Jornalista é presa na Turquia por criticar Erdogan
23 de janeiro de 2022
Sedef Kabas foi levada a uma prisão de Istambul após criticar governo e publicar um provérbio no Twitter. "Quando um boi entra em um palácio, ele não se torna um rei, o palácio se torna um estábulo", escreveu.
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A famosa jornalista turca de televisão Sedef Kabas foi presa neste sábado (23/01), após supostamente ofender o presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan.
Agentes invadiram a casa da jornalista por volta das 2h da madrugada. Ela foi levada a um tribunal que confirmou formalmente sua detenção por "insultar o presidente", crime punível com prisão de um a quatro anos na Turquia.
O advogado da jornalista, Ugur Poyraz, disse que vai recorrer da decisão e confirmou que ela foi levada a uma prisão de Istambul.
"Esperamos que a Turquia possa retornar em breve ao estado de direito", disse o advogado.
Na sexta-feira, a mulher de 52 anos denunciou a repressão do governo a críticos em um programa de TV no canal Tele 1.
Depois, ela citou um provérbio em sua conta no Twitter, que tem quase 900.000 seguidores.
"Quando um boi entra em um palácio, ele não se torna um rei, o palácio se torna um estábulo", escreveu.
Críticas do governo
Figuras do governo condenaram a fala de Kabas, que ao longo da carreira de três décadas apresentou renomados programas de televisão.
"Um suposto jornalista está insultando descaradamente nosso presidente em um canal de televisão que não tem outro objetivo além de espalhar o ódio", disse o porta-voz-chefe de Erdogan, Fahrettin Altun, no Twitter.
"Eu condeno essa arrogância, essa imoralidade nos termos mais fortes possíveis. Isso não é apenas imoral, é também irresponsável", completou Altun.
O vice-presidente do partido no poder, Numan Kurtulmus, disse que "insultar o presidente eleito de nossa nação com expressões feias e vulgares é de fato um ataque à vontade nacional".
O órgão regulador da mídia turca abriu uma investigação separada sobre a Tele 1 em razão de "declarações inaceitáveis contra nosso presidente".
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Mensagens de apoio
Merdan Yanardag, editor-chefe do canal, criticou duramente a prisão da jornalista. "Sua detenção durante a madrugada, às 2 da manhã, por causa de um provérbio, é inaceitável", escreveu no Twitter. "Esta postura é uma tentativa de intimidar os jornalistas, a mídia e a sociedade", acrescentou.
A líder do partido de oposição, Meral Aksener, usou uma hashtag em apoio a Kabas. "Essa mentalidade vai acabar e a justiça voltará para a Turquia", escreveu no Twitter.
O sindicato de jornalistas turcos TGS disse que a prisão de Kabas foi "um sério ataque à liberdade de imprensa".
Cerco à liberdade de expressão
Grupos de direitos humanos acusam frequentemente a Turquia de minar a liberdade de imprensa, prendendo jornalistas e fechando meios de comunicação críticos ao governo, especialmente após um fracassado golpe em 2016, que tentou tirar Erdogan do poder.
A ONG Repórteres Sem Fronteiras classificou a Turquia em 153º lugar entre 180 países em seu ranking de liberdade de imprensa de 2021.
Sob a lei de insultos turca, dezenas de milhares foram processados por atacar Erdogan desde que ele se tornou presidente em 2014, depois de mais de uma década como primeiro-ministro.
Em outubro, o principal tribunal de direitos humanos da Europa pediu à Turquia que mudasse a legislação depois de decidir que a detenção de um homem sob a lei violava sua liberdade de expressão.
Desde 2014, ano em que Erdogan se tornou presidente, 160.169 investigações foram iniciadas por insultos ao presidente, 35.507 casos foram arquivados e houve 12.881 condenações.
le (ap, reuters, afp, ots)
Por que as relações turco-alemãs são tão tensas?
Desde o golpe militar fracassado contra o presidente Erdogan, em julho de 2016, relações entre Ancara e Berlim têm se deteriorado constantemente. Mas o processo já começara antes, e não há fim à vista.
Foto: picture-alliance/POP-EYE/B. Kriemann
Caso Böhmermann
31 de março de 2016: O presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, apresenta queixa contra o humorista alemão Jan Böhmermann por seu "poema difamatório" a respeito dele, envolvendo bestialidade, entre outras acusações. Em 4 de outubro, os promotores encerraram o caso, mas um conflito diplomático entre Ancara e Berlim estava desencadeado.
2 de junho de 2016: Parlamento alemão aprova quase unanimemente resolução classificando como genocídio o massacre de centenas de milhares de armênios pelo Império Otomano, em 1915. Ancara retira seu embaixador de Berlim, a comunidade turca promove protestos em várias cidades alemãs. Segundo a Turquia, o número de mortes seria exagerado, e também havia muçulmanos turcos entre as vítimas.
