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Jogo inspirado no Holocausto choca judeus na Grécia

Anthee Carassava de Atenas
3 de março de 2019

"Escape game" foi lançado com o nome "A lista de Schindler", embora empresa negue relação com capítulo sombrio da história. Num país de traços antissemitas, jogadores descrevem experiência como "inegavelmente divertida".

Jogo "escape the room" em Atenas, na Grécia
Objetivo do jogo é elaborar uma lista de sobreviventes que serão poupados da morte por forças inimigasFoto: DW/A. Carassav

O filme A lista de Schindler, de 1993, é conhecido mundialmente como uma obra épica sobre a triste história do Holocausto. Na Grécia, porém, o título serviu para batizar também um jogo de estilo "escape the room", baseado nesse episódio sombrio da Segunda Guerra Mundial. O game, que conquistou os jovens gregos, está causando indignação na comunidade judaica.

O clamor levou a empresa responsável pela sala, a Great Escape, a mudar o nome do jogo – que fazia referência direta ao filme de Steven Spielberg sobre o alemão Oskar Schindler – para "Agente secreto".

O objetivo do jogo, contudo, continua praticamente o mesmo: elaborar uma lista de sobreviventes que serão poupados de uma morte terrível por forças inimigas – uma imitação nebulosa das listas apresentadas no premiado filme de Hollywood.

Embora o jogo – anunciado com destaque no site da empresa – não faça referência explícita aos judeus ou ao Holocausto, as descrições em sites gregos atraíram jogadores ao desafiá-los a ajudar o alemão Oskar Schindler a "salvar o máximo possível de pessoas inocentes da perseguição das forças da SS [organização paramilitar nazista Schutzstaffel]" em Cracóvia, na Polônia.

Autoridades do Conselho Central de Comunidades Judaicas da Grécia (KIS, na sigla em grego) condenaram o jogo e disseram que estão considerando tomar medidas.

"Não se trata só de antissemitismo", diz o vice-presidente do conselho, Victor Eliezer, à DW. "O assim chamado sucesso desse jogo depende da ignorância que varre a sociedade grega. Pergunte por aí, e a maioria dos gregos vai dizer que Schindler foi uma espécie de estrela do rock ou jogador de futebol."

Para ele, o fato de os criadores terem alterado o nome do jogo sem efetivamente mudar o enredo sinaliza um desrespeito ainda maior.

"Tudo que eu desejo é que eles façam uma viagem a Auschwitz para sentir, mesmo por uma fração de segundo, o terror da morte em um campo de concentração alemão. Só então pode haver esperança de que eles não mais degradarão o sofrimento humano", afirma Eliezer.

A fúria do conselho judaico grego passou quase despercebida no país europeu. Os ativistas nos Estados Unidos, por outro lado, compraram a briga.

"Pegar uma experiência como o Holocausto, que foi desumanizante para as vítimas, e torná-la um jogo banaliza não apenas o episódio, mas também o sofrimento que ele causou", afirma Victoria Barnett, uma diretora do Museu Memorial do Holocausto dos Estados Unidos. "O comportamento ético é baseado em respeito e empatia por outras pessoas."

Seguindo uma moda mundial, os jogos do estilo "escape the room" ou "escape game" se tornaram muito populares em toda a Grécia. Neles, pequenos grupos de jogadores quebram a cabeça para encontrar pistas e resolver enigmas enquanto tentam escapar de um espaço temático num determinado período de tempo. Os enredos são variados.

O controverso jogo sobre o Holocausto foi primeiro lançado em Salonica, a segunda maior cidade da Grécia e lar de uma vibrante comunidade judaica que foi quase totalmente exterminada pelas forças nazistas em 1943.

Antes da Segunda Guerra, a cidade abrigava uma das maiores comunidades de judeus do mundo, o que lhe rendeu os apelidos de "Mãe de Israel" e "Jerusalém dos Bálcãs". No auge da guerra, mais de 44 mil judeus foram deportados para campos de concentração na Europa central. Apenas um punhado de sobreviventes retornou à cidade, que perdeu 96% de sua comunidade judaica.

"Não podemos esquecer. Não devemos esquecer. Não deveríamos esquecer", diz David Saltiel, presidente do Conselho Central de Comunidades Judaicas da Grécia.

Após polêmica, empresa mudou o nome do jogo, mas enredo foi mantido praticamente o mesmoFoto: DW/A. Carassav

"Aventura inegavelmente divertida"

O "escape game" sobre o Holocausto é um dos oito jogos oferecidos pela empresa Great Escape. É anunciado pela companhia como "uma das mais emocionantes salas de fuga".

Contactados por telefone, funcionários da empresa em Salonica se recusaram a comentar a polêmica. Representantes da companhia em Atenas, por sua vez, insistiram que o jogo não tem qualquer ligação com o Holocausto.

Pessoas que já participaram do jogo se recusaram a comentá-lo ao ser abordadas pela DW. Contudo, eles não pareciam estar preocupados com o impacto que o empreendimento poderia ter num país com fortes traços de antissemitismo.

Em vez disso, comentários publicados no site da companhia e no portal de viagens TripAdvisor mostraram centenas de pessoas classificando-o como uma "excelente" experiência. Um internauta o descreveu como "uma aventura inegavelmente divertida".

"A empresa pode ter renomeado o jogo, mas manteve-o funcionando", afirmou uma autoridade do Conselho Central de Comunidades Judaicas da Grécia, sob condição de anonimato. Não está claro, contudo, se a sala realmente ainda está aberta.

Jogos sobre o Holocausto

Não é a primeira vez que um "escape game" evoca o Holocausto. Em 2016, uma empresa holandesa se baseou num dos episódios mais sombrios da história do mundo para criar uma sala inspirada no bunker da Anne Frank, local onde a adolescente judia ficou escondida com sua família em Amsterdã antes de ser pega pelas forças nazistas e levada a um campo de extermínio.

Em 2017, o conselho judaico grego protestou contra "Auschwitz", outro "escape game" que, dessa vez, levou jogadores a um campo de concentração em Galatsi, nos arredores de Atenas.

As reações de judeus a jogos temáticos do Holocausto ganharam pouco impulso na Grécia, onde um dos grupos neonazistas mais violentos da Europa, o Golden Dawn, recebe regularmente cerca de 8% dos votos do país e é considerado o terceiro maior partido político.

"Isso tudo é realmente infeliz", diz Eliezer, vice-presidente do conselho. "Mas é um aviso: promover o Holocausto e a memória daqueles que pereceram abre um dos capítulos mais sombrios da história da humanidade. Somos obrigados a impedir que isso aconteça novamente."

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