Em 1963, o então presidente dos EUA realizou uma visita histórica a Berlim. Dois anos após a construção do muro, seu discurso com a famosa frase "ich bin ein Berliner" despertou esperança do fim da divisão.
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A visita do então presidente dos Estados Unidos, John F. Kennedy, era ansiosamente aguardada na Alemanha em junho de 1963. As relações diplomáticas com os EUA haviam sofrido abalos desde que ele assumira o cargo, em 1961, em particular por causa da decisão de agir com comedimento em relação à União Soviética – uma decisão política cujas consequências foram sentidas diretamente em Berlim.
Ainda assim, foi enorme o alvoroço durante a chegada do americano à antiga Berlim Ocidental, no quarto dia de sua visita à Alemanha, após passar por Frankfurt, Wiesbaden, Colônia e pela então capital, Bonn. Mais de um milhão de pessoas saudaram o presidente em 26 de junho de 1963.
Kennedy era uma bastião de esperança. Sua visita oficial ocorreu no 15º aniversário do início da ponte aérea que transportava mantimentos para a cidade isolada – missão pela qual a população de Berlim mostrava sua gratidão.
Com o chamado bloqueio de Berlim, a União Soviética rompeu as linhas de abastecimento para o lado ocidental da cidade em 24 de junho de 1948. Com isso, Moscou almejava obter poder sobre a parte ocupada pelos Aliados do Ocidente após a Segunda Guerra Mundial. Mas, no mesmo dia, os Aliados, liderados pelos americanos, criaram a ponte aérea, por meio da qual aviões militares – apelidados pelos berlinenses de Rosinenbomber (bombardeiros de uvas-passas) – abasteciam a cidade de mais de 2 milhões de habitantes.
Esperança e gratidão
O apelido dado aos aviões surgiu em razão de, antes de pousarem, as tripulações jogarem pequenos pacotes com doces, chicletes e uvas-passas para as crianças que os aguardavam. O bloqueio durou até 12 de maio de 1949.
Quando Kennedy chegou a Berlim, a situação política havia ganhado contornos inesperados. Berlim Ocidental estava cercada por um muro. Os berlinenses associavam a visita do americano à esperança por liberdade e pelo fim da divisão que separava famílias e amigos. Sua presença era um sinal de que os EUA não iriam abandonar a cidade.
Até então, pairavam algumas dúvidas a respeito disso. Em agosto de 1961, o recém-eleito presidente Kennedy não interviu quando a União Soviética iniciou a construção do Muro de Berlim. Historiadores avaliam que o americano temia o perigo de uma guerra nuclear e considerava o líder soviético Nikita Kruschev imprevisível.
Antes de seu famoso discurso em frente à prefeitura em Schöneberg, que à época era a residência oficial do prefeito de Berlim e futuro chanceler federal alemão Willy Brandt, Kennedy realizou um desfile triunfal pela cidade em carro aberto, ao lado de Brandt e do então chanceler federal, Konrad Adenauer, sendo aclamado pela multidão.
Em um palco erguido em frente à entrada do edifício, Kennedy agradeceu a Adenauer e Brandt e fez uma homenagem ao general americano Lucius D. Clay, que atuou como governador militar da zona de ocupação americana em Berlim e foi o responsável pela ponte aérea, pela qual o presidente foi aplaudido efusivamente.
Kennedy, então, pronunciou a frase que entrou para os livros de história: "Hoje, no mundo livre, a frase de maior orgulho que alguém pode dizer é: 'Ich bin ein Berliner' (eu sou um berlinense)." A multidão aplaudiu e respondeu aos gritos de "Kennedy, Kennedy". E uma faixa foi erguida com a pergunta: "Quando cairá o muro?"
Ao pronunciar a frase histórica, Kennedy fazia uma menção ao filósofo e político romano Marco Cícero, que cunhou a expressão "eu sou um romano". Enquanto Cícero queria destacar que os habitantes de Roma gozavam de direitos especiais, a intenção de Kennedy era expressar solidariedade ilimitada a Berlim Ocidental.
A ideia de utilizar a frase no discurso teria vindo do próprio Kennedy alguns dias antes na Casa Branca, que inicialmente a diria em inglês, mas acabou ficando de fora do manuscrito de seu redator de discursos. No caminho para Berlim, Kennedy escreveu a transcrição fonética das palavras em alemão, para pronunciá-las corretamente: "Ish bin ein Bearleener".
"Nunca precisamos de um muro para conter nossos cidadãos"
Em seu discurso, o americano destacou Berlim Ocidental como uma ilha de liberdade cheia de força de vontade. Quem alegava que o comunismo não representava perigo, ou que seria o sistema político do futuro, deveria vir a Berlim, afirmou.
"A liberdade possui muitas dificuldades, e a democracia não é perfeita. Mas nunca tivemos que construir um muro para conter nossos cidadãos, para impedir que nos deixassem", disse o presidente.
A construção do muro foi a reação da União Soviética ao êxodo em massa de cidadãos da antiga Alemanha Oriental (República Democrática Alemã, RDA). Estima-se que 2,8 milhões de pessoas tenham deixado a RDA rumo à Alemanha Ocidental entre 1949 e 1961, em razão de perseguições políticas ou pela falta de perspectivas econômicas.
