Jogadores alemães aderem a campanha em apoio a colegas gays
18 de fevereiro de 2021
Sob o slogan "Contem conosco", mais de 800 jogadores de futebol oferecem apoio público a atletas LGBTQ. Poucos se sentem confortáveis em revelar sua sexualidade num ambiente historicamente marcado pela homofobia.
Anúncio
Centenas de jogadores de futebol na Alemanha aceitaram tomar parte em uma campanha lançada pela revista sobre futebol 11Freunde (11 amigos) para oferecer apoio a colegas LGBTQ e se posicionar contra a homofobia no esporte.
A mais recente edição da revista, que sai esta semana, tem várias capas diferentes, que mostram jogadores de futebol segurando cartazes com os dizeres: "Ihr könnt auf uns zählen!" ("Vocês podem contar conosco!")
Entre as estrelas que apoiam a campanha estão os jogadores da Bundesliga Max Kruse e Christopher Trimmel, do Union Berlin, assim como Dedryck Boyata e Niklas Stark, do Hertha Berlin. Sebastian Ohlsson, do St. Pauli, que joga na segunda divisão, e a goleira Almuth Schult, do Wolfsburg, também participam.
No total, mais de 800 jogadores do sexo masculino e feminino aceitaram participar da campanha. Segundo os organizadores, o objetivo não é forçar ninguém a "sair do armário", mas sim oferecer apoio e criar um ambiente mais de maior aceitação.
"Mesmo em 2021, ainda não há nenhum jogador assumidamente homossexual no futebol masculino profissional", diz uma declaração compartilhada pela capitã da seleção feminina de Futebol, Alexandra Popp, e pelo presidente-executivo do Borussia Dortmund, Hans-Joachim Watzke, entre outros.
"O medo de ser atacado, excluído ou de ter a carreira prejudicada ainda é tão grande que os jogadores gays ainda acreditam que precisam esconder sua sexualidade. Queremos apoiar, encorajar e, se necessário, defendê-los contra ataques, porque vocês estariam fazendo a coisa certa. Estamos do seu lado", completa o texto.
Anúncio
Lahm aconselha cautela
O ex-jogador do Stuttgart Aston Villa e o da seleção alemã Thomas Hitzlsperger, que revelou ser gay após encerrar sua carreira, escreveu no Twitter que a campanha foi "mais um passo na direção certa".
Mas, paralelamente, seu ex-companheiro de seleção Philipp Lahm aconselhou cautela em um livro recém-lançado.
"No momento, parece-me que há poucas chances de que um jogador consiga sair do armário na Bundesliga e ficar ileso", escreveu o ex-capitão alemão da Copa do Mundo de 2014 em seu livro Das Spiel: Die Welt des Fussballs (O Jogo: O Mundo do Futebol).
"A responsabilidade seria grande demais para mim", continua ele, acrescentando que ficaria preocupado com "abusos, insultos e outros comentários difamatórios" vindos das arquibancadas. "Quem poderia suportar isso e por quanto tempo?"
O próprio Lahm apareceu na capa da revista LGBTQ Front em 2007. Numa entrevista concedida à publicação, ele disse: "Se um jogador é gay, ele ainda é meu companheiro de equipe e meu relacionamento com ele não mudaria em nada. Estou feliz por viver em um sociedade liberal e aberta na qual a coexistência tolerante é possível sem preconceitos discriminatórios."
Mas, diz ele, ainda está preocupado com os níveis de aceitação no futebol.
Mudanças na cultura dos torcedores alemães
No entanto, embora as torcidas na Alemanha continuem sendo predominantemente masculinas e heterossexuais, o futebol alemão e a cultura de arquibancada vêm se tornando cada vez mais diversificados e acolhedores nos últimos anos. Canções, gritos e comentários preconceituosos estão lentamente sendo questionados.
