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Justiça do Rio autoriza apreensão de obras com temática LGBT

8 de setembro de 2019

Em nova decisão, tribunal atende a recurso da prefeitura e permite recolhimento de literatura infantojuvenil que ilustre homossexualidade e não esteja lacrada e avise sobre conteúdo. Bienal diz que vai recorrer ao STF.

Bienal do Livro do Rio
Bienal do Livro do Rio é um dos maiores eventos literários do BrasilFoto: AFP/Bienal Do Livo Do Rio/M. Mercante

O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro suspendeu neste sábado (07/09) uma decisão proferida na véspera pelo mesmo órgão que impedia a prefeitura carioca de apreender livros na Bienal.

O presidente da corte, Claudio de Mello Tavares, acatou um pedido feito pela prefeitura do Rio para permitir o recolhimento de obras que ilustrem o tema da homossexualidade "de maneira desavisada" para crianças e jovens.

Com a decisão, os expositores da Bienal do Livro só podem comercializar essas obras em embalagens lacradas e que contenham "advertência sobre seu conteúdo". Se a determinação não for cumprida, títulos que não seguirem essas regras poderão ser apreendidos, e a licença para a feira, cassada.

A Bienal do Livro informou que vai recorrer da decisão no Supremo Tribunal Federal (STF), "a fim de garantir o pleno funcionamento do evento e o direito dos expositores de comercializar obras literárias sobre as mais diversas temáticas – como prevê a legislação brasileira".

A polêmica começou na quinta-feira, quando o prefeito Marcelo Crivella anunciou que pretendia censurar a HQ Vingadores - A cruzada das crianças, que estava sendo vendida em estandes no local. Em vídeo, ele afirmou que havia determinado o recolhimento da obra porque ela trazia "conteúdo sexual para menores".

No entanto, o conteúdo denunciado por Crivella – que é bispo da neopentecostal Igreja Universal do Reino de Deus – não passava de uma ilustração isolada com dois homens se beijando, completamente vestidos, em meio a dezenas de páginas da história.

Os organizadores do evento responderam que não pretendiam recolher ou embalar os exemplares, argumentando que o conteúdo não é impróprio nem pornográfico. Segundo eles, os exemplares já estavam lacrados com plástico transparente, como é padrão para esse tipo de HQ, e, portanto, não estavam abertos para que qualquer membro do público pudesse folhear as páginas.

Na sexta-feira, fiscais da prefeitura foram enviados à Bienal. O subsecretário de operações da Secretaria de Ordem Pública do Rio, coronel Wolney Dias, disse que pretendia "apreender material" que não seguisse as "recomendações de estar lacrado e com a orientação quanto ao conteúdo".

No entanto, segundo a organização, já não havia mais exemplares da HQ que pudessem correr o risco de apreensão, já que todo o material foi vendido nos primeiros minutos após a abertura da Bienal na sexta-feira, diante da repercussão da censura promovida pelo prefeito.

Os fiscais visitaram alguns estandes, folhearam alguns títulos, mas deixaram o local cerca de duas horas depois, sem apreender qualquer material. Questionado se havia encontrado algo, Dias respondeu: "Muitos livros."

Ainda na sexta-feira, a organização da Bienal pediu um mandado de segurança preventivo à Justiça do Rio para garantir o funcionamento do evento e o direito dos vendedores de comercializar obras sem correr o risco de recolhimento.

A decisão saiu na mesma tarde, e o desembargador Heleno Ribeiro Pereira Nunes, da 5ª Câmara Cível, concedeu uma liminar impedindo a prefeitura carioca de apreender livros na Bienal ou cassar o alvará da feira.

A determinação deste sábado do presidente do Tribunal de Justiça suspende o mandado de segurança emitido por Nunes. O texto da nova decisão nega que se trate de um "ato de censura".

Segundo o desembargador Mello Tavares, não é adequado que uma HQ de super-heróis voltada para crianças e adolescentes apresente temática homossexual sem que os pais sejam alertados.

O pedido feito à Justiça pela prefeitura do Rio argumentava que obras que ilustram temas LGBT atentam contra o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). O estatuto, contudo, não menciona homossexualidade em sua legislação.

"Revistas e publicações destinadas ao público infantojuvenil não poderão conter ilustrações, fotografias, legendas, crônicas ou anúncios de bebidas alcoólicas, tabaco, armas e munições, e deverão respeitar os valores éticos e sociais da pessoa e da família", escreve o ECA.

Com a decisão do Tribunal de Justiça do Rio, fiscais da Secretaria de Ordem Pública da prefeitura carioca chegaram à Bienal no fim da tarde deste sábado.

Nas redes sociais, várias pessoas denunciaram o caso como censura e acusaram o prefeito Crivella de homofobia. Uma série de editoras do país, entre elas a Companhia das Letras e o Grupo Editorial Record, bem como escritores e a OAB-RJ também repudiaram a atitude da prefeitura.

EK/abr/ots

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