Kennedy mencionou o destino das famílias separadas pela construção do muro, e repetiu a frase histórica ao final de seu discurso. "Todos os homens livres, onde quer que vivam, são cidadãos de Berlim. Assim sendo, como homem livre, eu me orgulho destas palavras: 'Eu sou um berlinense'."
Kennedy foi assassinado no mesmo ano de sua visita à Alemanha, em 22 de novembro de 1963, em Dallas, no estado do Texas. Os fatos por trás do atentado até hoje não foram esclarecidos. Inúmeros arquivos sobre o caso são mantidos em sigilo.
Após a visita de Kennedy, ainda demorou 26 anos para que o Muro de Berlim fosse derrubado.
O Muro de Berlim, uma história em fotografias
A 13 de agosto de 1961, guardas da Alemanha Oriental começaram a fechar com arame farpado e concreto a fronteira que separava as partes oriental e ocidental de Berlim, bem como Berlim Ocidental da Alemanha Oriental.
Foto: AP
RDA é hoje pura nostalgia
Diante do Museu de Checkpoint Charlie e fantasiado de guarda de fronteira da RDA, o berlinense Wolfgang Kolditz carimba – com um carimbo postal original da Alemanha comunista – os cartões e lembranças comprados pelos turistas, dez anos após a queda do Muro. Naquele local esteve o mais famoso posto de controle, conhecido em todo o mundo através de inúmeros filmes sobre espionagem e a Guerra Fria.
Foto: AP
Onde foi?
Hoje, pouco resta da histórica muralha que separou dois Estados alemães por tanto tempo.
Foto: DW
Os 'pica-paus' do Muro
Depois do dia 9 de novembro de 1989 foi apenas uma questão de meses até que o Muro desaparecesse inteiramente da paisagem de Berlim. Ficaram famosos na época os chamados 'pica-paus' do Muro: berlinenses e turistas que, armados de martelo e cunha, arrancaram pedaços da muralha para guardar de lembrança. Por muito tempo, lojas de suvenires em Berlim ofereceram lascas de concreto com um duvidoso 'certificado de autenticidade'.
Foto: AP
A dança sobre o Muro
No dia 10 de novembro de 1989, berlinenses orientais e ocidentais confraternizaram-se com uma verdadeira dança sobre o Muro, que deixara de ser uma barreira desde a noite anterior. Ao fundo, o Portão de Brandemburgo – o símbolo de Berlim. Com as fronteiras abertas, milhares de cidadãos alemães orientais viajaram imediatamente à parte ocidental da Alemanha, para fazer compras, visitar parentes e amigos ou simplesmente para satisfazer a curiosidade pessoal.
Foto: AP
A confusão histórica
Durante uma entrevista coletiva no dia 9 de novembro de 1989, o jornalista e membro do politburo do SED – Partido Socialista Unificado – Günter Schabowski, interpretou erroneamente um comunicado oficial do governo da Alemanha Oriental, anunciando a abertura das fronteiras entre as duas partes da Alemanha. Poucas horas depois, a pressão popular fez com que a guarda de fronteiras da RDA abrisse o Muro de Berlim.
Foto: dpa
O fim de uma carreira
Poucas semanas após as festividades comemorativas do 40º aniversário da República Democrática Alemã, o chefe de Estado e de partido Erich Honecker foi destituído de todas as suas funções. A pressão dos protestos populares e as fugas em massa da RDA fizeram com que os comunistas mais jovens ainda tentassem salvar o regime, depondo a liderança conservadora. A rebelião palaciana não trouxe o efeito desejado: os protestos continuaram, culminando com a queda do Muro de Berlim.
Foto: dpa
A festa final
Com a presença do convidado especial – o chefe de Estado e de partido da União Soviética, Mikhail Gorbachev – foi comemorado no dia 7 de outubro de 1989 o 40º aniversário da República Democrática Alemã. Para irritação da liderança comunista da RDA, Gorbachev advertiu para a urgência de reformas no país.
Foto: dpa
Plataforma para pichações
Em toda a sua extensão, o Muro de Berlim tornou-se uma plataforma de pichações no lado ocidental. Com lemas políticos ou meros desenhos, milhares de berlinenses e de turistas lançaram mão dos aerossóis para deixar uma mensagem colorida sobre o concreto. Como a profecia que se vê na foto: 'Berlim ficará livre do Muro'.
Foto: AP
Propaganda dos dois lados
Em outubro de 1964, foi posto um cartaz (à esq.) no lado oriental de Berlim com os dizeres: 'Acordos sobre salvo-condutos são melhores que provocações'. Poucos dias depois, foi afixada nas proximidades a resposta ocidental: 'O Muro continuará sendo uma provocação, mesmo com salvo-condutos!'.
