Hitler e soldados se drogavam sistematicamente, diz escritor
Dagmar Breitenbach (ca)11 de setembro de 2015
Em entrevista à DW, autor de livro sobre uso de drogas na Segunda Guerra afirma que ditador tomava esteroides e substância equivalente a heroína, enquanto soldados se dopavam com o que hoje é conhecido como crystal meth.
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O livro Der totale Rausch (O delírio total, em tradução livre), de Norman Ohler, leva no título um jogo de palavras usando a referência da "guerra total", expressão que ganhou fama em 1943 durante discurso proferido por Josef Goebbels em Berlim.
Com ele, Ohler tenta descrever o apetite dos líderes nazistas por um "delírio total" – o uso compulsivo de drogas não só por soldados, mas também pelos mais altos nomes do Terceiro Reich, como o próprio Hitler.
"Os soldados alemães usavam Pervitin, um produto que contém metanfetamina, o que é hoje conhecido como crystal meth. Hitler aplicava esteroides na corrente sanguínea. E, mais tarde, usou Eukodal, produto farmacêutico que se aproxima da heroína", conta o jornalista e escritor à DW.
Deutsche Welle: Como nasceu a ideia do livro?
Norman Ohler: Um DJ berlinense me disse uma vez que os nazistas tomavam grandes quantidades de drogas. Eu nunca tinha ouvido falar sobre isso antes. Mas o fato despertou meu interesse, achei que tinha um fundo de verdade e passei a frequentar o Arquivo Federal da Alemanha e os Arquivos Nacionais americanos em Washington e no estado de Maryland.
A primeira coisa que quis ver foram as anotações pessoais do médico de Hitler, Theodor Morell. Para a minha surpresa, essas anotações eram bastante elaboradas, descrevendo como ele havia tratado Hitler ao longo dos anos, inclusive coisas como "injeção como sempre" e "Eudokal", que é um forte opioide.
Era a mesma droga tomada pelos soldados?
Não, os soldados usavam Pervitin, um produto alemão patenteado em 1937 e que contém metanfetamina, o que é hoje conhecido como crystal meth. Até 1939, esse produto esteve livremente disponível em forma de remédio. Em Berlim, ela se tornou uma das drogas preferidas, como beber café para despertar o ânimo. As pessoas tomavam grandes quantidades de Pervitin. A companhia queria que ela se tornasse rival da Coca-Cola. Assim, as pessoas a ingeriam e ficavam eufóricas – um estado de espírito que combinava com o humor geral da população antes da guerra.
E como a droga foi descoberta pela Wehrmacht?
As Forças Armadas alemãs perceberam que existia uma droga no mercado que poderia ser de interesse dos soldados, já que Pervitin mantém acordado por um longo período de tempo. Durante os primeiros dias, nem é preciso dormir. Foi usado pela primeira vez quando a Alemanha invadiu a região dos Sudetos e a Polônia, e em seguida quando a Alemanha atacou a França, em 1940, uma estratégia de guerra relâmpago. Antes do ataque, as forças nazistas encomendaram 35 milhões de comprimidos de Pervitin para os soldados na frente francesa.
Pervitin foi muito usado pelos nazistas. Hitler não o utilizava, ele aplicava esteroides na corrente sanguínea. E, mais tarde, usou Eukodal, produto farmacêutico que se aproxima da heroína. Hitler adorava Eukodal. Especialmente no outono de 1944, quando a situação militar deteriorou, ele usou essa droga forte para fazê-lo eufórico, mesmo que não parecesse estar nenhum pouco nesse estado de espírito.
Os generais lhe diziam: "Precisamos mudar nossa tática. Precisamos acabar com isso. Vamos perder a guerra." E ele não queria escutar nada disso. Ele tinha o seu médico, Dr. Morell, que lhe dava medicamentos que o faziam se sentir invulnerável e senhor da situação.
Isso era sabido na Alemanha?
Ninguém sabia o que o médico dava a Hitler. Ele não contou a ninguém, e Hitler, com certeza, também não. Mas muitas pessoas suspeitavam que estava acontecendo alguma coisa estranha. Houve algumas tentativas de fazer com que Morell revelasse o que estava dando a Hitler, mas ele recusou. Era um segredo entre dois homens.
Mas os soldados tomavam abertamente Pervitin?
Que os soldados estavam tomando Pervitin não era nenhum segredo. A princípio, a Wehrmacht não percebeu que se tratava de uma droga; pensavam que era como tomar café. Mas, em 1941, isso foi proibido e declarado uma droga ilegal. Nas Forças Armadas, no entanto, a distribuição continuou em segredo, mas os registros da campanha contra a Rússia não são tão claros como os da guerra contra a França, onde é possível ver quantas pílulas foram distribuídas. Falei com um oficial militar médico que esteve em Stalingrado, que disse que Pervitin ainda era distribuído ali, mas que, basicamente, não fez nenhuma diferença.