Foto: Getty Images/AFP/S. Gallup
Tensões após golpe fracassado
15 de julho de 2016: Uma facção das Forças Armadas turcas tenta derrubar o presidente turco, mas fracassa. Ancara acusa Berlim de não se posicionar contra a tentativa de putsch nem fazer algo contra a organização do pregador exilado Fethullah Gülen, acusado por Erdogan de orquestrar o golpe militar.
Foto: picture-alliance/dpa/S. Suna
Alemanha critica purgação pós-golpe
Logo em seguida à tentativa de golpe, as autoridades turcas fizeram uma devassa no Exército e no Judiciário, detendo milhares de pessoas. Logo em seguida, a purgação foi expandida, incluindo funcionários públicos civis, diretores e professores universitários. Políticos alemães criticaram as detenções. Diplomatas, acadêmicos e militares turcos fugiram do país e pediram asilo na Alemanha.
Foto: picture-alliance/dpa/S. Suna
Manifestações curdas em Colônia
A devassa de Erdogan pós-golpe foi também condenada por ativistas curdos em manifestações na cidade de Colônia, no oeste alemão. Em muitas delas se exigia a libertação de Abdullah Öcalan, líder encarcerado do Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK). Ancara Turquia acusa Berlim de não fazer esforços suficientes para sustar as atividades do grupo. que classifica de terrorista.
Foto: picture-alliance/AP Photo/M. Meissner
Prisões de cidadãos alemães na Turquia
14 de fevereiro de 2017: Deniz Yücel, correspondente do jornal "Die Welt", é colocado sob custódia policial na Turquia. Outros cidadãos alemães, como a jornalista Mesale Tolu e o ativista de direitos humanos Peter Steudtner, são detidos pelo que Berlim define como "razões políticas". Todos os três foram acusados pelas autoridades turcas de apoiar organizações terroristas.
Março de 2017: Municipalidades alemãs proíbem ministros turcos de realizarem comícios a favor do referendo de abril na Turquia, para ampliar os poderes presidenciais de Erdogan. Este acusa a Alemanha de empregar "táticas nazistas" contra cidadãos turcos em seu território e deputados turcos em visita. Dirigentes alemães condenam severamente o líder turco, acusando-o de ter ido longe demais.
Foto: picture-alliance/dpa/O. Berg
Espionagem
30 de março de 2017: A Alemanha acusa a Turquia de espionar centenas de adeptos de Gülen, assim como mais de 200 associações e escolas ligadas ao movimento do pregador na Alemanha. Paralelamente, requerentes de asilo turcos acusam o departamento de imigração BAMF de repassar as informações deles para veículos de imprensa ligados ao governo turco.
Foto: Imago/Chromeorange/M. Schroeder
Erdogan insta turco-alemães a não votarem em "inimigos"
18 de agosto de 2017: O presidente chama três dos principais partidos políticos da Alemanha de inimigos da Turquia e insta os alemães de origem turca a não votarem neles na eleição geral de setembro. Seus alvos são a União Democrata Cristã (CDU), da chanceler federal Angela Merkel, o Partido Social-Democrata (SPD) e o Partido Verde. A chefe de governo acusa Erdogan de se imiscuir na eleição.
Foto: picture-alliance/abaca/AA/M. Ali Ozcan
Merkel contra Turquia na UE
4 de setembro de 2017: A chanceler federal alemã, Angela Merkel, afirma, durante debate eleitoral, ser contra a Turquia se tornar membro da União Europeia e promete conversar com outros líderes da UE sobre o fim das negociações com Ancara nesse sentido. Em outubro, ela apoia a iniciativa de cortar os fundos pré-filiação da Turquia.
Foto: Reuters/F. Bensch
Ofensiva militar turca em Afrin
20 de janeiro de 2018: Forças Armadas turcas e seus aliados rebeldes sírios lançam a Operação Ramo de Oliveira contra o enclave curdo de Afrin, no norte da Síria. A ofensiva é criticada por políticos alemães e desencadeia protestos de comunidades curdas na Alemanha.
Foto: Getty Images/AFP/O. Kose
Deniz Yücel é libertado da prisão
16 de fevereiro de 2018: A Turquia liberta o jornalista turco-alemão Deniz Yücel, depois de mantê-lo preso por mais de um ano sem acusações formais. Segunda a mídia estatal turca, o turco-alemão foi libertado da detenção pré-julgamento sob fiança. A promotoria exige para ele pena de 18 anos de prisão, por "propaganda terrorista" e incitação popular.