Juiz do Paraná suspende processo disciplinar contra Deltan
27 de agosto de 2019
Magistrado que atuou na Lava Jato atende pedido de procurador e ordena que processo administrativo seja retirado da pauta do Conselho do Ministério Público. Ação seria analisada na terça-feira.
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Um juiz federal do Paraná que já atuou na Lava Jato determinou a suspensão de um processo administrativo no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) que apurava a conduta do coordenador da força-tarefa da operação, Deltan Dallagnol. A análise do caso estava marcada para terça-feira (27/08).
O processo administrativo disciplinar (PAD) contra Deltan envolvia suspeita de "manifestação pública indevida". O caso foi aberto em 2018, após o procurador conceder uma entrevista em que acusou os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) de "leniência com a corrupção". O encaminhamento foi feito pelo próprio presidente do tribunal, Dias Toffoli.
Deltan já havia apresentado um pedido ao conselho para que o assunto fosse retirado da pauta, mas a demanda foi recusada na semana passada. Ele então ingressou no sábado com um pedido de liminar na Justiça Federal do Paraná. A liminar acabou sendo concedida no domingo pelo juiz plantonista Nivaldo Brunoni.
Brunoni já atuou na Lava Jato quando convocado para atuar no Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região, em Porto Alegre. Em abril de 2018, partiu dele a autorização para que o então juiz Sergio Moro pudesse decretar a prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
De acordo a íntegra da decisão, que foi divulgada pelo jornal O Estado de S.Paulo, Deltan pediu um prazo extra de dez dias para apresentar suas alegações finais no processo administrativo. Deltan alegou que sua defesa renunciou durante essa etapa do processo e que os novos advogados ainda não haviam sido formalmente intimados para apresentar as alegações finais.
"Há claro prejuízo à ampla defesa e ao contraditório do processado, que deixou de apresentar alegações finais porque o advogado originalmente constituído renunciou/substabeleceu, no interregno do prazo que escoava, os poderes que lhe foram atribuídos, dificultando a ação de seus sucessores", escreveu o juiz, ao aceitar os argumentos de Deltan para a obtenção de um prazo maior.
Segundo o jornal O Globo, havia expectativa entre os conselheiros do CNMP que Deltan fosse punido, mas com uma simples censura ou advertência, e não uma suspensão ou afastamento do cargo. Ainda assim, o procurador corre o risco de ser punido pela primeira vez pelo CNMP.
O caso não tem relação com o escândalo de vazamento de mensagens revelado pelo site The Intercept Brasil, que levantou questionamentos sobre a conduta do procurador e do ex-juiz Sergio Moro na condução dos processos da Lava Jato. O vazamento também enfraqueceu a reputação da operação e a posição de Moro como ministro da Justiça do governo Bolsonaro.
A Polícia Federal apura, desde 2014, um esquema bilionário de lavagem e desvio de dinheiro envolvendo a Petrobras, grandes empreiteiras e políticos. Entenda a maior investigação sobre corrupção já conduzida no país.
Foto: AFP/Getty Images
O início
A Operação Lava Jato foi deflagrada pela Polícia Federal em 17 de março de 2014. Começou investigando um esquema de desvio de recursos públicos e lavagem de dinheiro e descobriu a existência de uma imensa rede de corrupção envolvendo a Petrobras, grandes empreiteiras do país e políticos. O nome vem de um posto de gasolina em Brasília, um dos alvos da PF no primeiro dia de operação.
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O esquema
Executivos da Petrobras cobravam propina de empreiteiras para, em troca, facilitar as negociações dessas empresas com a estatal. Os contratos eram superfaturados, o que permitia o desvio de verbas dos cofres públicos a lobistas e doleiros, os chamados operadores do esquema. Eles, por sua vez, eram encarregados de lavar o dinheiro e repassá-lo a uma série de políticos e funcionários públicos.
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As figuras-chave
O esquema na Petrobras se concentrava em três diretorias: de abastecimento, então comandada por Paulo Roberto Costa; de serviços, sob direção de Renato Duque; e internacional, cujo diretor era Nestor Cerveró. Cada área tinha seus operadores para distribuir o dinheiro. Um deles era o doleiro Alberto Youssef (foto), que se tornou uma das figuras centrais da trama. Todos os citados foram condenados.
