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Exposição

14 de julho de 2009

Considerado por alguns um charlatão e tido por outros como o mais genial dos artistas alemães contemporâneos, Jonathan Meese ganha, aos 39 anos, retrospectiva de sua obra no Museu Arp Rolandseck, próximo a Bonn.

O polêmico Jonathan Meese: em defesa da ditadura da arteFoto: Museusm Rolandseck

A mídia alemã costuma falar de Jonathan Meese (1971) como um artista dos superlativos. O que pode se aplicar tanto no sentido positivo quanto negativo do termo. Consenso é que, quando se trata de excentricidade ou provocação, o nome de Meese é um dos primeiros a serem lembrados.

No Museu Arp Rolandseck, cuja construção numa antiga estação de trem às margens do Reno foi envolta por uma série de polêmicas, o artista foi convidado a criar seu novo reino, que intitulou Erzstaat Atlantisis (Arquiestado Atlantisis). Há que se observar aqui que o vocábulo Erz em alemão não só corresponde ao prefixo "arqui", como também é o nome usado para designar minério (ou seja, além de Arquiestado, Erzstaat está também para um Estado de minérios).

Nessa Atlantisis, Meese expõe 53 esculturas em bronze, 14 pinturas em grande formato, instalações, colagens, vídeos e, last but not least, também encenações de si mesmo – praticamente a essência de sua obra. Lembre-se aqui de suas performances com o braço levantado que remete a Hitler ou abrindo a calça e colocando uma banana para dentro, em público, durante uma vernissage em Nova York.

Mundo às avessas

Jonathan Meese está habituado a provocar. O objetivo que paira sobre toda a sua obra, costuma discursar o próprio, é o da "ditadura da arte", a construção de um "mundo completamente às avessas", que se alimenta da mitologia, da história (especialmente dos "venenos da história", ou seja, de perversidades e atrocidades) e do pop.

Para Meese, 'tudo é brinquedo'Foto: Museusm Rolandseck

O artista liquidifica tudo e devolve ao observador da forma como bem entende. Sem qualquer tipo de pudor, mistura pornografia e política, comunismo e nazismo, mitologia romana, egípcia, grega e germânica. Segundo suas próprias palavras publicadas pelo semanário Die Zeit, "tudo é brinquedo. O bom na arte é que ela é como um caixote de areia onde brincam as crianças, ou seja, qualquer um é bem-vindo. Ali não há conceitos como cor da pele ou similares, não há importâncias, não há religiões. O ego é totalmente relativizado", proclama o artista.

Relativizar o ego, no entanto, é algo quase impensável quando o assunto é Jonathan Meese, um artista que só aparece em público de preto – "quanto mais uniforme é a aparência de alguém, mais claramente se pode reconhecer seu rosto", já disse o próprio certa vez – e não abre mão dos inconfundíveis cabelos enormes e da barba longa.

Além de proclamar aos quatro cantos, a fim de confirmar sua eterna adolescência, a onipresença da mãe, que costuma acompanhar suas exposições e intervenções públicas. "Precisamos sempre de alguém que cuide dele, porque o Jonathan embarca em qualquer uma", diz frente às câmeras Brigitte Meese num documentário sobre seu filho, dirigido por Julia Benkert.

Marqueteiro ou gênio?

Para alguns, tudo isso – das paródias de ditadores à imagem pública da eterna criança, que se permite absolutamente tudo – não passa de mera estratégia de marketing. No caso, bem-sucedida, afinal, Meese é um dos artistas alemães de sua geração mais conhecidos, tanto dentro quanto fora do país.

"E por que queremos Jonathan Meese?", pergunta o Die Zeit. "Por que ninguém, além dele, pode se lambuzar e se enlamear tão bem? Por que nenhum outro artista parece tão elegantemente desleixado quanto ele e nenhum outro incorpora tão decididamente o gênio selvagem que só obedece a si mesmo?".

Fantasias de poder: paródias compreendidas pelo observador?Foto: Museusm Rolandseck

De fato, Meese ocupa há mais de dez anos as páginas dos cadernos de cultura e revistas especializadas em arte. Suas obras rodam o mundo, deixando não poucos observadores boquiabertos com sua conduta frente aos monstros da história, sejam estes Nero, Calígula ou Hitler.

Para seus críticos, no entanto, por trás de tamanha publicidade se esconde um vácuo de ideias e conceitos, um verdadeiro engodo, um desespero pela autopromoção e uma postura cínica frente ao observador.

Um comportamento que faz lembrar, diga-se de passagem, outros nomes da arte contemporânea, entre estes Joseph Beuys, que aparece também na exposição do Museu Arp Rolandeck "em diálogo" com a obra de Meese. Numa referência à premissa de Beuys de que o fim de Atlântida teria simbolizado a perda de toda a espiritualidade.

Meese, por sua vez, está pouco ou nada interessado neste tipo de perda. Sua meta é elevar a arte "ao poder de Estado", implementando a "sua" ditadura da arte, pela qual ele inclusive publica manifestos aqui e acolá. Segundo texto publicado por Doris Mampe no catálogo da exposição, Meese "cria essas fantasias de um superpoder para destrui-las ao mesmo tempo". A prova disso estaria no fato de que o humor é a essência do trabalho de artista, mesmo quando este é "politicamente incorreto".

"Eficiência visual"

Em seu mundo de imagens alucinantes e citações desvairadas, o artista não está em busca da verdade, observa Mampe, mas sim "da eficiência visual. Não do conteúdo, mas da forma. Pois, para Meese, o conteúdo na imagem não é o ser, mas sim o parecer".

Prova disso são seus depoimentos em entrevista à pequena Berta para a TV Eiskellerberg, de acesso online, em que Meese, um pouco desconcertado frente a uma criança de 9 anos (e não de 39), sugere: "Brincar, brincar muito. E sempre com máscaras. Muitas, muitas máscaras".

Jonathan Meese, em entrevista à pequena Berta na televisão pela internet EiskellerbergFoto: eiskellerberg.tv

Na atual exposição da obra de Meese, essas máscaras estão inseridas numa Atlantisis fictícia, perdida no Reno (espaço simbólico, por diversas razões, na história alemã).

O poeta Durs Grünbein, que contribui com um texto para o catálogo da exposição, assinala que "o declínio da Atlântida não surgiu por acaso. Por alguma coisa monstruosa essas pessoas tinham sido responsáveis, que sobre elas pesou tão terrivelmente a ira de Poseidon. Pois também a culpa por essa história foi para o deus mar (da mesma forma como no caso das odisséias de Ulisses, da colisão do Titanic e de todas as catástrofes marítimas desde então). Não fosse isso, a humanidade teria sido obrigada, principalmente frente ao caso de Atlântida, a começar a pensar sobre si mesma".

Possivelmente a Atlantisis de Meese serve para o mesmo fim: na avalanche de símbolos e na profusão de referências, sobra pouco tempo para a autoreflexão.

Autora: Soraia Vilela

Revisão: Alexandre Schossler

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