Torcedores fanáticos do St. Pauli, clube de Hamburgo da segunda divisão, por exemplo, são bem conhecidos por suas posturas anti-homofóbicas e outras atitudes antidiscriminatórias, e têm entoado cantos com mensagens como "Ame quem você quiser" e "Todas as cores são lindas".
Em Dortmund, torcedores envolvidos com a campanha contra o preconceito "Ballspiel vereint!" (Jogo de bola unido) têm exibido mensagens contra a homofobia em meio à célebre "Muralha Amarela" que concentra torcedores em pé com as cores do time no Westfalenstadion. Adesivos distribuídos pelo grupo proclamam: "Terra vermelha, muralha amarela, BVB multicolorido!"
E após o lançamento da campanha da revista 11Freunde na quarta-feira, torcedores e jornalistas esportivos alemães também começaram a compartilhar fotos suas com a mensagem: "Vocês podem contar conosco".
"Posso entender qualquer pessoa que prefira não enfrentar isso", disse o atacante Max Kruse, do Union Berlin. "Mas se um dos meus companheiros saísse do armário, eu o protegeria dos idiotas lá fora."
Enquanto o futebol masculino na Alemanha ainda aguarda seu primeiro jogador abertamente gay, o futebol feminino tem se mostrado mais progressista. O Wolfsburg tem até um casal no seu time, Anna Blässe e Lara Dickenmann.
"Em campo, não importa de quem você gosta, o que importa é o seu desempenho", disse Alexandra Popp, que também é capitã do Wolfsburg. "Se alguém resolvesse se revelar, realmente acredito que seria uma espécie de libertação, que poderia ajudar a impulsionar seu desempenho em 1% ou 2%. É importante que todos propaguem essa mensagem."
jps/lf (dw, sid, dpa)
Futebol e política - 150 anos de histórias
O esporte mais popular do mundo comemora 150 anos de existência e, nesse espaço de tempo, teve momentos de conotação política e influência direta na humanidade, desde trégua em guerras à confraternização de etnias.
Foto: picture-alliance/dpa
A trégua de Natal
Véspera de Natal de 1914. A Europa estava em plena Primeira Guerra Mundial, mas soldados alemães e britânicos organizaram um cessar-fogo não oficial ao longo de toda a frente ocidental. O início da "Trégua de Natal" foi na região de Ypres, na Bélgica, onde as tropas adversárias decoraram as trincheiras, trocaram presentes e jogaram uma partida de futebol.
Foto: PD
O mártir do Wunderteam
No dia 3 de abril de 1938, a Alemanha enfrentou o "Wunderteam" da Áustria no famoso "Jogo da Anexação". Matthias Sindelar (esq. camisa escura) marcou um dos gols da vitória austríaca e comemorou efusivamente na frente dos políticos nazistas. Na Copa de 1938 ele se recusou a defender a Alemanha e, em janeiro de 1939, foi encontrado morto, asfixiado por monóxido de carbono na própria cama.
Foto: picture alliance/Schirner Sportfoto
A partida da morte
O FC Start é provavelmente o maior símbolo esportivo de resistência ao nazismo. Mesmo ciente das consequências, o time (de branco) se recusou a fazer a saudação nazista e ousou vencer - pela segunda vez - a Flakelf, equipe da Força Aérea alemã, no dia 9 de agosto de 1942. Pouco tempo depois, os jogadores foram levados para campos de concentração. A grande maioria morreu sob tortura.
Foto: PD
Capitalismo versus socialismo
Em plena Guerra Fria, no dia 25 de novembro de 1953, a melhor seleção da época, a Hungria, enfrentou a Inglaterra no Estádio de Wembley. O confronto tornou-se importante propaganda para as duas ideologias. Os socialistas, liderados por Ferenc Puskas (esq.), venceram os capitalistas por 6 a 3. Foi a primeira derrota inglesa em casa em 90 anos de futebol.