Outras Forças Armadas também tomaram drogas semelhantes?
Eles acabaram descobrindo sobre as drogas alemãs, e os britânicos usavam anfetaminas. Basicamente, os alemães usaram crystal meth, e os britânicos utilizaram speed. Muito dos soldados americanos que se juntaram ao esforço de guerra entraram naquele cenário belicoso através do Reino Unido, onde recebiam anfetamina.
Os americanos tomavam a droga para poder concorrer com aqueles soldados alemães enlouquecidos. Isso fez escola entre os militares americanos: se você olhar para a Guerra da Coreia, em 1950, ela foi marcada pela anfetamina, e todos os pilotos estavam dopados.
O LSD, por exemplo, foi inventado por um químico suíço, e o serviço de inteligência americano tentou usá-lo, também com base em experimentos alemães no campo de concentração de Dachau, onde um médico chamado pelo nome de Plötner usava mescalina para desenvolver novas técnicas de interrogatórios. Quando os americanos libertaram o campo de concentração, eles levaram esses estudos e os usaram no Projeto Alcachofra, utilizando-os na década de 1950 para descobrir quem era agente soviético ou não.
Qual foi para você a maior surpresa durante os muitos anos de pesquisa para esse livro?
Achei o abuso de drogas por parte de Hitler como a parte mais surpreendente.
Cronologia da Segunda Guerra Mundial
Em 1° de setembro de 1939, as Forças Armadas alemãs atacaram a Polônia, sob ordens de Hitler. A guerra que então começava duraria até 8 de maio de 1945, deixando um saldo até hoje sem paralelo de morte e destruição.
Foto: U.S. Army Air Forces/AP/picture alliance
1939
No dia 1° de setembro de 1939, as Forças Armadas alemãs atacaram a Polônia sob ordens de Adolf Hitler – supostamente em represália a atentados poloneses, embora isso tenha sido uma mentira de guerra. No dia 3 de setembro, França e Reino Unido, que eram aliadas da Polônia, declararam guerra à Alemanha, mas não intervieram logo no conflito.
1939
A Polônia mal pôde oferecer resistência às bem equipadas tropas alemãs – em cinco semanas, os soldados poloneses foram derrotados. No dia 17 de setembro, o Exército Vermelho ocupou o leste da Polônia – em conformidade com um acordo secreto fechado entre o Império Alemão e a União Soviética apenas uma semana antes da invasão.
Foto: AP
1940
Em abril de 1940, a Alemanha invadiu a Dinamarca e usou o país como base até a Noruega. De lá vinham as matérias-primas vitais para a indústria bélica alemã. No intuito de interromper o fornecimento desses produtos, o Reino Unido enviou soldados ao território norueguês. Porém, em junho, os aliados capitularam na Noruega. Nesse meio tempo, a Campanha Ocidental já havia começado.
1940
Durante oito meses, soldados alemães e franceses se enfrentaram no oeste, protegidos por trincheiras. Até que, em 10 de maio, a Alemanha atacou Holanda, Luxemburgo e Bélgica, que estavam neutros. Esses territórios foram ocupados em poucos dias e, assim, os alemães contornaram a defesa francesa.
Foto: picture alliance/akg-images
1940
Os alemães pegaram as tropas francesas de surpresa e avançaram rapidamente até Paris, que foi ocupada em meados de junho. No dia 22, a França se rendeu e foi dividida: uma parte ocupada pela Alemanha de Hitler e a outra, a "França de Vichy", administrada por um governo fantoche de influência nazista e sob a liderança do general Pétain.
Foto: ullstein bild/SZ Photo
1940
Hitler decide voltar suas ambições para o Reino Unido. Seus bombardeios transformaram cidades como Coventry em cinzas e ruínas. Ao mesmo tempo, aviões de caça travavam uma batalha aérea sobre o Canal da Mancha, entre o norte da França e o sul da Inglaterra. Os britânicos venceram e, na primavera europeia de 1941, a ofensiva alemã estava consideravelmente enfraquecida.
Foto: Getty Images
1941
Após a derrota na "Batalha aérea pela Inglaterra", Hitler se voltou para o sul e posteriormente para o leste. Ele mandou invadir o norte da África, os Bálcãs e a União Soviética. Enquanto isso, outros Estados entravam na liga das Potências do Eixo, formada por Alemanha, Itália e Japão.
1941
Na primavera europeia, depois de ter abandonado novamente o Pacto Tripartite, Hitler mandou invadir a Iugoslávia. Nem a Grécia, onde unidades inglesas estavam estacionadas, foi poupada pelas Forças Armadas alemãs. Até então, uma das maiores operações aeroterrestres tinha sido o ataque de paraquedistas alemães a Creta em maio de 1941.
