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Histórico de troca de farpas entre Rússia e Turquia

Roman Goncharenko (av)26 de novembro de 2015

O abate do caça russo agravou o afastamento recente dos parceiros tradicionais. Mas, devido ao peso dos interesses comerciais e estratégicos comuns, Ancara e Moscou têm se empenhado em manter o diálogo.

Presidentes Erdogan (esq.) e Putin em encontro do G20 em Antalya, TurquiaFoto: picture alliance/ZUMA Press

A derrubada do caça russo pela Força Aérea turca esta semana foi um dos mais graves confrontos públicos entre um membro da Otan e a Rússia em meio século e complica ainda mais os esforços internacionais para combater o "Estado Islâmico" (EI) na Síria.

O conflito atual representa um marco negativo nas relações entre os dois países. "Há uma crise histórica", resume o especialista turco em política externa Hasan Ali Karasar. "A Turquia precisa pensar rápido, se quiser solucionar esta crise."

O presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, disse nesta quinta-feira (26/11) que o jato SU-24 foi abatido em uma "reação automática" à violação do espaço aéreo turco e não manifestou qualquer pedido de desculpas pelo incidente. A Rússia insiste que seu jato nunca saiu do espaço aéreo sírio e anunciou medidas de retaliação econômica contra Ancara.

O ministro turco das Relações com a União Europeia, Volkan Bozkir, disse que Rússia e Turquia "não podem se dar ao luxo" de interromper suas relações de amizade. O fato é que essa amizade já enfrenta altos e baixos há algum tempo.

Amigo do meu inimigo

Há anos a guerra na Síria tem sido a causa principal dos atritos binacionais. Ancara aposta numa mudança de governo em Damasco e apoia os dissidentes que lutam contra o presidente Bashar al-Assad. A Rússia, em contrapartida, complementa com meios militares seu respaldo político a Assad.

Nas últimas semanas, a Turquia queixou-se diversas vezes de violações de seu espaço aéreo por caças russos. Erdogan advertiu Moscou a respeito, no início de outubro, em termos inusitadamente severos.

Segundo relatos na imprensa, ele teria comentado de que seu país podia comprar gás de outro fornecedor, e que a planejada primeira usina nuclear turca também podia ser construída junto com outro parceiro. Ao mencionar o gás, Erdogan tocou naquele que é possivelmente o mais importante projeto russo na Turquia, e, portanto, um ponto vulnerável.

O trunfo do gás

Há cerca de um ano, a Rússia encerrou inesperadamente a construção do gasoduto South Stream, com que o país abasteceria a União Europeia atravessando o Mar Negro e contornando a Ucrânia. Coincidentemente, durante visita a Ancara, em dezembro de 2014, Putin anunciou o projeto Turkish Stream, em que o conglomerado Gazprom faria chegar o gás até a fronteira da UE na Grécia, passando pela Turquia.

Moscou está pressionado, pois a infraestrutura em território russo já está construída. Contudo o projeto não avança. Até hoje, não foi assinado um contrato relativo ao Turkish Stream. Em meados do ano, Ancara citou as dificuldades na constituição de governo como justificava para a demora. Nesse ínterim, a Gazprom corrigiu para baixo seus planos para uma central de comutação de gás na Turquia: ela teria apenas dois braços, em vez de quatro.

Após o abate do bombardeiro russo, observadores questionam a viabilidade do projeto. A Turquia é o segundo maior importador de gás russo, depois da Alemanha. Segundo fontes russas, em 2014 a Gazprom forneceu mais de 27 bilhões de metros cúbicos ao país.

Caça russo derrubado por força aérea da Turquia em 24/11/2015Foto: picture-alliance/dpa/Anadolu Agency

Crimeia e genocídio dos armênios

No entanto, o esfriamento nas até então amigáveis relações entre Moscou e Ancara não tem apenas a ver com a Síria. Também a anexação da península ucraniana da Crimeia, entre fevereiro e março de 2014, tem sido fonte de tensões binacionais.

A minoria étnica dos tártaros na Crimeia pediu socorro à Turquia, que se colocou do lado da Ucrânia no nível diplomático. Erdogan e Putin conversaram diversas vezes sobre o assunto.

Uma troca de ofensas aconteceu em abril, quando o presidente russo falou do genocídio dos armênios pelo então Império Otomano, em 1915 – versão até hoje rechaçada pela Turquia. Erdogan rebateu com uma menção ao procedimento russo na Crimeia, alvo de críticas internacionais. Em maio, ele rejeitou o convite de Moscou para a comemoração dos 70 anos do fim da Segunda Guerra Mundial na Europa.

Importância do Bósforo para Moscou

Apesar de tudo, o Kremlin não tem interesse num congelamento prolongado das relações com a Turquia. Segundo observadores de Moscou, principalmente devido ao controle turco do estreito de Bósforo. A passagem entre o Mar Negro e o Mediterrâneo é estrategicamente importante para os russos, pois através dela eles abastecem com reforços sua operação militar na Síria.

Até agora, os navios de guerra russos podiam cruzar o Bósforo sem problemas, a caminho de sua base no porto sírio de Tartus. Ficar impossibilitada de fazê-lo seria um duro golpe para a Rússia, pois assim sua frota no Mar Negro estaria isolada.

Apesar das diferenças na questão da Síria ou da Crimeia, até o momento a Rússia e a Turquia têm se esforçado para manter o diálogo. No fim de setembro, Erdogan viajou até Moscou para a inauguração de uma mesquita. Para meados de dezembro estão planejadas consultas governamentais turco-russas em São Petersburgo. Sua realização está em aberto, no momento.

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