"Lava Jato não reduzirá a corrupção significativamente"
Érika Kokay17 de março de 2016
Para Claudio Abramo, vice-presidente da ONG Transparência Brasil, ainda é muito cedo para classificar operação como um marco na história do Judiciário brasileiro. Punição não basta para evitar crimes, diz em entrevista.
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A Lava Jato, que completa dois anos nesta quinta-feira (17/03), escancarou um enorme esquema de corrupção dentro da Petrobras. Apesar do já grande número de condenações e prisões, há quem duvide que a operação da Polícia Federal (PF) seja capaz de reduzir a corrupção.
Claudio Weber Abramo, vice-presidente da ONG Transparência Brasil, acredita que a "punição não coíbe a prática de crimes". É preciso, por outro lado, acabar com as causas da corrupção no Brasil, que, no caso da Petrobras, seria o loteamento político da petroleira.
Em entrevista à DW Brasil, o especialista rechaça o Judiciário brasileiro, opina sobre a fase da Lava Jato que atingiu Lula – "um sinal de que eles não têm nada contra ele" – e chama de protofascistas os manifestantes que alçam a herói o juiz Sérgio Moro, responsável pela operação.
DW: Podemos dizer, a essa altura, que a Operação Lava Jato é um marco na história do Judiciário brasileiro?
Claudio Abramo: Não, isso só se saberá no futuro, a partir do que decorrer efetivamente dessa operação, e principalmente a partir daquilo que for consequência concreta no combate a corrupção, lá na frente – não uma consequência da operação diretamente, mas indiretamente. Ainda é impossível dizer isso. A gente está muito próximo dos acontecimentos para ter uma posição.
Mas, nesses dois anos de Lava Jato, qual é a importância dela para o país até o momento?
O principal efeito da operação foi o de colocar empresários presos, alguns inclusive já condenados. Isso foi resultado direto da chamada Lei Anticorrupção – erradamente nomeada, por sinal –, que permitiu induzir empresários a fazer confissões e contar quem mais participou de tramoias, por exemplo. Essa é a principal diferença em relação a casos passados de investigações, que não se regiam pela lógica da lei recente.
Como o senhor vê os acordos de delação premiada?
A delação premiada é um instrumento muito importante para o desvendamento de casos. Mas existe certa obscuridade, e eu me incluo nisso, no que diz respeito ao alcance dessas delações premiadas. Ou seja, qual pode ser a consequência de se levar à leniência excessiva, por exemplo.
Para mim, é estranho, porque esses quadrilheiros todos – eles são chefes de quadrilha, né? – faziam sacanagens entre si. Como é que vários deles assinam acordos de leniência? É um só que poderia fazer isso. Não todos. Então, para mim, não é claro se esse troço está sendo gerido direito. A minha tendência é achar que não.
Há chance de algumas investigações serem barradas, com uma anulação nos tribunais superiores, por exemplo?
Isso seria muito difícil de acontecer, porque o que acontece é o seguinte: essa decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de considerar que as pessoas já cumpram pena uma vez que tenham perdido o recurso na segunda instância deve eliminar uma vasta maioria dos recursos que chegam aos tribunais superiores. Porque esse negócio de recurso no Brasil é um macete para atrasar as coisas. É para isso que serve. Não existe uma espécie de razão lógica ou jurídica para que aquela decisão que foi tomada 45 anos atrás seja revisada.
Como o STF decidiu que esses caras cumpram pena, a maior parte deles vai considerar que gastar dinheiro com advogados nessa situação não é um bom negócio. É simplesmente jogar dinheiro pela janela, pois eles já estão cumprindo pena. Essa decisão do STF, aliás, é muito importante e teve pouquíssima repercussão. Faz uma diferença danada, porque reduz muito essa indústria de recursos.
Os advogados da Lava Jato precisam, então, trabalhar de forma diferente?
Aqueles advogados que a gente viu no Mensalão – que são os mesmos de sempre, advogam no STF e no STJ – são profissionais especializados em tramoias processuais. São especializados em atravancar processos sob pretextos completamente descabidos, mas com alguma espécie de tintura de justificativa formal. Os advogados que lidam com a situação atual são de outro tipo: são advogados que lidam com as evidências concretas dos casos, com o mérito dos casos. Isso faz uma diferença brutal.
