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Entrevista

14 de setembro de 2009

Em entrevista à Deutsche Welle, Sonja Ewers (Ariel Films) fala sobre a participação alemã no longa "Lebanon", de Samuel Maoz, que recebeu o Leão de Ouro como melhor filme no Festival de Veneza.

"São raros os soldados que aparecem no cinema tão pouco heróicos"Foto: Lebanon 2009

Na Alemanha, os resultados do Festival de Cinema de Veneza, encerrado no último sábado (12/09), provocaram euforia principalmente nos "bastidores" da indústria cinematográfica, pois vários dos filmes premiados foram também financiados por instituições alemãs de fomento ao cinema.

Entre esses se destaca Lebanon, do israelense Samuel Maoz, uma coprodução entre Israel, França e Alemanha, com pós-produção realizada em Colônia, através de recursos da Fundação de Fomento ao Cinema do Estado da Renânia do Norte-Vestfália, pela produtora Ariel Films.

Confinados à claustrofobia

Baseado nas experiências pessoais do diretor, o filme se passa quase que inteiramente no interior de um tanque, no primeiro dia da Guerra do Líbano, em 1982. Apontado como favorito desde sua exibição em Veneza, o longa enclausura o espectador, fazendo com que este praticamente só consiga, assim como os soldados protagonistas do filme, ver o mundo do lado de fora a partir das lentes de um telescópio.

"O mundo exterior se transforma naquilo que a ótica do telescópio permite entrar", comenta o diário alemão Frankfurter Rundschau, ao lembrar que o tanque de guerra, neste caso, "é ao mesmo tempo metáfora e meio estético".

Com um mínimo de luz, uso abusivo de lentes grande-angulares e opção por closes constantes, Lebanon é um relato pessoal, condensado em 24 horas, da experiência de guerra pela qual passou seu diretor, há mais de duas décadas.

Originariamente rodado em 16mm e câmeras digitais de qualidades díspares, o filme convenceu público e crítica pela contundência de sua estética "suja" e pelo esmero do tratamento do som, remetendo a outros filmes da história do cinema situados, da mesma forma, em espaços confinados.

Sonja Ewers, da Ariel Films, responsável pela pós-produção do filme na Alemanha, fala em entrevista à Deutsche Welle sobre a importância deste Leão de Ouro para a indústria cinematográfica alemã e comenta alguns dos desafios deste que é, segundo ela, "um dos filmes antibélicos mais coerentes de todos os tempos".

Deutsche Welle: No noticiário sobre Lebanon, vencedor do Leão de Ouro em Veneza, há menções constantes sobre a "participação alemã" no filme, ou seja, da Ariel Films como coprodutora. Hoje, a tendência é a de que haja cada vez mais coproduções internacionais. Pode-se falar ainda de "filmes nacionais"?

Sonja Ewers: Há com certeza ainda filmes nacionais, mas estes são, em sua maioria, ou filmes de diretores iniciantes ou grandes produções que têm pouca relação com outros países e por isso poucas chances de distribuição no exterior.

As instituições de fomento alemãs festejaram em Veneza com Samuel Maoz (Lebanon), Fatih Akin (Soul Kitchen) e Shirin Neshat (Zanan bedoone mardanMulheres sem Homens) – todos os três diretores com filmes coproduzidos pela Alemanha. O que esses Leões de Ouro significam para a indústria alemã do cinema?

Todo reconhecimento do fazer cinematográfico é positivo. No caso de Lebanon, exceto a montagem, toda a pós-produção –– muito trabalhosa – foi feita em Colônia. No caso específico desse filme, que depende muito de seu som extraordinário e do tratamento digital da imagem, houve uma respeitável contribuição criativa e tecnológica do lado alemão, que, com um prêmio como esse, também é reverenciado.

Lebanon foi associado a outros filmes israelenses recentes, como Beaufort e Valsa com Bashir. Pode-se falar realmente de uma nova onda de filmes que tratam da guerra a partir de uma perspectiva estritamente pessoal?

Diretor israelense Samuel Maoz, com Leão de OuroFoto: AP

Os três filmes citados têm em comum o fato de tematizarem a Guerra do Líbano, de 1982, a partir de uma perspectiva pessoal. Tudo indica que é necessário um tempo relativamente longo até que uma pessoa consiga elaborar aquilo por que passou a ponto de poder realizar um filme sobre isso. Essa Guerra do Líbano foi, como Samuel Maoz diz, "o nosso Vietnã".

Embora você só tenha participado da pós-produção do filme, poderia falar um pouco das dificuldades práticas em rodar um filme que se passa quase somente dentro de um tanque de guerra?

O tanque de guerra foi o menor dos problemas, porque foi usada uma réplica, com laterais móveis. As dificuldades foram menores em termos materiais do que psicológicas. Samuel Maoz, o diretor, insistiu em fazer com que aos atores tivessem, pelo menos do ponto de vista prático, uma ideia do que significa passar horas a fio enclausurado dentro de um tanque de guerra quente, mal cheiroso e barulhento.

Os atores tiveram que ficar realmente horas e horas dentro dessas caixas de metal, quando, de repente e sem nenhuma explicação, percebiam que havia gente do lado de fora batendo com barras de ferro: a simulação de um ataque súbito.

Lebanon é, sob determinado ponto de vista, um filme de memória, com traços autobiográficos. O quão documental é esse longa de ficção?

O filme tem fortes traços de memória. Como acentua o próprio Maoz, trata-se aqui, subjetivamente, da forma como a guerra ficou marcada em suas próprias lembranças.

De acordo com a crítica, o filme teve uma recepção internacional altamente positiva, porque toca numa temática universal; ou seja, poderia se passar "dentro de qualquer tanque, em qualquer guerra". A narrativa do filme ultrapassa a ligação local com a Guerra do Líbano de 1982? Até que ponto se trata de um filme antibélico por excelência?

Lebanon é um dos filmes antibélicos mais coerentes de todos os tempos, que abdica de qualquer história anterior e de qualquer possibilidade de identificação com os soldados. São raros os soldados que aparecem no cinema tão pouco heróicos, mas sim completamente amedrontados, meio alucinados, brigando uns com os outros e às vezes inaptos para o combate. É exatamente essa renúncia à história anterior e à possibilidade de identificação que faz o filme ser tão universal.

Autora: Soraia Vilela

Revisão: Simone Lopes

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