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Justiça

8 de abril de 2009

O ex-presidente peruano Alberto Fujimori foi condenado a 25 anos de prisão pela Suprema Corte de Lima. No entanto, nem tudo está esclarecido, explicou o especialista em direitos humanos Esteban Cuya à Deutsche Welle.

Condenação de Fujimori pode abrir precedente, diz CuyaFoto: AP

Esteban Cuya é coordenador da Coalizão contra a Impunidade, uma associação de ONGs que luta desde 1998 para esclarecer os casos de cidadãos alemães desaparecidos ou vitimados pela ditadura militar na Argentina. Cuya é especialista em direitos humanos e bom conhecedor da situação no Peru.

A Deutsche Welle conversou com Esteban Cuya sobre o envolvimento do ex-presidente peruano Alberto Fujimori no massacre de 25 pessoas em seu país e sua condenação a 25 anos de prisão pela Justiça peruana.

Deutsche Welle: Foi justa a pena de 25 anos de reclusão para Fujimori?

Esteban Cuya: É muito difícil dizer se a pena foi justa. Alberto Fujimori foi condenado por ordenar homicídios, mas a vida de uma pessoa não se pode compensar com 25 ou 50 anos de prisão. É uma pena padronizada pelas leis peruanas. A punição é merecida e é a menor com que ele poderia ter sido condenado, mas a vida humana não tem preço.

Um capítulo da história do Peru se encerra com essa sentença?

Não creio. Os delitos contra os direitos humanos cometidos no Peru antes de Fujimori e durante seu mandato são tão graves que, como nos mostra a experiência de outros países, serão necessárias várias gerações para que restabelecer a paz social.

Na Espanha, já se passaram mais de 70 anos e os netos dos mortos durante a Guerra Civil ou dos assassinados pela tirania do franquismo continuam a procurar respostas, a fim de compreender o que aconteceu com seus avós. Na Argentina, no Chile... passaram-se 30 aos e ainda existem disputas jurídicas, disputas de verdade.

No caso do Peru, o processo foi bem rápido. Eu não diria que uma etapa está sendo encerrada, mas que uma nova está se iniciando, uma nova etapa que facilita às vítimas e a seus familiares o acesso à Justiça.

Outras sentenças sucederão essa?

Espero que sim e creio que sim, porque os delitos de Fujimori não se restringiram aos casos exemplares pelos quais ele foi condenado. Também há acusações de homicídio múltiplo que devem ser investigadas.

O Peru tem que encontrar um caminho, juntamente com o Chile, o país que autorizou a extradição de Fujimori com base em determinados crimes denunciados no Peru. Mas eles não abarcavam todas as acusações que pesam contra Fujimori.

Tenho a esperança de que a Justiça peruana continue cumprindo a lei e honrando o compromisso de combater as violações dos direitos humanos que o Peru assumiu perante as Nações Unidas e a comunidade internacional.

Que consequências poderia ter a prisão de Fujimori para Alan García?

Para Alan García, esta é uma advertência muito severa. Já existem instâncias internacionais, com a Corte Interamericana de Direitos Humanos, que reclamam uma investigação independente de delitos cometidos durante o primeiro governo de Alan García, como o assassinato de aproximadamente 300 pessoas em presídios peruanos, como em Frontón, Callao e outros.

Existem evidências de uma possível responsabilidade de Alan García nesses casos, mas isso tem que ser decidido pelos juízes e é importante que o presidente demonstre que respeita a independência do Poder Judiciário, ao qual o Peru vem atribuindo tanta relevância desde a transição para a democracia. Se Alan García não é culpado, então ele não tem nada a temer.

O Peru não é o único país com passado obscuro que conseguiu estabelecer uma democracia, mas parece que está conseguindo levar o processo de revisão do ocorrido melhor do que os outros. Qual é o segredo?

Foto: AP

O Peru aprendeu muito com a experiência das comissões da verdade, das comissões investigadoras criadas em outros lugares anteriormente – primeiro no Chile, depois na Argentina e mais tarde em São Salvador, Guatemala, Haiti e outros países. O Peru conseguiu aprender e evitou erros cometidos em outras etapas de transição para democracia. Erros como não identificar os culpados de crimes contra os direitos humanos porque isso colocaria em perigo o processo de restabelecimento da democracia.

Outro fator, que na minha opinião é muito importante, é que nenhum dos governos de transição tinha um compromisso político regulamentado de perdoar ou deixar na impunidade. A transição para democracia foi possibilitada pela luta do povo peruano e não por acordos políticos.

Além disso, quando houve um vazio de poder (Fujimori deixou o cargo em 2000, pressionado pelas acusações que pesavam contra ele), os governos tanto de Paniagua quanto de Toledo aproveitaram prontamente os casos de corrupção para mandar para cadeia muitos militares de alto escalão, de tal forma que o Exército ficou sem possibilidade de se perpetuar, de reproduzir sua forma de manipular os poderes civis.

Na América Latina, há mais de um ex-ditador e ex-presidente que poderá ir para o banco dos réus. Essa condenação abre um precedente?

Naturalmente, toda decisão no âmbito do direito penal, em nível nacional ou internacional, abre um precedente jurídico que pode ser retomado em outras instâncias. Na Alemanha, o Tribunal de Nurembergue está pedindo a extradição do ex-presidente argentino, general Jorge Videla, pelos assassinatos dos cidadãos alemães Elisabeth Käsemann e Klaus Zieschank durante a ditadura militar.

O procedimento da Suprema Corte do Peru que julgou Fujimori deveria instigar a Justiça argentina a cumprir seu compromisso internacional de punir os crimes contra a humanidade. E o mesmo vale para a Guatemala.

Autora: Luna Bolívar Manaut

Revisão: Simone Lopes

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