Preso sob suspeita de planejar atentado, Sascha L. publicou na internet, anos atrás, vídeos contra muçulmanos e imigrantes. Especialistas em radicalização dizem que trocar de movimentos extremistas não é incomum.
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O suposto terrorista islâmico preso na semana passada na cidade alemã de Northeim era militante neonazista antes de se converter ao islamismo, informou a imprensa alemã. Segundo a agência de notícias dpa e a revista Der Spiegel, investigadores encontraram um canal no Youtube e um perfil no Facebook que pertenciam a Sascha L., nos quais ele xingava muçulmanos, imigrantes e antifascistas.
Sascha L.foi preso em 21 de fevereiro sob suspeita de planejar um ato terrorista e armazenar "itens e produtos químicos" para a fabricação de explosivos. "O acusado pertence à cena salafista", afirmou a promotoria pública, em comunicado, se referindo ao movimento islâmico ultraconservador. "Durante seu primeiro interrogatório, ele admitiu planejar atrair policiais ou soldados para uma armadilha e depois matá-los com um explosivo caseiro", prossegue o texto.
Em 2013, o suspeito, agora com 26 anos, postou vídeos em que fala de uma "morte lenta do povo", acusando os muçulmanos de tentarem impor a lei da sharia na Alemanha. "Até um cão sabe aonde ele pertence – e onde você pertence? Não seja mais burro do que um cão e salve a população alemã desta extinção planejada!", citou a Der Spiegel.
A retórica da "morte do povo", assim como uma máscara branca que ele usava em alguns dos vídeos, sugerem que Sascha L. se identificava com a campanha neonazista conhecida como "Die Unsterblichen" (Os imortais), que realizou uma série de flash mobs na Alemanha em 2012. Há outro vídeo, datado de maio de 2013, intitulado Dicas para combater baratas, em que ele incita ataques contra imigrantes na Alemanha.
Aparentemente, Sascha L. se converteu ao islamismo em 2014, quando foi processado, acusado de divulgar na internet mensagens do "Estado Islâmico". Promotores públicos da cidade de Celle, responsáveis pelo caso, se recusaram a comentar as informações divulgadas pela imprensa.
Mudança de radicalismo
Esta não é a primeira vez no país que um criminoso muda de um grupo extremista para outro. Em 2012, Bernhard Falk, ex-membro do grupo de extrema esquerda chamado "Célula Anti-imperialista" convertido ao islamismo na prisão, publicou um documento convocando ataques à base aérea militar de Ramstein, na Alemanha, depois de aparentemente ter jurado lealdade à rede terrorista Al Qaeda.
O caso mais famoso na Alemanha é o de Horst Mahler, um membro fundador do grupo terrorista de extrema esquerda Fração do Exército Vermelho (RAF), que mais tarde se voltou para o radicalismo de extrema direita.
"As ideologias do extremismo de direita e do extremismo religioso são muito semelhantes", frisa Thomas Mücke, diretor da Rede de Prevenção à Violência, organização que administra programas de desradicalização na Alemanha. Ele não se surpreende com os casos extremos de conversão, como o de Sascha L. "Onde quer o extremismo esteja presente, há sempre a tentativa de se marginalizar outras pessoas, buscar uma comunidade homogênea e oposta à democracia", afirma.
Psicologia ou condicionamento social?
Michaela Glaser, que dirige na cidade de Halle um grupo de prevenção à violência extremista no Instituto Alemão da Juventude (DJI, na sigla em alemão), acredita que uma tendência em relação ao extremismo tem menos a ver com padrões psicológicos e mais com as condições sociais. "É uma combinação das experiências de alguém, a partir das quais certas coisas se tornam plausíveis", diz, em entrevista à DW. "Há certas experiências de socialização que as pessoas têm que fazem com que, no geral, opções extremistas se tornem mais atraentes", explica.
"Há motivos muito diferentes para que as pessoas se juntem a esses grupos, mas entre esses motivos está, definitivamente, uma compensação pela falta de reconhecimento, pela falta de um sentimento de pertencer a algum lugar, uma busca por clareza, por saber onde se está", diz. "E essas são coisas que essas ideologias sempre atendem. Cada uma de um jeito diferente e eles pertencem, claro, a diferentes grupos sociais. Por exemplo, é obviamente muito mais difícil para alguém com histórico de migração ter acesso a um grupo extremista de direita."
Glaser argumenta que o que todas as ideologias extremistas oferecem às pessoas é uma distinção clara entre o bem e o mal e um sentimento de que seus adeptos pertencem a um grupo especial – e que um sentimento de autoestima é transmitido, através da sensação de se pertencer ao grupo. Em outras palavras, enquanto o extremismo de direita atua fazendo distinções entre raças, o extremismo islâmico funciona dividindo as pessoas entre fiéis e infiéis. Mas a estrutura é semelhante.
Cronologia: terrorismo na Alemanha
Há muito tempo a Alemanha já é alvo de atentados e planos de ataques de grupos extremistas. O mais recente aconteceu num mercado de Natal em Berlim, onde um caminhão avançou contra a multidão.
Foto: Reuters/W. Rattay
Dezembro de 2016: Berlim
Um caminhão invadiu a calçada e avançou contra o mercado natalino na praça Breitscheidplatz, em Berlim. Segundo a polícia, ao menos 12 pessoas morreram e 48 ficaram feridas.
