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"João Paulo II deixa herança pesada"

Geraldo Hoffmann7 de abril de 2005

Despedida de João Paulo II une católicos, mas também gera críticas ao papa e ao Vaticano. Teólogo alemão compara velório em Roma ao funeral do aiatolá Khomeini. Alemães esperam mais flexibilidade do novo papa.

Para mídia, Vaticano virou "centro do mundo" nos últimos diasFoto: AP

Antes mesmo de João Paulo II ser enterrado, nesta sexta-feira (08/04), tornam-se cada vez mais abertas as críticas ao estilo como ele conduziu a Igreja Católica, nos últimos 26 anos. Também o Vaticano sofre ataques, inclusive por integrantes da Igreja Católica.

Em artigo publicado pelo jornal Netzeitung, o teólogo suíço Hans Küng, radicado na Alemanha, afirma que "João Paulo II deixa uma herança pesada para a Igreja Católica. Sua piedade pessoal e seu engajamento são indiscutíveis, mas a Igreja vive uma crise de esperança e confiança. A política interna do papa polonês foi desastrosa", escreveu. Küng, que fundou um instituto especializado em ética mundial em Tübingen, foi proibido de lecionar Teologia, em 1979, por suas críticas ao papa como instituição.

"Funeral de aiatolá"

Teólogo Eugen Drewermann compara enterro de João Paulo II ao funeral do aiatolá Khomeini.Foto: AP

O teólogo Eugen Drewermann criticou os balanços que tem sido feitos do pontificado de Karol Wojtyla. "João Paulo II avaliou os problemas mundiais de um ponto de vista muito estreito. Os políticos exageram ao elogiar o papa como um visionário, que teria contribuído para a queda do comunismo no Leste Europeu, o que é historicamente errado", disse à emissora n-tv.

Drewermann, um ex-padre que também foi proibido de lecionar Teologia por criticar o poder da Igreja, ressaltou que o papa rejeitou o comunismo "devido ao ateísmo e não por causa da ideologia desse sistema". Ele atacou também as cerimônias de luto no Vaticano. "O que acontece nesses dias, lembra os funerais do aiatolá Khomeini. O papa despediu-se do trono com a mesma pretensão de infalibilidade que teve o líder islâmico. A Igreja Católica, porém, precisa urgentemente da liberdade de admitir opiniões diferentes, o que não foi possível sob João Paulo II", disse.

Críticas ao Vaticano

Bush e Clinton no velório do papa na basílica de São PedroFoto: AP

O luto pelo papa, aparentemente, uniu os católicos (e até políticos não acostumados a rezar), não só na Itália, invadida por milhões fiéis de todo o mundo nos últimos dias - e por chefes de Estado e de governo nas últimas horas. Ainda que o noticiário sobre o velório do papa seja dominado por cenas de comoção e piedade, também não faltam críticas dos italianos. Mas a multidão e o Vaticano preferem não ouví-las.

"O papel do papa é visto majoritariamente de forma negativa pelo meu partido, principalmente por sua postura conservadora em relação à moral sexual", diz Giuseppe Santarelli, ativista do partido Refundação Comunista (ex-PCI). Apesar disso, acrescenta, "respeito seu papel como pacifista e de luta contra os excessos do capitalismo.

"Os homossexuais foram excluídos da sociedade italiana, devido à linha tradicionalista de João Paulo II", afirma Sergio Li Giudice, presidente da Associação de Homossexuais Arcigay. João Paulo II sempre definiu a homossexualidade como pecado mortal. Segundo Giudice, os meios de comunicação não se interessem por opiniões divergentes do papa nesses dias.

"Noticiário de regime religioso"

O noticiário, principalmente da TV, sobre a morte do papa é rejeitado por muitos italianos. "Na Itália, há uma clara separação constitucional entre Estado e Igreja, mas esse noticiário lembra a televisão de um regime religioso", reclama Gina Siddu-Pilia, professora da Universidade Americana de Roma.

Segundo o professor e escritor Umberto Galimberti, "as posições inflexíveis de João Paulo II nas questões da homossexualidade, controle de natalidade, aborto e aids acirraram conflitos e impediram soluções".

Ateístas e mulheres

Acesso das mulheres a cargos eclesiásticos ainda é restringido pelo VaticanoFoto: AP

A Associação Italiana de Ateístas e Agnósticos Racionais advertiu, em comunicado oficial, que as deficiências do papa como instituição não devem ser encobertas pela mídia através de um noticiário parcial sofre o sofrimento pessoal por que passou João Paulo II. "A Igreja de João Paulo II fechou-se à realidade moderna", disse o presidente da entidade, Francesco Saverio Paoletti.

"Foi a Igreja Católica que tornou tão difícil a situação das mulheres na Itália", afirma Laura Brazelli, do Centro Social Mario Miele, em Roma. Apenas 9,8% dos integrantes do Parlamento italiano são mulheres.

Mais flexibilidade

Annette Schavan espera que mais teólogas possam lecionar Teologia em universidadesFoto: AP

Já os católicos alemães, que tiveram vários atritos com o Vaticano durante o pontificado de João Paulo II, esperam mais flexibilidade do novo papa. Isso vale também para o acesso de mulheres aos cargos eclesiásticos. A vice-presidente do Comitê Central dos Católicos Alemães e secretária de Cultura do Estado de Baden-Wurttemberg, Annette Schavan, considera possível, por exemplo, que mais mulheres lecionem Teologia nas universidades. "Com isso, a Igreja conquistaria novos cérebros, permitindo sua própria renovação"

Numa crítica não muito velada à linha conservadora de João Paulo II, o presidente do Bundestag (Parlamento Alemão), Wolfgang Thierse (SPD), disse esperar que o novo papa "combine melhor a unidade com a abertura, a unidade com a diversidade".

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