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Incerteza sobre Brexit gera caos na política britânica

Barbara Wesel av
18 de novembro de 2016

Londres oscila entre intermináveis discussões internas e propostas de "divórcio-relâmpago" do Reino Unido com a UE. Diante da falta de um plano, dificilmente premiê conseguirá cumprir prazo para início das negociações.

Premiê britânica Theresa May
Premiê Theresa May sob enorme pressão para adiantar processo do BrexitFoto: picture-alliance/AP Images/A. Grant

"Será que não dá para a gente simplificar?", perguntou Michael Gove no recém-formado comitê para o Brexit na Câmara dos Comuns do Parlamento britânico. A seu ver, os funcionários de Whitehall tornaram tudo desnecessariamente complicado. Por isso, ele propõe uma espécie de "divórcio-relâmpago" entre o Reino Unido e a União Europeia (UE).

"E se eu simplesmente quiser abandonar a UE, acionar o Artigo 50 e apenas fizer acertos mínimos para poder ir?", pergunta. Como um dos principais partidários do Brexit, com sua proposta Gove pretende encerrar o debate sobre a falta de planejamento estratégico do governo britânico, que tem causado celeuma nas mídias nos últimos dias.

May nega atraso

Desde o início desta semana, um memorando interno dos consultores econômicos da firma de auditoria Deloitte ocupa as manchetes. Segundo os especialistas a serviço do governo do Reino Unido, estariam faltando 30 mil funcionários públicos para preparar as complexas negociações para a saída do país do bloco europeu.

Michael Gove quer simplificar ao máximo o "divórcio" da União EuropeiaFoto: Getty Images/C. Furlong

Além disso, continua faltando um roteiro válido para o processo. Cresce a pressão para que a primeira-ministra Theresa May dê uma direção às negociações, marcadas para começar em abril de 2017.

Se dependesse de Gove, esse nó político seria simplesmente cortado. Ele propõe que se renuncie a soluções interinas, se aceite as consequências econômicas e se abandone, sem rodeios, o mercado comum e a união alfandegária.

Diversos altos funcionários do país consideram essa proposta menos do que ideal. Na opinião do diplomata Simon Fraser, o melhor seria negociar paralelamente sobre a liquidação do Brexit e a futura relação com a UE. Diante da comissão parlamentar, ele confirmou que, nessa questão, o governo está vagando sem rumo.

"Ainda se está no estágio da coleta de informações, e não há um plano central." Mas o governo terá que entrar no "modo turbo", se pretender acionar o Artigo 50 dentro de cinco meses. "Não fizemos ainda progressos suficientes, e o tempo urge", reconheceu Fraser.

Por sua vez, May afirmou mais uma vez na Câmara dos Comuns que não dará informações precoces sobre as metas de negociação. No entanto, acrescentou, todos os preparativos estariam correndo como previsto, não havendo razão para se falar de caos em Londres.

Mais pérolas de Boris Johnson

Em contrapartida, o ministro do Exterior Boris Johnson não perdeu a chance de causar mais confusão quanto à posição de seu governo durante um encontro de dois dias com seus colegas de pasta europeus em Bruxelas.

Fazendo jus à sua fama de falastrão incorrigível, em entrevista a um jornal tcheco ele declarou partir do princípio de que o Reino Unido sairá da união aduaneira, mas continuará praticando livre-comércio no mercado interno europeu. Além disso, Johnson voltou a postular que a livre circulação de pessoas nada tem a ver com o mercado único: essa ideia seria uma "besteira".

Boris Johnson fez mais uma fez jus à fama de falastrão incorrigívelFoto: Reuters/T. Melville

Isso lhe rendeu uma advertência do negociador do Brexit no Parlamento Europeu, Guy Verhofstadt: "Mal posso esperar para ler para ele o Artigo 3º dos Acordos de Roma", que descreve justamente essa conexão.

Falando à emissora BBC, o ministro holandês das Finanças, Jeroen Dijsselbloem, foi ainda mais crítico: "Johnson diz coisas que são intelectualmente impossíveis e politicamente irrealizáveis. Portanto eu acredito que ele não esteja dando aos britânicos uma visão justa do que seja possível e alcançável nas negociações."

Dijsselbloem, que também é presidete do Eurogrupo, alertou mais uma vez sobre as consequências econômicas. "Vai haver uma situação em que todos sairão perdendo, e na melhor das hipóteses todos devem deixar as emoções de lado e procurar encontrar um consenso que prejudique o mínimo ambas as partes."

Britânicos contra o Brexit

Maria Demertzis, do think tank  Bruegel, de Bruxelas, também adverte: "Precisamos permanecer no campo da lógica, se abandonarmos o caminho da razão, teremos que viver com as consequências." Ela observa com ironia o caos do Brexit, pois o que quer que se diga agora, não acontecerá: "Predições não valem mais nada."

Ainda assim, Demertzis é crítica quanto à ideia de um "Brexit expresso", proposta por Gove. "É um enigma como um político pretende vender isso a seu eleitorado. É algo que realmente não deveríamos desejar – embora atualmente tudo possa acontecer."

Entretanto, as ideias de Gove e Johnson pouco parecem ter a ver com a vontade dos eleitores. Numa enquete recente do instituto de pesquisa social NetCen, 90% dos entrevistados afirmaram querer permanecer no mercado interno e na união aduaneira. E 49% dos britânicos estariam até mesmo dispostos a continuar aceitando a livre circulação de mão de obra, se for esse o preço para ter acesso ao mercado da UE.

"Tudo é possível"

Depositando suas esperanças nas tradições democráticas e no poder da Justiça britânica, Demertzis comenta: "Se o recurso à Suprema Corte não tiver sucesso, então o Parlamento terá que ser envolvido no processo do Brexit." Nesse caso, cada deputado poderia acrescentar seus próprios adendos à resolução sobre a saída da UE, o que prolongaria enormemente o processo. "Aí será quase impossível May cumprir o prazo até março."

No momento, porém, reina pura confusão na discussão sobre o Brexit. Quatro meses depois do referendo, não há nenhum plano e apenas opiniões conflitantes sobre a forma e modalidade da despedida do Reino Unido.

"O resto da Europa espera pelos britânicos, e a insegurança permanece" – situação que já está causando danos econômicos e, acima de tudo, políticos, aponta a analista do think tank  Bruegel.

No fim das contas, a maneira como as negociações transcorrerão depende muito dos pleitos em 2017. "As eleições, sobretudo na França e na Alemanha, são decisivas. Se algo der errado, no fim das contas tudo será possível."

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