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Horário do comércio: debate passional na Alemanha

Assis Mendonça12 de dezembro de 2002

Até que horas as lojas devem ficar abertas? Em quais dias da semana? Como poucos outros, este debate arrebata emoções na Alemanha. Argumentações sensatas e comedidas são exceções.

Horário comercial gera polêmica entre alemãesFoto: AP

Na Alemanha, a lei que regula o horário de funcionamento do comércio varejista é federal. Ela é antiquada e carente de uma reforma radical – de preferência, até mesmo da sua completa revogação. Isto é o que diz a maioria dos consumidores alemães, assim como os representantes do próprio comércio varejista, contra o protesto e o bloqueio por parte dos sindicatos.

Há três anos, o Ministério da Economia encomendou uma enquete entre os consumidores alemães sobre o assunto. Na época, quase a metade dos indagados manifestou-se a favor de uma reforma: deduzindo os indecisos, uma opinião majoritária. No entanto, a iniciativa de liberalização do horário comercial foi barrada, dois anos atrás, pelo próprio chanceler federal Gerhard Schröder, que cedeu à pressão dos poderosos sindicatos.

Prestígio pessoal

Agora, Schröder retomou o tema. Segundo opinião dos adversários da liberalização, o motivo do chanceler seria claro: agradar à maioria dos consumidores e tentar melhorar a própria imagem. Nunca esteve tão baixo o nível de popularidade do chefe de governo em Berlim.

Esta semana, sob a batuta de Gerhard Schröder e do seu superministro Wolfgang Clement, o gabinete ministerial aprovou um projeto de lei que deverá ser votado pelo Bundestag (Parlamento alemão) ainda antes do Natal. A reforma da lei de funcionamento do comércio varejista permitirá a abertura das lojas, nos sábados, até as 20 horas.

Críticas gerais

Ao contrário do que se supunha em Berlim, a iniciativa governamental desagradou a gregos e troianos. As críticas ao projeto de reforma não ficaram limitadas aos sindicatos, dos quais já se esperava resistência. Também os lojistas mostraram-se insatisfeitos: a reforma foi classificada de irrelevante, por não atender inteiramente aos anseios dos consumidores, nem às necessidades do comércio varejista.

Segundo a Federação das Câmaras Alemãs de Indústria e Comércio (DIHK), a revogação da lei antiquada e a completa liberalização do horário de funcionamento do comércio teria sido um claro sinal positivo da modernização da Alemanha como centro econômico. Somente assim, argumenta a DIHK, o governo federal alemão daria prova de que não apenas anuncia as reformas necessárias, mas também toma iniciativa de realizá-las.

Defasagem

De fato, a modernização da Alemanha mostra-se capenga no que se refere à liberalização do funcionamento comercial. Na sua campanha pela manutenção do status quo, os sindicatos sempre procuraram difundir entre os alemães o temor de uma situação de exploração dos comerciários "como nos EUA". Contudo, a única comparação plausível para o mercado interno alemão seria com os países europeus. E aí, existe uma enorme defasagem.

Seja Bélgica, Holanda, Espanha, Grécia, Itália ou França – em praticamente todos os países da União Européia, o horário do comércio varejista é quase inteiramente livre. Os regulamentos legais, quando existentes, dão ampla margem à decisão própria de cada lojista sobre o funcionamento do seu negócio. Um exemplo citado com freqüência é o das pequenas mercearias parisienses, em geral de proprietários árabes, que permanecem abertas durante toda a noite.

Enfermidade alemã

Para o diário econômico Financial Times Deutschland, o projeto de reforma anunciado pelo governo alemão é mais um "minipassinho" rumo à liberalização do horário comercial. Em editorial sobre o assunto, o jornal afirma: "Faz parte da enfermidade alemã o sintoma de que nenhuma reforminha é tão pequena que não suscite logo a maior das resistências".

O Financial Times Deutschland critica também os argumentos econômicos e trabalhistas, apresentados como prós e contras no debate passional do assunto, mas ressalta a importância de uma reforma de verdade: "Economicamente, os horários legais de funcionamento são de pouca relevância. Do ponto de vista da política econômica, no entanto, a lei que regula a abertura do comércio varejista tem uma grande força simbólica. Ela demonstra a desconfiança básica dos políticos na capacidade de decisão dos empresários, consumidores e empregados. Ela mostra uma fundamental falta de confiança no mercado, na concorrência e na liberdade".