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Iniciativa quer banir carros em Berlim

Clarissa Schimunda Neher
Clarissa Neher
16 de novembro de 2020

Por meio de uma consulta popular, grupo quer reduzir dois terços do tráfego numa região que abrange quase 90 quilômetros quadrados. Se aprovada, proposta pode promover revolução na mobilidade urbana da capital alemã.

Foto: K. M. Höfer/Imago Images

O debate sobre uma divisão mais igualitária da cidade no trânsito é algo antigo em Berlim. Propostas como a expansão de ciclovias, a ampliação do transporte coletivo ou a utilização de vagas de estacionamento para criação de espaços de lazer para pedestres são propostas constantes nesta discussão.

Para promover uma divisão igualitária dos espaços públicos e combater emissões que causam o aquecimento global, o atual governo lançou um plano de investimento de 28,1 bilhões de euros (cerca de 181 bilhões de reais) para reformas e ampliação da infraestrutura de transporte público e definiu diretrizes de mobilidade urbana, focadas em bicicletas e no transporte público. Há ainda um debate sobre a criação de um pedágio para carros que circulam no centro da cidade para diminuir o número de automóveis na região.

Todas essas iniciativas e debates, porém, enfrentam forte resistência do lobby automotivo e de partidos conservadores como a União Democrata Cristã (CDU), da chanceler federal Angela Merkel, e de populistas de direita da Alternativa para a Alemanha (AfD). Os argumentos são sempre os mesmos: carros estariam sendo discriminados nestas propostas.

Nesta linha de raciocínio, automóveis seriam prejudicados ao perder o espaço que já possuem ou por não receberem o mesmo investimento que está sendo feito em outras áreas. Os repasses, argumentam os conservadores, poderiam ser divididos para a construção mais ruas e estacionamentos. Apesar de ocuparem a maior fatia dos espaços urbanos, motoristas se dizem injustiçados e se recusam a perder certos privilégios.

Assim no âmbito da política, transformações reais na cidade andam a passos lentos. Por isso, para tentar promover uma mudança concreta e rápida, uma iniciativa lançou no mês passado uma proposta um tanto ambiciosa: uma consulta popular para forçar a proibição da circulação de automóveis na região que fica dentro do anel do S-Bahn em Berlim, que corresponde a uma área de 88 quilômetros quadrados onde vivem cerca de 1 milhão de habitantes.

Essa proibição vai além de propostas que previam a diminuição da circulação de carros apenas no centro da capital alemã. Segundo a iniciativa, apenas ônibus, taxis, automóveis da polícia, de entregas, de moradores desta região e bombeiros poderão circular dentro do anel do S-Bahn, o que reduziria em dois terços o tráfego nesta área. 

"Menos carros significa ar mais limpo e menos barulho. E nossas ruas ficarão mais seguras, o que possibilitará também que crianças possam ir sozinhas para a escola", afirmou a porta-voz da iniciativa, Anne Gläser, à emissora local rbb.

De acordo com a iniciativa, a redução do número de carros em circulação na região aumentará a qualidade de vida dos moradores, a segurança no trânsito e contribuirá para reduzir emissões que causam o aquecimento global, além de promover uma divisão mais igualitária do espaço urbano em detrimento daqueles que usam meios de transporte menos poluentes e mais saudáveis.

Para alcançar essa mudança, o primeiro passo é a coleta de 20 mil assinaturas entre abril e setembro de 2021. Isso possibilitará a apresentação de uma petição ao parlamento local, que analisará a proposta. Se a petição for recusada, a iniciativa tem quatro meses para recolher cerca de 175 mil assinaturas. Se a meta for alcançada, o governo precisa promover então a consulta popular sobre a legislação desenvolvida pelo grupo para a proibição da circulação de automóveis na região do anel do S-Bahn. Essa votação está programada pelos organizadores para ocorrer em 2023.

A consulta não é vinculativa, mas governos locais costumam respeitar o desejo da população. Se a maioria dos berlinenses aprovar a medida, uma transformação real na cidade pode ocorrer nos próximos anos por meio de um pequeno passo iniciado por um grupo de ativistas voluntários e apoiado pela população.

No momento, é difícil saber se a proposta tem apoio suficiente para tal, mas os ativistas devem garantir a coletas das primeiras 20 mil assinaturas, e as outras 175 mil também devem ser alcançadas. Nos últimos anos, foi registrado um aumento no número de ciclistas em Berlim.

Esse é o meio de transporte que mais cresce na capital alemã, segundo uma pesquisa do governo local divulgada em março que reuniu dados coletados em 2018. A participação de bicicletas no total do tráfego passou de 13% para 18% entre 2013 e 2018. Já a de carros caiu de 30% para 26% neste mesmo período. A porcentagem do transporte público é de 27% e de distâncias percorridas a pé de 30%. Ou seja, os automóveis estão em número bem menor do que os outros meios de transporte, mas, apesar desta realidade, ocupam 58% do espaço urbano destinado para o trânsito em Berlim.

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Clarissa Neher é jornalista da DW Brasil e mora desde 2008 na capital alemã. Na coluna Checkpoint Berlim, escreve sobre a cidade que já não é mais tão pobre, mas continua sexy. Siga-a no Twitter.

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Checkpoint Berlim

Clarissa Neher é jornalista freelancer na DW Brasil e mora desde 2008 na capital alemã. Nesta coluna, ela escreve sobre a cidade que já não é mais tão pobre, mas continua sexy.