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Incêndios no Ártico e o círculo vicioso climático

Michael Hartlep
25 de julho de 2019

Onda de calor extremo assola a região do Ártico, resultando nos maiores incêndios florestais em 20 anos. Se emissões globais de CO2 não forem reduzidas, reação em cadeia pode ter graves efeitos sobre o planeta.

Avião combate incêndio florestal no Alasca
Incêndios no Alasca se estendem por até mil quilômetros quadradosFoto: Imago Images/ZUMA Press/M. Risinger

Enormes áreas estão em chamas no Ártico. Cientistas registraram em imagens de satélite centenas de focos de incêndio, estendendo-se pelo norte do Canadá, Rússia e Estados Unidos, alguns medindo mais de mil quilômetros quadrados.

Num mapa online do corpo de bombeiros do Alasca, os pontos vermelhos são tantos que alguns se superpõem: cada um deles é um incêndio florestal. Clicando-se neles, vem o aviso: "Opções de gestão de fogo: limitadas". Isso significa que os focos são demasiado numerosos, e os locais, isolados demais.

Segundo Stefan Kruse, cientista do Instituto Alfred Wegener, Centro Helmholtz de Pesquisa Polar e Marítima (AWI), em Potsdam, as dimensões dos incêndios são "assustadoras". Ainda assim, ele soa surpreendentemente calmo ao falar sobre o perigo para o clima – e, por extensão, para a humanidade – que se oculta nos solos árticos.

Em si, incêndios florestais nos meses de verão na região do Ártico não são nada fora do comum, sendo em grande parte desencadeados por relâmpagos. Em 2019, contudo, eles têm se mostrado inusitadamente amplos e prolongados.

Normalmente, conta Kruse, a estação dos incêndios só começa em julho ou agosto, quando a vegetação está seca por causa do verão. O motivo para o atual cenário é que as mudanças climáticas ocasionadas pelos humanos alterou as correntes de jato (jet stream), os fortes ventos nas camadas mais altas da atmosfera. A consequência são extremos meteorológicos que se perpetuam.

No Alasca, registraram-se no início de julho novos recordes de temperatura, superando os 30ºC e degelando o solo mais cedo do que o normal. A vegetação secou de tal maneira, que se gerou um sistema explosivo: tão logo um relâmpago cai, um incêndio se alastra. Nos últimos 20 anos nunca houve uma situação tão extrema, afirma Kruse.

Os efeitos do fogo são devastadores: segundo o ecologista, só nos primeiros seis meses do ano já foram emitidos no Alasca 50 milhões de toneladas de dióxido de carbono (CO2), tanto quanto em todos os incêndios florestais árticos dos últimos dez anos.

A fumaça também representa perigo, pois num prazo de poucos dias o vento transporta a poeira fina e o monóxido de carbono por milhares de quilômetros. Os habitantes locais estão, assim, expostos ao duplo perigo do fogo e do smog.

Degelo do permafrost está mudando a paisagem em vários pontos do ÁrticoFoto: Getty Images/A. Burton

O Ártico é relevante para as mudanças climáticas também pela presença do permafrost – solos que permanecem congelados por pelo menos dois anos seguidos, com a camada superior só degelando no verão e voltando a congelar no inverno. Calcula-se que no Polo Norte haja 19 milhões de quilômetros quadrados de gelo perene, o equivalente a 50 vezes a área da Alemanha.

Os cientistas constatam que, devido ao aquecimento global, o permafrost agora degela bem mais rápido do que se supunha. Em algumas regiões já se alcançam máximas que os pesquisadores só prediziam para 2090, com impacto possivelmente fatal para o clima mundial.

Os solos de gelo perene contêm quantidades imensas de plantas mortas, acumuladas ao longo dos milênios e conservadas pelo frio. Esse reservatório tem o dobro do dióxido de carbono da atmosfera terrestre. Se o solo se descongelar, bactérias decomporão o material orgânico, liberando CO2 e, sobretudo, o ainda mais nocivo gás metano, aquecendo o clima ainda mais.

Por isso, o permafrost é considerado um dos pontos cruciais para o sistema climático terrestre: a partir de um determinado estado, poderá estabelecer-se um círculo vicioso climático que se retroalimenta, gerando uma reação em cadeia irreversível.

Não se sabe dizer qual é exatamente esse ponto, observa Kruse, pois não está claro o que acontece com grandes quantidades de CO2. É possível que os oceanos absorvam uma parte, mas também eles podem se aquecer ao ponto de não ter mais como armazenar os gases do efeito estufa – um outro ponto sem retorno.

Diante dessa dinâmica, o especialista apela para que se reduza o mais rapidamente possível as emissões de dióxido de carbono, a fim de limitar o aquecimento global. Apesar disso, é preciso estar preparado para incêndios florestais que chagam cada vez mais cedo no ano e mais incontroláveis: "É provável que tais situações extremas se tornem mais frequentes nos próximos anos", resume Kruse. "E isso, claro, é incrivelmente drástico."

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