Quando o sujeito perde o recurso na segunda instância, que é no Tribunal de Justiça do Estado, e já é possível que ele cumpra pena, as coisas devem andar muito mais depressa. Não vai haver tanto recurso, pois é dinheiro jogado fora. Aqui no Brasil, o recurso sempre foi usado por quem tem dinheiro para pagar advogado, e assim protelar decisões com grande sucesso. Quem não tem dinheiro, não tem esse privilégio.
O senhor acredita que, com a Lava Jato, a sociedade brasileira passou a ver a Justiça com outros olhos?
É claro que não. A Justiça brasileira deve ser a pior do universo. Não se pode deduzir que a instituição do Judiciário brasileiro vai mudar por causa de um caso. Ela é horrorosa, péssima, não funciona direito. Os juízes estão cheios de privilégio descabido, gastam uma dinheirama preta, e os resultados são pífios. O Judiciário brasileiro precisa de uma reforma profunda.
Os envolvidos na Operação Lava Jato
A operação que investiga um megaesquema de corrupção na Petrobras já acusou mais de 200 pessoas, sendo que metade delas foi condenada. Relembre as principais ações penais da Lava Jato e seus envolvidos.
Foto: picture-alliance/AP Photo/N. Antoine
Youssef absolvido
Denúncia: Evasão de 124 mil dólares não declarados, lavagem de dinheiro proveniente do tráfico de drogas e tráfico de 700 kg de cocaína.<br/> Resultado: Dois condenados (René Luiz Pereira e Carlos Habib Chater, dono do posto que deu nome à operação), um absolvido em 1ª instância (o doleiro Alberto Youssef, na foto) e um absolvido em 2ª instância (André Catão).<br/> Data: 21 de outubro de 2014.
Foto: cc-by/Valter Campanato/ABr
Primeira condenação de Youssef e Costa
Denúncia: Lavagem de dinheiro e formação de grupo criminoso organizado. Houve desvio de dinheiro público na construção da refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, por meio de contratos superfaturados.</br> Resultado: Oito condenados (entre eles, Alberto Youssef e o ex-diretor de Abastecimento da Petrobras, Paulo Roberto Costa, na foto) e dois absolvidos.</br> Data: 22 de abril de 2015.
Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agencia Brasil
Youssef e o dinheiro do mensalão
Denúncia: Lavagem de dinheiro. Os recursos, que ultrapassam 1 milhão de reais, pertenciam ao ex-deputado federal José Janene, morto em 2010, e eram provenientes do esquema do mensalão.</br> Resultado: Quatro condenados: Alberto Youssef, Carlos Habib Chater, Ediel Viana da Silva (funcionário do Posto da Torre) e Carlos Alberto Pereira da Costa (laranja de Youssef).</br> Data: 6 de maio de 2015.
Foto: Reuters
Cerveró é condenado
Denúncia: Lavagem de dinheiro. Nestor Cerveró (foto), ex-diretor da área Internacional da Petrobras, comprou um apartamento de luxo no Rio de Janeiro – hoje avaliado em 7,5 milhões de reais – com dinheiro de propina da Petrobras.</br> Resultado: Um condenado.</br> Data: 26 de maio de 2015.
Foto: José Cruz/ABr
A primeira sentença a empreiteiros
Denúncia: Corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa, envolvendo contratos da construtora Camargo Corrêa com as refinarias Abreu e Lima e Getúlio Vargas. As propinas pagas pela empresa ultrapassam os 50 milhões de reais.</br> Resultado: Seis condenados (entre eles, Youssef, Costa e três ex-dirigentes da Camargo Corrêa) e três absolvidos.</br> Data: 20 de julho de 2015.
Foto: AFP/Getty Images/Y. Chiba
Próximo alvo: executivos da OAS
Denúncia: Corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa, envolvendo contratos da empreiteira OAS com as refinarias Abreu e Lima e Getúlio Vargas. As propinas pagas somam quase 30 milhões de reais.</br> Resultado: Sete condenados (Youssef, Costa, na foto, e mais cinco executivos ligados à OAS, entre eles, o presidente, José Aldemário Pinheiro Filho).</br> Data: 5 de agosto de 2015.