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As empreiteiras
As grandes construtoras do país formaram uma espécie de cartel: decidiam entre si quem participaria de determinadas licitações da Petrobras e combinavam os preços das obras. Os executivos da estatal, por sua vez, garantiam que apenas o cartel fosse convidado para as licitações. Entre as empresas investigadas estão Odebrecht, Andrade Gutierrez e Camargo Corrêa. Vários executivos foram condenados.
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Os políticos
O núcleo político era formado por parlamentares de diferentes partidos, responsáveis pela indicação dos diretores da Petrobras que sustentavam a rede de corrupção dentro da estatal. Os políticos envolvidos recebiam propina em porcentagens que variavam de 1% a 5% do valor dos contratos, segundo os investigadores. O dinheiro foi usado, por exemplo, para financiar campanhas eleitorais.
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De Cunha a Dirceu...
A investigação só entrou no mundo político em 2015, quando a Lava Jato foi autorizada a apurar mais de 50 nomes, entre deputados, senadores e governadores de vários partidos. Desde então, viraram alvo de investigação políticos como os ex-parlamentares Eduardo Cunha (foto) e Delcídio do Amaral, ambos cassados, os senadores Renan Calheiros, Fernando Collor e o ex-ministro José Dirceu.
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... e Lula
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva é réu em dez processos relacionados à Lava Jato, sendo acusado pelos crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e obstrução da Justiça. As denúncias indicam que Lula teria recebido benefícios das empreiteiras OAS e Odebrecht, envolvendo imóveis no Guarujá e São Bernardo do Campo. Em 2018, ele foi preso e teve uma nova candidatura à Presidência barrada.
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As prisões
A Lava Jato quebrou tabus no Brasil ao encarcerar altos executivos de empresas e importantes figuras políticas. Entre investigados e aqueles já condenados pela Justiça, estão o executivo Marcelo Odebrecht, ex-presidente da Odebrecht; Eduardo Cunha, ex-presidente da Câmara; Sérgio Cabral, ex-governador do Rio; os ex-ministros José Dirceu (foto) e Antonio Palocci, entre outros.
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As delações
Os acordos de delação premiada são considerados a força-motriz da operação. Depoimentos como o de Marcelo Odebrecht (foto) chegam com potencial para impactar fortemente a investigação. O acordo funciona assim: de um lado, os delatores se comprometem a fornecer provas e contar o que sabem sobre os crimes, além de devolver os bens adquiridos ilegalmente; de outro, a Justiça reduz suas penas.
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O juiz
Responsável pela Lava Jato na 1° instância, o ex-juiz federal Sergio Moro logo ganhou notoriedade. Em manifestações, foi ovacionado pelo povo e chegou a ser chamado de "herói nacional". Mas também foi acusado de agir com parcialidade política. Em 2018, deixou o cargo e aceitou ser ministro do presidente Jair Bolsonaro, cuja candidatura foi beneficiada pela prisão de Lula no ano anterior.
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Expansão internacional
Se começou num posto de gasolina em Brasília, a Lava Jato ganhou proporções internacionais com o aprofundamento das investigações. Segundo dados do Ministério Público Federal levantados a pedido da DW Brasil, a investigação já conta com a cooperação de pelo menos outros 40 países (veja no gráfico acima). Além disso, 14 países, fora o Brasil, investigam práticas ilegais promovidas pela Odebrecht.
Um terremoto político
Ao longo de cinco anos, a Lava Jato influenciou o impeachment de Dilma Rousseff, enfraqueceu o governo Michel Temer e contribuiu para a derrocada de velhos caciques do PT, MDB e PSDB. Em 2018, Lula, então favorito para vencer as eleições presidenciais, foi preso e teve a candidatura barrada. As investigações também fortaleceram um discurso antissistema que beneficiou a campanha de Bolsonaro.
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Críticas e revelações
A Lava Jato também acumulou acusações de parcialidade e de abusos em seus métodos. Em 2019, os procuradores da força-tarefa foram duramente criticados por tentarem criar uma fundação para gerenciar uma multa bilionária da Petrobras. No mesmo ano, conversas reveladas pelo site "The Intercept" apontaram suspeita de conluio entre Moro e os procuradores na condução dos processos, o que é proibido.