anos após o massacre em Munique, ainda há muito a ser dito.
A longa história do processo de paz no Oriente Médio
Por mais de meio século, disputas entre israelenses e palestinos envolvendo terras, refugiados e locais sagrados permanecem sem solução. Veja um breve histórico sobre o conflito.
Foto: PATRICK BAZ/AFP/Getty Images
1967: Resolução 242 do Conselho de Segurança da ONU
A Resolução 242 do Conselho de Segurança das Nações Unidas, aprovada em 22 de novembro de 1967, sugeria a troca de terras pela paz. Desde então, muitas das tentativas de estabelecer a paz na região referiram-se a ela. A determinação foi escrita de acordo com o Capítulo 6 da Carta da ONU, segundo o qual as resoluções são apenas recomendações e não ordens.
Foto: Getty Images/Keystone
1978: Acordos de Camp David
Em 1973, uma coalizão de Estados árabes liderada pelo Egito e pela Síria lutou contra Israel no Yom Kippur ou Guerra de Outubro. O conflito levou a negociações de paz secretas que renderam dois acordos 12 dias depois. Esta foto de 1979 mostra o então presidente egípcio Anwar Sadat, seu homólogo americano Jimmy Carter e o premiê israelense Menachem Begin após assinarem os acordos em Washington.
Foto: picture-alliance/AP Photo/B. Daugherty
1991: Conferência de Madri
Os EUA e a ex-União Soviética organizaram uma conferência na capital espanhola. As discussões envolveram Israel, Jordânia, Líbano, Síria e os palestinos – mas não da Organização para a Libertação da Palestina (OLP) –, que se reuniam com negociadores israelenses pela primeira vez. Embora a conferência tenha alcançado pouco, ela criou a estrutura para negociações futuras mais produtivas.
Foto: picture-alliance/dpa/J. Hollander
1993: Primeiro Acordo de Oslo
Negociações na Noruega entre Israel e a OLP, o primeiro encontro direto entre as duas partes, resultaram no Acordo de Oslo. Assinado nos EUA em setembro de 1993, ele exigia que as tropas israelenses se retirassem da Cisjordânia e da Faixa de Gaza e que uma autoridade palestina autônoma e interina fosse estabelecida por um período de transição de cinco anos. Um segundo acordo foi firmado em 1995.
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2000: Cúpula de Camp David
Com o objetivo de discutir fronteiras, segurança, assentamentos, refugiados e Jerusalém, o então presidente dos EUA, Bill Clinton, convidou o premiê israelense Ehud Barak e o presidente da OLP Yasser Arafat para a base militar americana em julho de 2000. No entanto, o fracasso em chegar a um consenso em Camp David foi seguido por um novo levante palestino, a Segunda Intifada.
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2002: Iniciativa de Paz Árabe
Após Camp David, seguiram-se encontros em Washington e depois no Cairo e Taba, no Egito – todos sem resultados. Mais tarde, em março de 2002, a Liga Árabe propôs a Iniciativa de Paz Árabe, convocando Israel a se retirar para as fronteiras anteriores a 1967 para que um Estado palestino fosse estabelecido na Cisjordânia e em Gaza. Em troca, os países árabes concordariam em reconhecer Israel.
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2003: Mapa da Paz
Com o objetivo de desenvolver um roteiro para a paz, EUA, UE, Rússia e ONU trabalharam juntos como o Quarteto do Oriente Médio. O então primeiro-ministro palestino Mahmoud Abbas aceitou o texto, mas seu homólogo israelense Ariel Sharon teve mais reservas. O cronograma previa um acordo final sobre uma solução de dois estados a ser alcançada em 2005. Infelizmente, ele nunca foi implementado.
Foto: Getty Iamges/AFP/J. Aruri
2007: Conferência de Annapolis
Em 2007, o então presidente dos EUA George W. Bush organizou uma conferência em Annapolis, Maryland, para relançar o processo de paz. O premiê israelense Ehud Olmert e o presidente da ANP Mahmoud Abbas participaram de conversas com autoridades do Quarteto e de outros Estados árabes. Ficou acordado que novas negociações seriam realizadas para se chegar a um acordo de paz até o final de 2008.
Foto: picture-alliance/dpa/S. Thew
2010: Washington
Em 2010, o enviado dos EUA para o Oriente Médio, George Mitchell, convenceu o premiê israelense, Benjamin Netanyahu, a implementar uma moratória de 10 meses para assentamentos em territórios disputados. Mais tarde, Netanyahu e Abbas concordaram em relançar as negociações diretas para resolver todas as questões. Iniciadas em setembro de 2010, as negociações chegaram a um impasse dentro de semanas.
Foto: picture-alliance/dpa/M. Milner
Ciclo de violência e cessar-fogo
Uma nova rodada de violência estourou dentro e ao redor de Gaza no final de 2012. Um cessar-fogo foi alcançado entre Israel e os que dominavam a Faixa de Gaza, mas quebrado em junho de 2014, quando o sequestro e assassinato de três adolescentes em mais violência. O conflito terminou com um novo cessar-fogo em 26 de agosto de 2014.
Foto: picture-alliance/dpa
2017: Conferência de Paris
A fim de discutir o conflito entre israelenses e palestinos, enviados de mais de 70 países se reuniram em Paris. Netanyahu, porém, viu as negociações como uma armadilha contra seu país. Tampouco representantes israelenses ou palestinos compareceram à cúpula. "Uma solução de dois Estados é a única possível", disse o ministro francês das Relações Exteriores Jean-Marc Ayrault, na abertura do evento.
Foto: Reuters/T. Samson
2017: Deterioração das relações
Apesar de começar otimista, o ano de 2017 trouxe ainda mais estagnação no processo de paz. No verão do hemisfério norte, um ataque contra a polícia israelense no Monte do Templo, um local sagrado para judeus e muçulmanos, gerou confrontos mortais. Em seguida, o plano do então presidente dos EUA, Donald Trump, de transferir a embaixada americana para Jerusalém minou ainda mais os esforços de paz.
Foto: Reuters/A. Awad
2020: Tiro de Trump sai pela culatra
Trump apresentou um plano de paz que paralisava a construção de assentamentos israelenses, mas mantinha o controle de Israel sobre a maioria do que já havia construído ilegalmente. O plano dobrava o território controlado pelos palestinos, mas exigia a aceitação dos assentamentos construídos anteriormente na Cisjordânia como território israelense. Os palestinos rejeitaram a proposta.
Foto: Reuters/M. Salem
2021: Conflito eclode novamente
Planos de despejar quatro famílias palestinas e dar suas casas em Jerusalém Oriental a colonos judeus levaram a uma escalada da violência em maio de 2021. O Hamas disparou foguetes contra Israel, enquanto ataques aéreos militares israelenses destruíram prédios na Faixa de Gaza. A comunidade internacional pediu o fim da violência e que ambos os lados voltem à mesa de negociações.
Foto: Mahmud Hams/AFP
2023: Terrorismo do Hamas e retaliações de Israel
No início da manhã de 7 de outubro, terroristas do grupo radical islâmico Hamas romperam barreiras em alguns pontos da Faixa de Gaza, na fronteira com Israel, e, em território israelense, feriram e mataram centenas de pessoas, além de sequestrarem mais de uma centena. Devido a isso, Israel declarou "estado de guerra" e iniciou uma série de bombardeios, deixando partes da Cidade de Gaza em ruínas.