Foto: picture-alliance/AP/E. Peres
Novo operador: Fernando Baiano
Denúncia: Corrupção e lavagem de dinheiro, envolvendo pagamento e recebimento de propina em contratos com a Petrobras. As vantagens indevidas superam 50 milhões de reais.</br> Resultado: Três condenados (Nestor Cerveró, em sua segunda condenação, o lobista Fernando Baiano e um ex-consultor da Toyo Setal, Júlio Camargo) e um absolvido (Youssef).</br> Data: 17 de agosto de 2015.
Foto: Reuters/S. Moraes
Um petista e mais dois ex-Petrobras
Denúncia: Corrupção, lavagem de dinheiro e associação criminosa. As propinas negociadas chegaram a 40 milhões de reais.</br> Resultado: Dez condenados (entre eles, o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto, na foto, o ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque, o ex-gerente da estatal Pedro Barusco e Alberto Youssef) e um absolvido (Paulo Roberto Costa).</br> Data: 21 de setembro de 2015.
Foto: picture-alliance/dpa/C. Villalba Racines
Primeiro político condenado
Denúncia: Corrupção e lavagem de dinheiro, envolvendo propinas de pelo menos 1 milhão de reais, por meio de contratos de publicidade firmados com a Caixa e o Ministério da Saúde.</br> Resultado: Três condenados: o ex-deputado federal André Vargas (foto), o irmão dele, Leon Vargas, e o publicitário Ricardo Hoffmann.</br> Data: 22 de setembro de 2015.
Foto: José Cruz/ABr
O segundo político
Denúncia: Corrupção e lavagem de dinheiro, envolvendo propinas de pelo menos 11 milhões de reais.</br> Resultado: Três condenados (entre eles, o ex-deputado federal Pedro Corrêa, que chegou a receber propina enquanto era julgado na Ação Penal 470, o mensalão, processo em que também foi condenado) e dois absolvidos.</br> Data: 29 de outubro de 2015.
Foto: picture-alliance/dpa/M. Brandt
Mais empreiteiras na mira
Denúncia: Lobistas, doleiros, ex-diretores da Petrobras e executivos ligados à construtora Andrade Gutierrez (entre eles, o presidente da empresa, Otávio Marques de Azevedo, na foto) foram denunciados por formação de quadrilha, corrupção, organização criminosa e lavagem de capitais, após envolvimento no esquema da Petrobras.</br> Resultado: Denúncia aceita pela Justiça; réus aguardam sentença.
Foto: Reuters/F. de Holanda TPX Images of the day
Agora, a Odebrecht
Denúncia: Preso desde junho de 2015, Marcelo Odebrecht – então presidente da empreiteira Odebrecht – é acusado de envolvimento com o esquema de corrupção. A empresa pagava propina, que era repassada a funcionários da Petrobras.</br> Resultado: Foi condenado a 19 anos de prisão por crimes como corrupção e organização criminosa.</br> Data: 8 de março de 2016.
Foto: Reuters/E. Castro-Mendivil/Files
Mais uma vez condenado
Denúncia: O ex-ministro José Dirceu passou a ser réu da Lava Jato enquanto cumpria pena pelo mensalão. Ele e outras 14 pessoas foram denunciadas por vários atos de corrupção dentro da Petrobras.</br> Resultado: Dirceu foi condenado a 23 anos de prisão por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa. Outras dez pessoas também foram condenadas.</br> Data: 18 de maio de 2016.
Foto: picture-alliance/dpa/H. Alves
Outra denúncia contra Odebrecht
Denúncia: Marcelo Odebrecht é reu outra vez, junto a outros executivos do grupo, em processo que investiga irregularidades em oito contratos firmados pela empresa com a Petrobras. Segundo o MPF, as propinas chegaram a 137 milhões de reais.</br> Resultado: Denúncia aceita pela Justiça; réus aguardam sentença.
Foto: picture alliance/ZUMAPRESS.com
Collor acusado de corrupção
Denúncia: O senador Fernando Collor de Mello (PTB-AL) é acusado de cometer crimes de corrupção e lavagem de dinheiro, tendo recebido pelo menos 3 milhões de reais em propinas de contratos da Petrobras. Em julho, a Polícia Federal fez buscas em suas propriedades e confiscou três carros de luxo.</br> Resultado: Denúncia apresentada ao Supremo Tribunal Federal (STF), aguarda decisão.