Foto: picture-alliance/akg-images
1941
O ataque dos alemães à União Soviética no dia 22 de junho de 1941 ficou conhecido como Operação Barbarossa. Nas palavras da propaganda alemã, o objetivo da campanha de invasão da União Soviética era uma "ampliação do espaço vital no Oriente". Na verdade, tratava-se de uma campanha de extermínio, na qual os soldados alemães cometeram uma série de crimes de guerra.
Foto: Getty Images
1942
No começo, o Exército Vermelho apresentou pouca resistência. Aos poucos, no entanto, o avanço das tropas alemãs chegou a um impasse na Rússia. Fortes perdas e rotas inseguras de abastecimento enfraqueceram o ataque alemão. Hitler dominava quase toda a Europa, parte do norte da África e da União Soviética. Mas no ano de 1942 houve uma virada.
1942
A Itália havia entrado na guerra em junho de 1940, como aliada da Alemanha, e atacado tropas britânicas no norte da África. Na primavera de 1941, Hitler enviou o Afrikakorps como reforço. Por muito tempo, os britânicos recuaram – até a segunda Batalha de El Alamein, no outono de 1942. Ali a situação mudou, e os alemães bateram em retirada. O Afrikakorps se rendeu no dia 13 de maio de 1943.
Foto: Getty Images
1942
Atrás do fronte leste, o regime de Hitler construiu campos de extermínio, como Auschwitz-Birkenau. Mais de seis milhões de pessoas foram vítimas do fanatismo racial dos nazistas. Elas foram fuziladas, mortas com gás, morreram de fome ou de doenças. Milhares de soldados alemães e da SS estiveram envolvidos nestes crimes contra a humanidade.
Foto: Yad Vashem Photo Archives
1943
Já em seu quarto ano, a guerra sofreu uma virada. No leste, o Exército Vermelho partiu para o contra-ataque. Vindos do sul, os aliados desembarcaram na Itália. A Alemanha e seus parceiros do Eixo começaram a perder terreno.
1943
Stalingrado virou o símbolo da virada. Desde julho de 1942, o Sexto Exército alemão tentava capturar a cidade russa. Em fevereiro, quando os comandantes desistiram da luta inútil, cerca de 700 mil pessoas já haviam morrido nesta única batalha – na maioria soldados do Exército Vermelho. Essa derrota abalou a moral de muitos alemães.
Foto: picture-alliance/dpa
1943
Após a rendição das tropas alemãs e italianas na África, o caminho ficou livre para que os Aliados lutassem contra as potências do Eixo no continente europeu. No dia 10 de julho, aconteceu o desembarque na Sicília. No grupo dos Aliados estavam também os Estados Unidos, a quem Hitler havia declarado guerra em 1941.
Foto: picture alliance/akg
1943
Em setembro, os Aliados desembarcaram na Península Itálica. O governo em Roma acertou um armistício com os Aliados, o que levou Hitler a ocupar a Itália. Enquanto os Aliados travavam uma lenta batalha no sul, as tropas de Hitler espalhavam medo pelo resto do país.
No leste, o Exército Vermelho expulsou os invasores cada vez mais para longe da Alemanha. Iugoslávia, Romênia, Bulgária, Polônia... uma nação após a outra caía nas mãos dos soviéticos. Os Aliados ocidentais intensificaram a ofensiva e desembarcaram na França, primeiramente no norte e logo em seguida no sul.
1944
Nas primeiras horas da manhã do dia 6 de junho, as tropas de Estados Unidos,Reino Unido, Canadá e outros países desembarcaram nas praias da Normandia, no norte da França. A liderança militar alemã tinha previsto que haveria um desembarque – mas um pouco mais a leste. Os Aliados ocidentais puderam expandir a penetração nas fileiras inimigas e forçar a rendição de Hitler a partir do oeste.
Foto: Getty Images
1944
No dia 15 de agosto, os Aliados deram início a mais um contra-ataque no sul da França e desembarcaram na Provença. As tropas no norte e no sul avançaram rapidamente e, no dia 25 de agosto, Paris foi libertada da ocupação alemã. No final de outubro, Aachen se tornou a primeira grande cidade alemã a ser ocupada pelos Aliados.
Foto: Getty Images
1944
No inverno europeu de 1944/45, as Forças Armadas alemãs reuniram suas tropas no oeste e passaram para a contra-ofensiva em Ardenne. Mas, após contratempos no oeste, os Aliados puderam vencer a resistência e avançar inexoravelmente até o "Grande Império Alemão" – a partir do leste e do oeste.
Foto: imago/United Archives
1945
No dia 8 de maio de 1945, os nazistas se renderam incondicionalmente. Para escapar da captura, Hitler se suicidou com um tiro no dia 30 de abril. Após seis anos de guerra, grande parte da Europa estava sob entulhos. Quase 50 milhões de pessoas morreram no continente durante a Segunda Guerra Mundial. Em maio de 1945, o marechal de campo Wilhelm Keitel assinava a ratificação da rendição em Berlim.