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Itália sob o signo do combate ideológico

Oliver Samson (av)3 de abril de 2006

O prestígio de Berlusconi vai caindo à medida que se aproximam as eleições parlamentares. O último debate televisivo com Prodi foi catastrófico para o premier. Porém o jogo ainda não está perdido para o magnata da mídia.

Silvio Berlusconi e as 'crianças cozidas' de MaoFoto: AP

Crescimento econômico zero, corrupção e sonegação de impostos em alta, isolamento dentro da Europa, situação de segurança complicada pela participação na guerra contra o Iraque.

"Itália é o grande doente da Europa", sentenciou uma manchete do norte-americano The Economist. Só quem não concorda são os órgãos de imprensa pertencentes ao império midiático do primeiro-ministro Silvio Berlusconi.

O estado de saúde da Itália é um dos motivos por que o pleito dos dias 9 e 10 de abril é uma questão tão séria; justificando extremos impensáveis em quase qualquer outro país da União Européia.

Um outro motivo: a Itália atravessa uma verdadeira "campanha eleitoral ideológica", analisa Andreas Maurer, da Fundação de Ciência e Política (SWP), sediada em Berlim. A luta é tão mais ferrenha "pelo fato de os candidatos não se gostarem tanto assim", completa o especialista em assuntos italianos.

Forza versus Unione

Direita contra esquerda, comunistas contra democratas-cristãos: na verdade a Itália está sempre em estado de confronto ideológico. E no entanto 2006 tem algo de diverso. Após uma série de escândalos de corrupção, no início da década de 90, os grandes partidos populistas italianos caíram.

Candidato de oposição Romano ProdiFoto: AP

Em conseqüência, o país se dividiu num espectro de partidos e minipartidos, do norte ao sul, da extrema esquerda à extrema direita. Agora o sistema partidário bipolar parece haver-se consolidado de forma que há dois pólos ideológicos relativamente estáveis, ainda que muito heterogêneos.

De um lado está Silvio Berlusconi, cuja Forza Italia lidera a aliança de centro-direita Casa della Libertà. Do outro, o sóbrio economista Romano Prodi, cabeça da coalizão de centro-esquerda Unione.

Comunistas cozinham bebês

O retorno ao antigo sistema eleitoral proporcional – sancionado pelo governo Berlusconi em dezembro de 2005 – favoreceu essa nova polarização. A exigência de um mínimo de 4% nas urnas seria o fim da maioria dos pequenos e minipartidos. Contudo, na qualidade de afiliados de uma das alianças – em princípio bastante permeáveis – bastam apenas 2% dos votos para estes entrarem para o parlamento.

O debate entre os dois pólos ideológicos, quer envolvendo conteúdos ou pessoas, transcorre na Itália em tom exacerbado. "Quem observou a campanha eleitoral tem a impressão, plenamente justificada, de que a Itália se encontra à beira da guerra civil", comenta o conceituado analista político Sergio Romano.

A campanha é brusca e barulhenta, por vezes absurda e grotesca. E, no mais das vezes, antes ofensiva do que divertida. A oposição acusa o primeiro-ministro de fracasso na política econômica, corrupção e conexões com a Máfia.

Enquanto isso, Berlusconi acirra difusos temores contra "os comunistas". Suas gafes estilísticas já se tornaram lendárias. No último domingo (26/04), ele afirmou, durante um evento eleitoral, que na China de Mao "bebês eram cozidos para adubar os campos".

Neofascistas e a neta do duce

Berlusconi atribui à obra dos "esquerdistas" quase tudo o que percebe como negativo. Ele calcula em 85% a onipotência dos "jornalistas comunistas". Estimativa curiosa, já que a rede televisiva do país está praticamente toda em suas mãos.

Cartaz da neta do ditador fascista Benito MussoliniFoto: AP

Neste meio tempo, o bom desempenho eleitoral do magnata da mídia se confina às pesquisas de intenção de voto realizadas por suas próprias emissoras. Porém um quarto dos eleitores ainda parece estar indeciso. Berlusconi necessita urgentemente de novos votos e para tal está pronto a pescar em águas turvas.

Ele não hesitou em se aliar à Alternativa Soziale, de extrema-esquerda, da neta do duce, Alessandra Mussolini. Da mesma forma, abriu suas portas ao neofascista MS-FT, cujo líder pouco antes causara indignação com suas tiradas sobre o Holocausto.

Berlusconi em pessoa jogou a carta da xenofobia, ao se pronunciar em 27 de março último contra o ingresso de novos imigrantes na Itália. "É possível que desse modo Berlusconi angarie pontos junto à classe média italiana", especula o especialista Maurer. Este não considera o pleito como totalmente perdido para o premier: "Um escândalo da esquerda pode voltar a projetá-lo para a frente".

Esquerda é sempre a culpada

Além disso, Berlusconi conta com a amigável ajuda do estrangeiro. A Secretaria norte-americana de Estado expressou em 21 de março "preocupação quanto à segurança" na Itália. Pretexto para tal foi um confronto de rua entre extremistas de esquerda e a polícia, após manifestação fascista em Milão que fez 18 feridos.

Na interpretação de Berlusconi, foram as hostilidades dos esquerdistas contra os partidos de centro-esquerda que semearam tal ódio. Outro exemplo disso seriam as recentes queixas judiciais contra sua pessoa e as investidas dos "intelectuais de esquerda" armados de seus "programas políticos".

O resultado do último debate debate televisivo com Prodi foi catastrófico para o premier, e o novo encontro, nesta segunda-feira (03/04), é sua chance de revanche.

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