Foto: ROBERTO SCHMIDT/AFP/Getty Images
Repasses ao PT
Denúncia: O pecuarista José Carlos Bumlai é acusado de corrupção, gestão fraudulenta e lavagem de dinheiro, por fraudes na compra de um navio-sonda pela Petrobras. Em depoimento, confessou ter feito um empréstimo de 12 milhões de reais no Banco Schahin para repassar ao PT. Entre os outros dez réus, estão Cerveró, Vaccari e executivos do Grupo Schahin.</br>Resultado: Denúncia aceita pela Justiça.
Foto: Valter Campanato/Agência Brasil
A denúncia contra Cunha
Denúncia: O ex-presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, é acusado de receber milhões de reais em propina no esquema de corrupção na Petrobas, que teriam sido depositados em contas em seu nome na Suíça. Ele responde pelos crimes de corrupção, evasão de divisas e lavagem de dinheiro.</br> Resultado: Denúncia aceita pela Justiça; réu aguarda julgamento.
Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil
Mulher de Cunha também é ré
Denúncia: A jornalista Cláudia Cordeiro Cruz, mulher de Eduardo Cunha, é acusada de esconder, em conta secreta no exterior, valores provenientes do esquema criminoso instalado na diretoria internacional da Petrobras. Ela responde pelos crimes de lavagem de dinheiro e evasão de divisas.<br> Resultado: Denúncia aceita pela Justiça; ré aguarda julgamento.
Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado
Lula e Delcídio
Denúncia: O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o ex-senador Delcídio do Amaral e outras cinco pessoas são acusados de terem tentado atrapalhar as investigações da Lava Jato ao negociar para impedir que o ex-diretor da área internacional da Petrobras Nestor Cerveró assinasse acordo de delação premiada.</br> Resultado: Denúncia aceita pela Justiça; réus aguardam julgamento.
Foto: picture-alliance/AP Photo/F. Dana
Ex-ministro e senadora denunciados
Denúncia: A senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR) e seu marido, o ex-ministro Paulo Bernardo (foto), são acusados de pedir e receber propina no valor de 1 milhão de reais oriundos da Petrobras. O montante teria sido usado na campanha de Gleisi ao Senado em 2010.</br> Resultado: Denúncia apresentada ao Supremo Tribunal Federal (STF), aguarda decisão.
Foto: Reuters/U. Marcelino
Lula e o tríplex
Denúncia: O ex-presidente Lula é acusado de corrupção passiva e lavagem de dinheiro por ter supostamente recebido 3,7 milhões de reais em vantagens indevidas da construtora OAS. Parte do montante está relacionada a um tríplex no Guarujá. Também são alvos da ação a mulher do petista, Marisa Letícia, e mais seis pessoas.<br> Resultado: Denúncia apresentada pelo MPF, aguarda decisão.
Foto: picture-alliance/AP Photo/N. Antoine
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E quanto à corrupção, as punições e condenações da Lava Jato serão capazes de reprimir a prática de crimes no futuro?
Não, punição não coíbe prática de crimes. A punição afeta alguns indivíduos, e é claro que ela tem que ser aplicada, evidentemente. Mas ela não previne crimes. Particularmente não previne corrupção. O fato de um Marcelo Odebrecht, por exemplo, ser condenado coloca certo freio nos atos de alguns empresários, mas os empresários encontram meios de escapar eles próprio dessa sina. Esse tipo de situação existe no mundo todo. O camarada não vai deixar de corromper para fazer negócio com o Estado, quando o problema está nos controles que são muito mais do cotidiano das práticas administrativas, o que exige uma atenção permanente.
Por isso, eu não acredito que a Lava Jato resulte em redução significativa de corrupção. Não vejo nenhuma espécie de movimento ou de opinião – fora a minha – que diz que, para combater a corrupção, é preciso combater as suas causas. E não simplesmente aplicar punição, que não combate as causas.
E quais seriam as causas?