Foto: AP
A fuga com um balão
Na noite de 16 para 17 de setembro de 1979, duas famílias da Alemanha Oriental lograram uma fuga sensacional. Os casais Strelzik e Wetzel, com seus quatro filhos em idade entre dois e 15 anos, conseguiram cruzar a fronteira em direção à Alemanha Federal a bordo de um balão de ar quente, que eles próprios construíram às escondidas, durante meses de trabalho. O balão pousou de madrugada em Naila, na Baviera, sem chamar a atenção dos guardas de fronteira.
Foto: dpa
Um túnel por baixo do Muro
No final de 1963, um grupo reunido pelo ator Wolfgang Fuchs, do qual fazia parte o estudante Klaus-Michael von Keussler (foto), iniciou a construção de um túnel sob o Muro de Berlim. Durante dez meses foi escavado um subterrâneo de 145 metros de extensão, 80 centímetros de altura e numa profundidade de até 12 metros. Nos dias 3 e 4 de outubro de 1964, um total de 57 pessoas conseguiu fugir da RDA, antes que a polícia descobrisse e fechasse o túnel, no dia seguinte.
Foto: dpa
A última oportunidade
No dia em que foi iniciada a divisão de Berlim, o domingo 13 de agosto de 1961, e nos dias subsequentes registraram-se cenas dramáticas como a da foto. Uma mulher tenta saltar da janela de uma casa do lado oriental para fugir para a parte ocidental de Berlim. Um policial tenta puxá-la de volta, enquanto berlinenses ocidentais procuram apoiá-la na fuga, que acaba obtendo êxito. Nas semanas seguintes, esta casa – como outras na linha fronteiriça – foi demolida, abrindo espaço para a construção do Muro.
Foto: dpa
A morte junto ao Muro
Cenas espetaculares de fuga acompanharam o Muro de Berlim em toda a sua história. Algumas com final feliz, outras com um desfecho trágico. A primeira vítima fatal foi o jovem Peter Fechter, em 17 de agosto de 1962. Atingido pelos disparos da guarda de fronteiras da RDA, Fechter agonizou durante 50 minutos na chamada 'terra de ninguém', falecendo pouco depois de ser recolhido pela polícia alemã oriental.
Foto: AP
Hora da opção
No dia 15 de agosto de 1961, o soldado alemão-oriental Conrad Schumann foi destacado para controlar a linha divisória na rua Bernauer, marcada por arames farpados, pois o Muro ainda não estava pronto. Schumann jogou fora o fuzil e pulou sobre o arame farpado, passando para o lado ocidental. A cena foi fotografada por jornalistas que acompanhavam o desenrolar dos acontecimentos em Berlim.
Foto: picture-alliance/dpa/R.Jensen
Pedra sobre pedra
Depois do fechamento das ruas de Berlim, selando a divisão da cidade a partir de 13 de agosto de 1961, o governo comunista da Alemanha Oriental ordenou a construção do Muro. Vigiados de perto pelos soldados do chamado Exército Popular Nacional (NVA), os operários demoliram os prédios localizados na linha divisória, construindo uma muralha e um campo minado em seu lugar.
Foto: AP
O símbolo isolado
O símbolo arquitetônico de Berlim, o Portão de Brandemburgo, ficou inteiramente isolado com a construção do Muro. O acesso a ele só era possível a partir do lado oriental da cidade, ficando reservado às autoridades policiais, militares e aos próceres do regime comunista. Hoje, a área circunvizinha do Portão de Brandemburgo é novamente uma das mais movimentadas e freqüentadas da capital alemã.
Foto: AP
Kennedy visita o Muro
Em junho de 1963, quase dois anos depois da construção do Muro, o presidente norte-americano John F. Kennedy visitou Berlim para informar-se sobre a divisão da cidade. Acompanhado pelo então prefeito Willy Brandt (ao centro) e pelo chanceler federal alemão Konrad Adenauer (à direita), Kennedy foi aclamado pela população de Berlim Ocidental.
Foto: AP
Uma fortaleza
Partes do Muro de Berlim tinham o aspecto de uma verdadeira fortaleza: com pista para o transporte de soldados e guarita para controlar as ocorrências nos dois lados da linha divisória. Além da muralha, uma 'terra de ninguém' com campo minado e cerca de arame farpado impedia o acesso ao Muro, no lado oriental.
Foto: AP
Tanques cara a cara
Nas semanas que se seguiram à construção do Muro de Berlim, a Guerra Fria atingiu um dos seus momentos mais dramáticos. A tensão entre os EUA e a União Soviética podia ser vista claramente no posto de controle da rua Friedrich, o chamado Checkpoint Charlie, no centro de Berlim: tanques americanos e soviéticos permaneceram durante dias, frente a frente, à espera de um comando de ação militar.
Foto: AP
O idealizador do Muro
Ninguém desejava uma muralha de pedra e concreto armado mais do que Walter Ulbricht, o chefe de Estado da República Democrática Alemã (RDA). Ele precisava dela para impedir o êxodo de milhares de pessoas para o outro Estado alemão, a República Federal da Alemanha. A União Soviética não apoiou com muita convicção a 'muralha antifascista' de Ulbricht. Não obstante, a fronteira de 155 quilômetros cercando Berlim Ocidental sedimentou a divisão alemã durante 28 anos.