Foto: Getty Images
"El Clásico"
Assim como o ditador Benito Mussolini sentenciou o "Vencer ou Morrer" para a seleção italiana na Copa de 1938, o general Franco também usou o futebol para enaltecer a Espanha que dirigia. E, em oposição aos catalães, ele usou o Real Madrid como ferramenta propagandista nos anos 50 e 60, originando uma das maiores rivalidades do futebol mundial.
Foto: picture-alliance/dpa
A Guerra das Cem Horas
O futebol é uma atividade de confraternização, mas em 1969 os jogos pelas Eliminatórias entre El Salvador e Honduras transbordaram na "Guerra das Cem Horas". Obviamente as razões do conflito foram de ordem econômica e política, mas a animosidade nos jogos foi o estopim para quatro dias sangrentos com seis mil mortos. No jogo decisivo, em campo neutro, El Salvador venceu e foi à Copa de 70.
Foto: picture-alliance/Sven Simon
A guerra parou para ver Pelé
Em excursão pela África em 1969, o Santos parou a Guerra de Biafra, na Nigéria. O governador da região nigeriana inclusive autorizou a liberação da ponte que ligava a cidade de Benin - local do jogo - e Sapele, para que todos pudessem ver o Rei Pelé (na foto com Eusébio). Assim que o Santos subiu no avião, a guerra recomeçou.
Foto: AP
Final de Copa perto de centro de tortura
Quando o general Jorge Videla assumiu o poder e instalou uma violenta ditadura militar, a Argentina já estava definida como anfitriã da Copa de 78. Houve diversas ameaças de boicote e protestos. Paul Breitner, campeão de 74, se recusou a ir à Argentina, e a seleção holandesa, vice-campeã, protagonizou um último gesto de repúdio ao governo militar, dando as costas a Videla .
Foto: -/AFP/Getty Images
Winnie Mandela Futebol Clube
Durante o Apartheid, o futebol era um dos principais catalisadores na luta contra a segregação racial na África do Sul. Naquele período, o clube Winnie Mandela FC (nome da mulher de Nelson Mandela) servia como refúgio para líderes políticos e sindicais perseguidos pelo regime. Com o fim do Apartheid, em 1994, a seleção sul-africana se tornou um poderoso fator de coesão nacional.
Foto: Getty Images
Drogba, o artilheiro pacificador
Já eram quase cinco anos de conflito entre os rebeldes do norte e o governo na Costa do Marfim, em 2007, quando Didier Drogba propôs que a partida contra Madagascar fosse disputada em Bouaké, a capital dos rebeldes. Armas e diferenças foram colocadas de lado para celebrar a vitória por 5 a 0, um gol para cada ano da guerra que ali cessaria.
Foto: Issouf Sanogo/AFP/Getty Images
Os eleitos de Alá contra o Grande Satã
Na Copa de 98, dois países de relação politicamente marcada pela animosidade se enfrentaram sob suspense em Lyon: Estados Unidos e Irã. Com a pregação antiamericana, os aiatolás tentaram capitalizar o confronto e o trataram como o duelo entre os "eleitos de Alá" e o "Grande Satã". Antes do jogo, porém, iranianos entregaram flores e posaram abraçados com os jogadores dos EUA.
Foto: Stu Forster/Allsport
Afeganistão recupera identidade na bola
Devido à invasão russa, a guerras civis e ao regime talibã, o futebol deixou de ser praticado no Afeganistão entre 1984 e 2002. A primeira partida oficial em território afegão ocorreu apenas no dia 20 de agosto de 2013. Três semanas depois, os afegãos conquistaram seu primeiro título internacional, a Copa da Federação do Sul da Ásia, recuperando um pouco de sua identidade.
Foto: Prakash Mathema/AFP/Getty Images
Futebol como unificador de povos
Com o colapso da Iugoslávia, cresceram as tensões étnicas na região - que o futebol, mesmo que por um instante, conseguiu apaziguar. Com a inédita classificação da Bósnia para a Copa de 2014, sérvios, croatas e muçulmanos foram às ruas festejar. Unidos.