No caso da Lava Jato, é o loteamento político da Petrobras. E não acontece só na Petrobras, mas em todos os estados brasileiros e nas três esferas. Todo prefeito loteia administração entre os seus aliados políticos – e que estão lá para roubar. Todo prefeito, todos: 100% deles e 100% dos governadores. Isso ninguém entende. Então, não dá para achar que vai haver redução da corrupção porque tem um caso ou outro. Não vai acontecer isso.
O que o senhor achou da última fase da Lava Jato, envolvendo Lula?
Eu achei que, por ser o Lula, foi um sinal de que os investigadores não têm nada contra ele, além da questão do apartamento [no Guarujá] e do sítio [em Atibaia]. Acredito que seja muito pouco para o tamanho do escândalo. Parece-me uma demonstração de falta de elementos para enquadrá-lo de maneira mais pesada.
Eu não estou dizendo que não tenha que se investigar, viu? O argumento que diz "ele foi presidente da República" não é cabível. Se há motivos para investigar, por que não? Estou dizendo apenas que o chamado "batom na cueca" não apareceu – me desculpe a expressão machista.
O que o senhor acha das críticas que dizem que a Lava Jato tem se comportado de maneira partidária?
Existe, sim, uma concentração em cima do PT e do PMDB. Mas se imagine na cabeça de um investigador: "Eu tenho um cara do PT, um que é indicado pelo PT, o presidente da Petrobras… Esses caras são do PT." Então você vai fazer o quê? Investigar o PSDB por conta de um caso do PT? Não.
Mas se a pergunta é: "Outros casos envolvendo o PSDB são investigados com a mesma energia?", a resposta é: "Claro que não". Em São Paulo, por exemplo, o Ministério Público não investigou o caso dos metrôs com uma espécie de serenidade. E a coisa era realmente muito cabeluda.
Em vários dos protestos do último dia 13, o juiz Sérgio Moro e a PF foram alçados a heróis pelos manifestantes. O que o senhor acha disso?
Eu acho que isso é protofascismo. Acho esse negócio de ficar colocando xerife como herói perigoso. O pessoal não sabe com que está brincando. Não que eu seja favorável ao governo Dilma, acho um desastre. Mas esse negócio de "pega ladrão", "xerifão" e etc. é perigoso. O aventureirismo na política nunca deu certo.
Entenda a Operação Lava Jato
A Polícia Federal apura, desde 2014, um esquema bilionário de lavagem e desvio de dinheiro envolvendo a Petrobras, grandes empreiteiras e políticos. Entenda a maior investigação sobre corrupção já conduzida no país.
Foto: AFP/Getty Images
O início
A Operação Lava Jato foi deflagrada pela Polícia Federal em 17 de março de 2014. Começou investigando um esquema de desvio de recursos públicos e lavagem de dinheiro e descobriu a existência de uma imensa rede de corrupção envolvendo a Petrobras, grandes empreiteiras do país e políticos. O nome vem de um posto de gasolina em Brasília, um dos alvos da PF no primeiro dia de operação.
Foto: picture-alliance/dpa/M. Brandt
O esquema
Executivos da Petrobras cobravam propina de empreiteiras para, em troca, facilitar as negociações dessas empresas com a estatal. Os contratos eram superfaturados, o que permitia o desvio de verbas dos cofres públicos a lobistas e doleiros, os chamados operadores do esquema. Eles, por sua vez, eram encarregados de lavar o dinheiro e repassá-lo a uma série de políticos e funcionários públicos.
Foto: Reuters/S. Moraes
As figuras-chave
O esquema na Petrobras se concentrava em três diretorias: de abastecimento, então comandada por Paulo Roberto Costa; de serviços, sob direção de Renato Duque; e internacional, cujo diretor era Nestor Cerveró. Cada área tinha seus operadores para distribuir o dinheiro. Um deles era o doleiro Alberto Youssef (foto), que se tornou uma das figuras centrais da trama. Todos os citados foram condenados.
Foto: imago/Fotoarena
As empreiteiras
As grandes construtoras do país formaram uma espécie de cartel: decidiam entre si quem participaria de determinadas licitações da Petrobras e combinavam os preços das obras. Os executivos da estatal, por sua vez, garantiam que apenas o cartel fosse convidado para as licitações. Entre as empresas investigadas estão Odebrecht, Andrade Gutierrez e Camargo Corrêa. Vários executivos foram condenados.
