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Insatisfação e ocupação de ruas unem ativistas pelo mundo

Marcio Pessôa19 de junho de 2013

Primavera Árabe, Occupy, Indignados e os manifestantes nas capitais brasileiras: em todo o mundo, os motivos que levam jovens às ruas são os mais variados. Em comum, a insatisfação e o protesto.

Foto: C.Simon/AFP/GettyImages

São motivos diversos, mas a estratégia de ação é a mesma em todo o mundo: ativistas, jovens em sua maioria, ocupam espaços públicos para manifestações e para expressar sua insatisfação.

Em geral, trata-se da ocupação de espaços simbólicos das cidades, como Wall Street, em Nova York; a praça Tahrir, no Cairo; ou a praça Puerta del Sol, em Madri; o Congresso Nacional ou a Avenida Paulista, no Brasil.

Iguais no ato de protestar, os movimentos se distinguem nos seus objetivos. No mundo árabe, a insatisfação se voltava contra governantes autoritários, há décadas instalados no poder.

Na Espanha, o desemprego e os planos de austeridade motivaram os Indignados a sair às ruas. Em Nova York, o Occupy Wall Street mira a desigualdade econômica e social, apresentando-se como os 99% de desfavorecidos na distribuição da riqueza.

O Congresso Nacional: ocupação de espaços simbólicos é ponto em comumFoto: Valter Campanato/ABr

No Brasil, as manifestações começaram em protesto contra o aumento das passagens de ônibus em São Paulo, mas logo ganharam uma dimensão maior, e a agenda também se ampliou.

Algo semelhante acontece na Turquia, onde a repressão policial a um movimento pacífico contrário à construção de um centro comercial em um parque de Istambul gerou revolta de outros setores da sociedade. Assim como no Brasil, grupos diversos, com reivindicações variadas, juntaram-se ao movimento, engrossando a contestação na praça Taksim e no parque Gezi.

Levantes ocasionados por insatisfação política também ocorrem na África subsaariana, mas também em contextos bem únicos. O regime do presidente angolano, José Eduardo dos Santos, enfrenta manifestações de contestação desde o ano passado. São ações lideradas por jovens estudantes e ativistas culturais, severamente reprimidas pelas forças de segurança.

Os brasileiros no contexto mundial

Na Turquia, os protestos começaram por causa da construção de um centro comercialFoto: AFP/Getty Images

A insatisfação parece ser o único ponto em comum entre os jovens que saem às ruas em todo o mundo. Mesmo no caso de um único país, como o Brasil, é difícil encontrar um tema unindo todos os manifestantes, como argumenta o cientista político Tim Wegenast, da Universidade de Constança. Para ele, existe uma "insatisfação com a política brasileira como um todo".

Wegenast também não arrisca comparar a onda de protestos brasileira com as contestações à política vigente em Angola há mais de 30 anos. "Angola tem problemas sociais muito contundentes", afirma Wegenast.

Já o coordenador da organização Mais Democracia, João Roberto Pinto, consegue encontrar semelhanças entre alguns movimentos globais. Ele aproxima as manifestações brasileiras dos Indignados da Espanha e do Occupy Wall Street.

Segundo o cientista político, essas mobilizações têm o mesmo alvo. "O poder econômico vem capturando a representação política. Isso não é novo, mas chegou a um ponto que saturou o povo."

Já o diretor-executivo da Transparência Brasil, Cláudio Abramo, evita comparar as manifestações brasileiras com as de outros países porque seriam "contextos diferentes".

Abramo concorda com Pinto quando se fala em crise na representação política no Brasil. Ele diz não acreditar que o motivo dos levantes seja somente o aumento da passagem de ônibus. "Parece ser uma desilusão generalizada perante a representatividade do sistema político. Os partidos não representam ninguém, a não ser a si próprios", destaca.

Surpresa e contradição

Manifestantes do Occupy, que criticam a distribuição de rendaFoto: dapd

Wegenast diz que não esperava uma mobilização deste porte neste momento no Brasil. "É meio contraditório ver um movimento de insatisfação tendo em vista todo este crescimento econômico e estes programas sociais das últimas décadas", afirma.

Abramo discorda que haja uma contradição. "A transferência de recursos para camadas mais pobres, como ocorreu nos programas sociais brasileiros, não causa impacto na classe média urbana, que é a camada da população mais sensível às ações do Estado."

Pinto descarta que os movimentos brasileiros estejam isentos de sofrer influência político-partidária. O coordenador do Mais Democracia celebra o interesse da população de protestar por maior participação nas decisões sobre questões do seu cotidiano.

"No Rio, o pessoal quer discutir as concessões para o sistema de transporte. Querem que as empresas abram suas planilhas de custo para ver a justificativa de distribuição das linhas e de correções nas tarifas", argumenta.

Em outros países emergentes

Na Turquia, o primeiro-ministro Recep Tayyip Erdogan qualificou os protestos de "um ataque à democracia turca", uma reação bem diferente da expressada pelas autoridades brasileiras. Para Wegenast, o cenário político é outro. "A Turquia é uma quase-democracia, com direitos civis limitados, sem transparência e sem mídia independente", salienta.

Para o analista, no caso do Brasil não se trata de um governante em perigo, que manda a polícia reprimir violentamente a oposição, como nos países da Primavera Árabe.

Manifestações em outros países do Brics também não encontram semelhanças com a onda de protestos brasileira.

O governo sul-africano não enfrenta levantes em série, mas vem sendo criticado há meses pela repressão à manifestação dos mineiros de Marikana, que deixou 34 mortos em agosto passado. Os trabalhadores reivindicaram melhores salários e foram alvejados pela polícia, numa repressão que lembrou os piores anos do Apartheid.

Na Rússia, além de optar pela repressão, o governo enfrenta os protestos mobilizando organizações aliadas para "contra-manifestações". Na China, a repressão do regime evita ações mais audaciosas por parte da população. Os levantes brasileiros também não se comparam aos conflitos religiosos na Índia, razão de intervenção enérgica do Estado.

"A repressão na China e na Rússia é para a sobrevivência do regime. Os governos sufocam qualquer movimento para permanecer no poder", salienta Wegenast. "O Brasil ainda é visto como a democracia mais sólida do Brics."

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