A cidade de Frankenstein
9 de julho de 2007"Close no grande portão de madeira que se abre. Uma multidão entra na cidade. Victor cruza o portão, assim que ele se abre de manhã cedo". É o que se lê no roteiro do filme Mary Shelley's Frankenstein, de 1994, baseado no romance Frankenstein ou O Moderno Prometeu, publicado pela escritora britânica Mary Shelley em 1818.
O portão cruzado pelo personagem Victor Frankenstein dá acesso a Ingolstadt, onde a história se desenrola. Mas há muito tempo que essa cena não corresponde mais à realidade da cidade, hoje um moderno centro industrial de cerca de 120 mil habitantes, situado a meio caminho entre Munique e Nurembergue.
Desde 1989, quando superou a marca dos 100 mil habitantes, é considerada a "mais jovem cidade grande da Baviera e da Alemanha" e uma das que mais cresce no país.
O maior empregador da cidade e da região é a Audi, subsidiária da Volkswagen, que até o fim do ano passado tinha filial no Brasil, em São José dos Pinhais (PR). Com 52 mil funcionários, a montadora fundada em 1969 produziu 926 mil veículos em 2006.
Cruzada de leste a oeste pelo rio Danúbio, Auripolis (o nome da cidade em latim) já foi mencionada nos registros do imperador romano Carlos Magno, que andou pela região. Seu povoamento remonta ao ano 806, motivo pelo qual festejou seus 1200 anos de fundação em 2006.
A sua longa e rica história foi testemunhada por 582 edifícios tombados pelo patrimônio histórico. Um deles é a antiga prefeitura (Altes Rathaus), um conjunto de quatro casas do século 14, remodelado em estilo neo-renascentista em 1882.
O cartão-postal da cidade é o portão Kreuztor. Construído com tijolos vermelhos e adornos de pedra de calcário, é um testemunho romântico da arquitetura medieval. É o mais bonito dos portões conservados na cidade.
De 1392 a 1447, período em que foi principado, um total de 87 torres marcavam a silhueta de Ingolstadt. Entre as que restaram, além dos portões, estão as das igrejas e a da entrada do castelo Neues Schloss, este inspirado na arquitetura francesa.
Entre as igrejas, a mais imponente é a catedral (Münster), em estilo gótico. Consta-se que só para construir o telhado e o forro do templo foram utilizadas 3.800 árvores.
A cripta que guarda os restos mortais de professores e intelectuais e o altar principal, datado de 1572, lembram o tradicional vínculo entre a Igreja e a universidade local. Em 1472, o duque Ludwig, o Rico, obteve o "privilégio papal" para fundar em Ingolstadt a primeira universidade da Baviera, que até hoje é a única universidade católica da Alemanha, tendo sede principal em Eichstätt.
Isso explica também por que Ingolstadt foi um dos centros de maior resistência à Reforma Protestante. Muitos jesuítas e teólogos locais, entre eles o professor Johannes Eck, foram ferrenhos opositores de Martinho Lutero.
Mas também outras figuras ilustres tiveram ou ainda têm ligação com a cidade. Franz Beckenbauer, ídolo do futebol alemão, passou parte de sua juventude no internato jesuíta de Ingolstadt.
O falecido piloto Ayrton Senna visitou freqüentemente a cidade, principalmente a fábrica da Audi, como representante exclusivo da montadora no Brasil. E Ingolstadt é o distrito eleitoral do atual ministro alemão da Agricultura, Horst Seehofer.
Mas esses nomes, com certeza, não são tão imortais para os moradores de Ingolstadt como o do Doutor Frankenstein. Existe até um roteiro turístico noturno seguindo os passos desse mito, que Boris Karloff levou ao cinema pela primeira vez em 1931. Mas isso é uma outra história.