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Legado de Chico Mendes permanece vivo na Amazônia

Astrid Prange (av)20 de dezembro de 2013

Mesmo 25 anos após assassinato do ambientalista, segue a busca pela forma ideal de explorar a região, que vê aos poucos gado e indústria madeireira tomarem lugar do látex.

Chico Mendes
Foto: AFP/Getty Images

Deste lado os bons, do outro os maus: durante a vida do ambientalista Chico Mendes, seringueiros e pecuaristas formavam dois fronts irreconciliáveis na Amazônia. Hoje em dia, no entanto, os exploradores da borracha também criam gado, pois não conseguem mais viver apenas da produção de látex.

"Chico Mendes desencadeou um terremoto político", sintetiza Karl-Heinz Stecher, especialista em florestas e proteção do clima do banco alemão de desenvolvimento Kreditanstalt für Wiederaufbau (KfW). "Ele notou que não adiantava nada construir um muro em torno da Amazônia para protegê-la. A ideia é criar renda a partir dos frutos da floresta."

Stecher foi o primeiro alemão a, no último domingo (15/12), receber o Prêmio Chico Mendes, distinção concedida anualmente pelo estado do Acre. Segundo o especialista, o ativista não influenciou apenas a política ambiental do Brasil, como também o trabalho alemão de ajuda ao desenvolvimento. Sozinha, a KfW investe na utilização sustentável da mata em 35 países.

Revolução na mata tropical

O Acre é um importante parceiro dessa cooperação internacional, apresentando resultados significativos: entre agosto de 2012 e julho de 2013, a taxa de desmatamento no estado caiu 35% – embora, no mesmo período, o total na Amazônia tenha aumentado 27,8% em relação ao ano anterior. Segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), nesses 12 meses foram destruídos, ao todo, 5.843 quilômetros quadrados da mata amazônica, porém apenas 192 quilômetros quadrados no Acre.

"Se não fosse a Reserva Chico Mendes, não haveria mais floresta em grande parte do Acre", estima Silvana Lessa, gerente da reserva extrativista 9.315 quilômetros quadrados, destinada à proteção dos apanhadores de borracha. Ela diz adorar seu trabalho. "Os seringueiros estão melhor hoje do que há 20 anos. Todo morador tem a sua motocicleta, mas continua indo à floresta para extrair o látex."

Comercialização do látex da Amazônia encontra obstáculos e concorrênciaFoto: Lanxess

Há 25 anos, no dia 22 de dezembro de 1988, o seringueiro e sindicalista Chico Mendes foi assassinado a tiros. Dois anos mais tarde era criada, na fronteira com o Peru e a Bolívia, a reserva extrativista onde hoje vivem 10 mil pessoas. Porém há muito os frutos da mata não são mais sua única fonte de renda: também 20 mil cabeças de gado pastam nas clareiras do gigantesco território silvestre.

Concorrência do Sul e da Ásia

"Quando as crianças caem doentes, o pai vai até a cidade e vende um bezerro. É dinheiro rápido", explica José Alves da Silva, que dirige, na cidadezinha de Xapuri, o famoso Sindicato dos Trabalhadores Rurais, do qual Chico Mendes foi líder. Hoje, apenas 10% dos membros do sindicato vivem do látex, enquanto 80% trabalham como pecuaristas.

Até pouco tempo atrás, José também extraía a seiva branca das seringueiras. Porém, desistiu por não encontrar ninguém que comprasse o seu produto. "A economia extrativista fracassou", é seu tranquilo balanço. "As pessoas procuram outras formas de vida."

De fato: o contexto econômico para a compra do látex é difícil. Seringais comerciais no sul do país e na Ásia pressionam os preços para baixo. A produção de borracha natural acriana despencou de 12 mil toneladas em 1990 para apenas 470 toneladas em 2012.

Problemas de distribuição

Em contrapartida, a agropecuária e a indústria madeireira avançam. Segundo um estudo da Universidade Federal do Acre, o volume dos rebanhos quase quadruplicou, de 800 mil para 3 milhões de cabeças. No mesmo período, a produção de madeira cresceu de 300 mil metros cúbicos para cerca de 1 milhão de metros cúbicos por ano.

Silvana Lessa admite o déficit: "O problema não é a queda de preço da borracha natural, mas sim as distâncias enormes até os locais de venda." Todo o dinheiro do látex é consumido pelo transporte. "É claro que nós competimos com a criação de gado, mas na reserva a atividade extrativista continua sendo a base de subsistência."

Chico Mendes (1944-1988) influenciou política internacional de ajuda ao desenvolvimentoFoto: AFP/Getty Images

Para apoiar as 2 mil famílias da Reserva Chico Mendes, o governo acriano quer incentivar a demanda de borracha natural. Futuramente, a fábrica de preservativos em Xapuri também passará a produzir luvas medicinais de látex. Além disso, será criada uma nova central de produção para borracha de exportação. Assim, o governo em Rio Branco espera garantir a outras famílias, além das atuais 500, a venda do látex extraído.

Regiões de conflito

Um quarto de século após a morte de Chico Mendes, prossegue a busca pela forma "correta" de explorar os recursos da floresta tropical. Na região amazônica nos vizinhos Peru e Equador, já começaram as perfurações por petróleo. Também no Brasil, a prospecção das riquezas do solo faz parte da estratégia oficial de desenvolvimento, ao lado da construção de portos, estradas e represas.

Ao mesmo tempo, o governo brasileiro se comprometeu a reduzir em 80% o desmatamento e a erosão do solo na região amazônica até 2020. Pelo menos no papel, o Partido dos Trabalhadores (PT), há dez anos governando o país, permanece fiel ao legado de Chico Mendes, que foi um de seus membros fundadores.

"Hoje em dia, pouca gente diria que a proteção da natureza é possível sem as pessoas que vivem na natureza", resume Thomas Fatheuer, ex-diretor da Fundação Heinrich Böll no Brasil. "No entanto, a mudança de era, desencadeada por Chico Mendes na proteção ambiental, não resolve os problemas de cada reserva natural que existe. Toda região de reserva é uma região de conflito."

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