Leão 14: a origem do nome escolhido pelo novo papa
Publicado 8 de maio de 2025Última atualização 10 de maio de 2025
Ao ser eleito o 267º papa da Igreja Católica, o cardeal americano Robert Prevost escolheu o nome pontifício Leão 14 para marcar seu papado. Segundo ele, a decisão sinaliza seu compromisso com a justiça social diante dos desafios da nova revolução industrial e da inteligência artificial.
Em discurso aos membros do Colégio de Cardeais neste sábado (10/05) ele confirmou a expectativa de especialistas de que sua escolha reflete uma retomada do trabalho do papa Leão 13, que liderou a Igreja Católica de 1878 a 1903 e lançou as bases do pensamento social católico moderno com a sua encíclica Rerum Novarum.
No documento publicado em 1891, Leão 13 abordou temas como a dignidade humana, direitos dos trabalhadores e fez críticas ao capitalismo do início da era industrial. Ele também chamou a igreja a defender a classe trabalhadora por meio da promoção de sindicatos.
"Há várias razões, mas a principal é o fato de o papa Leão 13, com a histórica encíclica Rerum Novarum, ter abordado a questão social no contexto da primeira grande revolução industrial", disse o novo pontífice de 69 anos.
"Hoje a Igreja oferece a todos o seu patrimônio de doutrina social para responder a outra revolução industrial e aos desenvolvimentos da inteligência artificial, que trazem novos desafios na defesa da dignidade humana, da justiça e do trabalho", continuou.
A defesa social de Leão 13
A escolha Leão 14 já era vista por especialistas como um indicativo de seu compromisso com as questões sociais.
"Ao escolher o nome Leão 14, ele mostra que está comprometido com o ensinamento social da igreja, que foi fundado por seu antecessor Leão 13", afirmou Thomas Reese, padre americano e especialista em Vaticano, ao jornal americano The Washington Post.
Já o padre John Lydon, ex-companheiro de casa do cardeal americano, também disse à CNN que acredita que Prevost escolheu o nome Leão "para se conectar ao primeiro papa que nos deu o ensinamento social católico da Igreja".
Além da defesa dos trabalhadores, Leão 13 também atendeu a um apelo de um abolicionista brasileiro e publicou uma carta em 5 de maio de 1888 pedindo o fim da escravidão no Brasil. O principal argumento do pontífice era que o regime escravocrata era contrário aos princípios do cristianismo.
Continuidade do trabalho de Francisco
Para Natalia Imperatori-Lee, presidente do departamento de estudos religiosos da Universidade de Manhattan, a referência a Leão 13 remete à continuidade do trabalho do falecido papa Francisco.
Ouvido pela CNN americana, o padre Art Purcaro, um amigo de Robert Prevost, também vê relação da escolha com o "pensamento social" do predecessor. Para ele, o novo pontífice "quer continuar o papel que o papa Francisco" desempenhou na promoção da justiça social.
Neste sábado, Leão 14 abordou o tema com os cardeais. Ele prometeu seguir o estilo de Francisco de "dedicação total ao serviço", como "humilde servo de Deus e dos irmãos".
A doutrina e diplomacia de Leão 1°
Outro predecessor de Leão 14, o primeiro a escolher esse nome papal, Leão 1°, ficou conhecido por ter impedido a invasão bárbara de Átila, o Huno, em 452 d.C., convencendo-o a não saquear Roma por meio da diplomacia, contou o cardeal italiano Maurizio Piacenza à emissora estatal italiana RAI, relacionando-o ao perfil pacificador do novo papa.
Leão 1° foi um dos principais pontífices por ter defendido a autoridade papal sobre a Igreja e estabelecido a doutrina da dupla natureza de Cristo (visto como Deus e também como homem). Após sua morte, foi canonizado São Leão Magno. Ele é o primeiro papa listado com o título de "O Grande" no Annuário Pontifício, compêndio da hierarquia da Igreja.
Para especialistas, a preocupação dos papas que usaram o nome Leão com a eclesiologia, ou seja, a doutrina da Igreja, também pode dar o tom do papado de Leão 14.
Isso porque Prevost é agostiniano — ordem mendicante que tem atuação pastoral missionária — mas também doutor em Direito Canônico pela tradicional Pontifícia Universidade São Tomás de Aquino. Tal perfil alia tanto o olhar social quanto a tradição e preocupação com a doutrina católica.
Como os papas escolhem seu nome pontifício?
Como a DW mostrou, a escolha do nome costuma dar o tom adotado pelo pontífice em seus anos à frente da Igreja Católica, como um programa de governo. Foi o que aconteceu com Francisco, que contou ter adotado a alcunha de São Francisco de Assis, uma forma de orientar seu trabalho a uma igreja mais próxima dos pobres. Ele e o papa João Paulo foram os únicos a eleger um nome inédito desde o ano 914.
Durante a maior parte do primeiro milênio da Igreja Católica, os papas usavam seus nomes de batismo. A primeira exceção ocorreu no século 4, com o romano Mercúrio, que havia recebido o nome de um deus pagão e optou pelo mais apropriado João 2°.
A prática de adotar um novo nome se consolidou no século 11, um período de papas alemães que escolhiam nomes por "um desejo de expressar continuidade", explicou Roberto Regoli, historiador da Pontifícia Universidade Gregoriana de Roma à agência de notícias AP.
Por muitos séculos, os novos papas tendiam a adotar o nome de quem os havia elevado a cardeal. João foi o mais popular, escolhido por 23 papas, seguido por Bento e Gregório, com 16 cada.
Segundo Regoli, foi a partir da metade do século 20 que os papas passaram a escolher nomes que expressassem o propósito de seus papados.
gq (ap, ots, dw)