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Jogo do universo Harry Potter é alvo de pedidos de boicote

Tanya Ott
10 de fevereiro de 2023

Fãs celebram lançamento de "Hogwarts Legacy", novo jogo temático da franquia. Mas há quem apele por um boicote, com escritora J. K. Rowling acusada de transfobia e antissemitismo.

Jogo Legado de Hogwarts, baseado na série/franquia Harry Potter, mostra nesta imagem um personagem apontando uma varinha mágina para cima. Ao fundo, há fogo por todos os lados.
Alvo de controvérsias nas redes sociais e fóruns, "Hogwarts Legacy" é sucesso de vendasFoto: 2023 Warner Bros. Entertainment Inc.

Os gamers, especialmente os fãs do universo de Harry Potter , esperavam há anos pelo lançamento do Hogwarts Legacy (Legado de Hogwarts), um jogo imersivo, no estilo role-playing game (RPG), jogos de representação, cujos participantes assumem o papel de personagens e criam narrativas em interação.

Passando-se no fim do século 19, Hogwarts Legacy proporciona aos jogadores a experiência virtual de frequentar uma escola de magia, incluindo o uso de vassouras voadoras, poções mágicas e feitiços. Essa é a produção mais recente da franquia Harry Potter, baseada nos livros da inglesa J. K. Rowling.

Escritora J. K. Rowling teria atacado os direitos das pessoas transgênerosFoto: Tolga Akmen/AFP/Getty Images

Culpa por associação?

O lançamento do jogo, nesta sexta-feira (10/02), tem sido, porém, acompanhado por controvérsia, principalmente devido à associação indireta com J. K. Rowling, que nos últimos anos protagonizou manchetes negativas ao tomar uma posição que a colocou na mira dos ativistas de direitos dos transgêneros.

O que começou em 2018 com a "curtida" de um tuíte que descrevia mulheres trans como nada mais do que "homens de vestido" – episódio que a equipe de Rowling caracterizou como um "momento de meia-idade" causado por uma "escorregada de polegar" –, evoluiu para um mergulho fundo da milionária na ideologia antitrans, expressada em tuítes, posts em blogs e romances fora da franquia Harry Potter.

Há muito elogiada por sua filantropia, no entanto Rowling financiou um centro para mulheres que barra especificamente mulheres trans. Recentemente, manifestou-se contra a primeira-ministra escocesa, Nicola Sturgeon, por apoiar uma lei de autoidentificação que tornaria mais fácil para pessoas trans mudarem seus indicadores de gênero.

Devido a tudo isso, parecem inevitáveis os apelos – debatidos calorosamente online – a um boicote a Hogwarts Legacy.

A própria autora denunciou a gamer trans chamada Jessie Earl, que apoia o boicote, acusando-a de "purethink" e equiparando a atitude à queima de livros e bibliotecas. (Embora não se encontre na internet nenhuma definição do termo "purethink", presume-se que Rowling estaria se referindo a uma ideologia intolerante que não admite a existência de nenhuma outra opinião.)

O debate esquentou tanto, que um fórum de jogos proibiu qualquer discussão a respeito.

Jogo proporciona aos participantes a experiência virtual de frequentar uma escola de magiaFoto: 2023 Warner Bros. Entertainment Inc.

Quão efetivo é um boicote?

Ainda assim, há jogadores, até mesmo da comunidade trans, que questionam a eficácia de um boicote, afirmando que um "consumo ético" é impossível dentro da estrutura do capitalismo global.

Alguns pretendem comprar o jogo "de segunda mão" ou mesmo adquirir uma cópia pirata. E há também quem defenda o distanciamento entre criador e criatura, e que a importância que o "Mundo Mágico de Harry Potter" teve para tantas infâncias gera um sentido que ultrapassa o que Rowling pretendia.

No entanto, será que as opiniões expressas publicamente sobre a criadora de um mundo de fantasia podem ser totalmente separadas do contexto de mundo real danoso a um grupo já marginalizado?

Nos Estados Unidos, por exemplo, alguns legisladores estaduais estão introduzindo cada vez mais leis destinadas a restringir os direitos de transgêneros. No Reino Unido, a lei de autoidentificação chegou a causar uma crise política entre Edimburgo e Londres.

Em meio a isso, pessoas trans, especialmente mulheres trans negras, continuam sendo alvo de violência muitas vezes mortal.

Empresa busca se distanciar da autora

A empresa Portkey Games, que produz o jogo, frisou cautelosamente que, embora o Hogwarts Legacy  seja oficialmente licenciado, Rowling não esteve envolvida no desenvolvimento da história. No entanto, terá recebido dinheiro pelo licenciamento de sua propriedade intelectual para os gamers.

A Portkey também parece estar se distanciando ainda mais de Rowling ao adicionar a primeira personagem transgênero da franquia, Sirona Ryan. O jogo também permite que os participantes criem um personagem transgênero com opções personalizadas.

Duendes da série "Harry Potter" têm sido criticados por supostamente perpetuar estereótipos antissemitasFoto: ZUMAPRESS.com/picture alliance

Acusações de antissemitismo

Não é apenas a postura controversa de Rowling em relação aos transexuais que tem provocado críticas ao jogo.

Livros e filmes da série Harry Potter têm sido acusados de perpetuar estereótipos antissemitas através dos personagens duendes, que são retratados como um grupo secreto de banqueiros narigudos. Durante séculos, a propaganda antissemita os caricaturou como homens narigudos e gananciosos.

No jogo Hogwarts Legacy, uma das tarefas é justamente combater essas figuras, que estão encenando uma "rebelião dos duendes", em protesto contra sua falta de direitos, o que inclui a proibição de usar suas próprias habilidades mágicas.

A Portkey também ficou sob fogo cruzado durante o processo de criação do jogo, com o principal produtor, Troy Leavitt, sendo criticado por ter feito vídeos com conteúdos antifeministas e misóginos. Mais tarde ele se demitiu.

Qualquer um desses fatores – ou mesmo todos eles – podem levar os jogadores a evitarem Hogwarts Legacy. Mas claramente os esforços de boicote têm falhado. Mesmo antes do lançamento, o jogo já era o mais vendido em várias plataformas.

O "Mundo Mágico de Harry Potter" continua um enorme sucesso, e muitos que cresceram com ele permanecem intensa e emocionalmente ligadas – mesmo que também pertençam a grupos marginalizados que sofrem com noções antitransgêneros.

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