Foto: Reuters/P. Whitaker
Os políticos
O núcleo político era formado por parlamentares de diferentes partidos, responsáveis pela indicação dos diretores da Petrobras que sustentavam a rede de corrupção dentro da estatal. Os políticos envolvidos recebiam propina em porcentagens que variavam de 1% a 5% do valor dos contratos, segundo os investigadores. O dinheiro foi usado, por exemplo, para financiar campanhas eleitorais.
Foto: J. Sorges
De Cunha a Dirceu...
A investigação só entrou no mundo político em 2015, quando a Lava Jato foi autorizada a apurar mais de 50 nomes, entre deputados, senadores e governadores de vários partidos. Desde então, viraram alvo de investigação políticos como os ex-parlamentares Eduardo Cunha (foto) e Delcídio do Amaral, ambos cassados, os senadores Renan Calheiros, Fernando Collor e o ex-ministro José Dirceu.
Foto: Reuters/A. Machado
... e Lula
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva é réu em dez processos relacionados à Lava Jato, sendo acusado pelos crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e obstrução da Justiça. As denúncias indicam que Lula teria recebido benefícios das empreiteiras OAS e Odebrecht, envolvendo imóveis no Guarujá e São Bernardo do Campo. Em 2018, ele foi preso e teve uma nova candidatura à Presidência barrada.
Foto: picture-alliance/AP Photo/F. Dana
As prisões
A Lava Jato quebrou tabus no Brasil ao encarcerar altos executivos de empresas e importantes figuras políticas. Entre investigados e aqueles já condenados pela Justiça, estão o executivo Marcelo Odebrecht, ex-presidente da Odebrecht; Eduardo Cunha, ex-presidente da Câmara; Sérgio Cabral, ex-governador do Rio; os ex-ministros José Dirceu (foto) e Antonio Palocci, entre outros.
Foto: picture-alliance/dpa/EPA/H. Alves
As delações
Os acordos de delação premiada são considerados a força-motriz da operação. Depoimentos como o de Marcelo Odebrecht (foto) chegam com potencial para impactar fortemente a investigação. O acordo funciona assim: de um lado, os delatores se comprometem a fornecer provas e contar o que sabem sobre os crimes, além de devolver os bens adquiridos ilegalmente; de outro, a Justiça reduz suas penas.
Foto: Getty Images/AFP/H. Andrey
O juiz
Responsável pela Lava Jato na 1° instância, o ex-juiz federal Sergio Moro logo ganhou notoriedade. Em manifestações, foi ovacionado pelo povo e chegou a ser chamado de "herói nacional". Mas também foi acusado de agir com parcialidade política. Em 2018, deixou o cargo e aceitou ser ministro do presidente Jair Bolsonaro, cuja candidatura foi beneficiada pela prisão de Lula no ano anterior.
Foto: Getty Images/AFP/E. Sa
Expansão internacional
Se começou num posto de gasolina em Brasília, a Lava Jato ganhou proporções internacionais com o aprofundamento das investigações. Segundo dados do Ministério Público Federal levantados a pedido da DW Brasil, a investigação já conta com a cooperação de pelo menos outros 40 países (veja no gráfico acima). Além disso, 14 países, fora o Brasil, investigam práticas ilegais promovidas pela Odebrecht.
Um terremoto político
Ao longo de cinco anos, a Lava Jato influenciou o impeachment de Dilma Rousseff, enfraqueceu o governo Michel Temer e contribuiu para a derrocada de velhos caciques do PT, MDB e PSDB. Em 2018, Lula, então favorito para vencer as eleições presidenciais, foi preso e teve a candidatura barrada. As investigações também fortaleceram um discurso antissistema que beneficiou a campanha de Bolsonaro.
Foto: picture-alliance/dpa/ZUMAPRESS/C.Faga
Críticas e revelações
A Lava Jato também acumulou acusações de parcialidade e de abusos em seus métodos. Em 2019, os procuradores da força-tarefa foram duramente criticados por tentarem criar uma fundação para gerenciar uma multa bilionária da Petrobras. No mesmo ano, conversas reveladas pelo site "The Intercept" apontaram suspeita de conluio entre Moro e os procuradores na condução dos processos, o que é proibido.