Foto: Reuters/F. Bensch
Outubro de 2016: Leipzig
A polícia prendeu o refugiado sírio de 22 anos Jaber al-Bark após descobrir explosivos e equipamentos para fabricação de bombas caseiras no seu apartamento em Chemnitz, próximo a Leipzig, no leste da Alemanha. Ele foi acusado de planejar um ataque ao aeroporto de Berlim. Depois de dois dias na prisão, al-Bark se enforcou.
Foto: Polizei Sachsen
Julho de 2016: Ansbach
Em julho, o "Estado Islâmico" (EI) reivindicou a autoria do ataque executado pelo refugiado sírio Mohammed D., de 27 anos. D., que já havia jurado lealdade ao grupo extremista, detonou explosivos presos ao próprio corpo na entrada de um festival de música. O homem, que tinha problemas psiquiátricos, obteve instruções pelo celular até instantes antes do ataque.
Foto: picture alliance/AP Photo/D. Karmann
Julho de 2016: Würzburg
Um refugiado afegão de 17 anos atacou, com um machado e uma faca, passageiros de um trem regional em Würzburg, na Baviera. Várias pessoas ficaram feridas gravemente, incluindo quatro membros de uma família de Hong Kong. O jovem foi morto pela polícia. Embora o EI tenha reivindicado a autoria do atentado, para as autoridades não está claro se o rapaz mantinha contato com o grupo extremista.
Foto: picture-alliance/dpa/K. Hildenbrand
Maio de 2016: Düsseldorf
Três suspeitos de integrar o EI foram presos nos estados de Renânia do Norte-Vestfália, Brandemburgo e Baden-Württemberg. Autoridades afirmam que dois dos homens planejavam detonar bombas presas ao próprio corpo, enquanto o terceiro integrante e um quatro jihadista, preso na França, planejavam matar pedestres com armas e explosivos. Os atentados aconteceriam em Düsseldorf, no oeste da Alemanha.
Foto: picture-alliance/dpa/M. Hitij
Abril de 2016: Essen
A polícia prendeu três pessoas após um ataque a bomba a um templo sikh em Essen, no oeste da Alemanha. O atentado aconteceu durante uma celebração de casamento. Três pessoas ficaram gravemente feridas. As autoridades identificaram os suspeitos a partir de imagens de câmeras de segurança. Entre os detidos está um jovem de 16 anos, que teria contato com o movimento salafista no país.
Foto: picture alliance/dpa/M. Kusch
Fevereiro de 2016: Hannover
A jovem Safia S., de 16 anos, alemã de ascendência marroquina, esfaqueou um policial na estação central de Hannover, cidade no norte da Alemanha. O agente foi gravemente ferido e precisou ser submetido a uma cirurgia. Segundo as autoridades, S. planejava se juntar ao EI na Síria.
Foto: Polizei
Fevereiro de 2016: Berlim
Numa operação simultânea em três estados, a polícia alemã desmantelou uma célula do grupo extremista EI. Os quatro suspeitos, da Argélia, planejavam um ataque na capital do país. Segundo a polícia, o plano ainda estava no início.
Foto: Reuters/F. Bensch
Abril de 2015: Oberursel
A polícia prendeu em Oberursel, no oeste alemão, um casal acusado de planejar um ataque durante uma corrida de ciclismo. Os dois, que seriam salafistas, mantinham no porão de casa uma bomba caseira. Por falta de provas de vínculo terrorista, o homem foi condenado a dois anos de prisão por falsidade ideológica e posse de arma e explosivos ilegais. As investigações contra a esposa foram arquivadas.
Foto: picture-alliance/dpa/A. Dedert
Dezembro de 2012: Bonn
Uma mala com explosivos foi encontrada na estação central de Bonn, oeste do país. Para as autoridades, tratava-se de uma tentativa de ataque terrorista com motivações islamistas. Em 2013, quatro suspeitos de planejar um ataque contra o líder do grupo extremista de direita "Pro NRW" foram presos. Um deles teria colocado a bomba em Bonn. O processo contra o suspeito corre desde 2014, em Düsseldorf.
Foto: picture-alliance/dpa/Meike Böschemeyer
Abril de 2011: Düsseldorf
Três supostos membros do grupo terrorista Al Qaeda foram detidos em Düsseldorf, acusados de planejar um ataque a bomba no país. Em dezembro de 2011, um quarto suspeito foi preso. No final de 2014, os quatro homens foram condenados a vários anos de prisão.
Foto: picture-alliance/dpa
Março de 2011: Frankfurt am Main
As autoridades conseguiram impedir um atentado islamista no aeroporto de Frankfurt. Um albanês de Kosovo matou a tiros dois soldados americanos e deixou outros dois feridos. O homem foi condenado à prisão perpétua.
Foto: AP
Setembro de 2007: Oberschledorn
Em setembro de 2007, a organização islamista Grupo Sauerland foi desmantelada no oeste da Alemanha. Em 2010, seus quatro integrantes foram condenados por planejarem ataques em discotecas, aeroportos e instituições no país. As penas chegaram a 12 anos de prisão.
Foto: AP
Julho de 2006: Colônia
Na estação central de Colônia, no oeste do país, dois homens colocaram malas com explosivos em trens regionais que iam para Hamm e Koblenz, mas as bombas não detonaram. Em dezembro de 2008, um deles foi condenado à prisão perpétua.