Legado de Schröder parece uma "colcha de retalhos"
20 de novembro de 2005Uma homenagem das Forças Armadas Alemãs e uma festa com mais de 600 convidados marcaram, no sábado à noite (19/11), em Hannover, o início da despedida de Gerhard Schröder (SPD) da chefia do governo alemão.
Fazendo um balanço dos sete anos de coalizão social-democrata-verde, Schröder reconheceu que "houve erros, mas colocamos a Alemanha no rumo certo". Ele disse também que vê na futura grande coalizão "uma continuidade, especialmente na política externa e nas reformas sociais".
Schröder ainda dirige o país até terça-feira (22/11), quando será empossada sua sucessora, Angela Merkel (CDU), mas seu governo já tem um lugar reservado na Casa da História Alemã, em Bonn.
O que fica de Schröder?
Para 2009, está prevista a publicação de um livro sobre os 70 anos de fundação da República Federal da Alemanha, que terá um capítulo dedicado à "era Schröder". Em artigo publicado no semanário Die Zeit, Hans Ulrich Wehler, um dos historiadores mais renomados da Alemanha, já prevê o que se lerá na obra sobre o período 1998–2005.
Na política interna, segundo Wehler, Schröder conseguiu avanços em três campos: modernizou a lei de imigração e naturalização, que reconhece a Alemanha como país de imigração; encerrou, com 50 anos de atraso, a briga pela indenização das vítimas de trabalhos forçados durante o nazismo; e iniciou, ainda que tardiamente, as reformas sociais que se tornaram mais do que necessárias diante dos desafios da globalização.
Na política externa, o balanço é controvertido, na opinião de Wehler. Por um lado, Schröder conseguiu, com a participação alemã em missões da ONU, consolidar a Alemanha como uma "potência média", o que não foi brincadeira, diante da resistência dos verdes e de parte dos social-democratas.
Já o "não" aos EUA na guerra do Iraque, lhe rendeu votos na Alemanha e simpatia internacional, mas arranhou profundamente as relações teuto-norte-americanas, acrescenta o historiador.
Fraco na política européia
Para Wehler, Schröder também foi o líder alemão mais fraco na política européia desde Konrad Adenauer. "Durante seu período de governo, foi introduzido o euro como moeda única e houve uma ampliação do bloco de 15 para 25 países-membros, mas as condições institucionais e financeiras para o funcionamento de UE permaneceram precárias."
A Constituição Européia foi engavetada, depois de ser rejeitada em vários países; a reforma financeira e o fim das subvenções agrárias ainda não está à vista. "Questionável é também o empenho com que Schröder defendeu o ingresso da Turquia na UE", diz Wehler.
O historiador prevê uma "reislamização" da Turquia, incompatível com os princípios europeus. E isso representaria o fracasso da política de expansão européia, defendida por Schröder. Assim como fracassou também o projeto de conquistar, ao lado de Brasil, Índia e Japão, um assento permanente no Conselho de segurança da ONU. Com o Brasil, Schröder ainda formalizou uma parceria estratégica, que até agora permanece retórica.
"Colcha de retalhos"
O legado de Schröder parece uma "colcha de retalhos", diz o analista do jornal Süddeutsche Zeitung. Todos os projetos iniciados ficaram aquém do desejado pela coalizão social-democrata-verde. Mais pragmático do que programático, o chefe de governo em fim de mandato brilhou, sobretudo, quando tratou de transformar crises em vitórias eleitorais.
Gerhard Schröder não chegou perto de um Willy Brandt, mas também não foi o pior chanceler da Alemanha até a atualidade, dizem alguns analistas. Seu projeto de reformas sociais foi "doloroso" para o partido e o país, mas sua política externa devolveu autoconfiança aos alemães no plano internacional.
Schröder foi o sétimo chefe de governo alemão do pós-guerra, o terceiro social-democrata a ocupar o cargo. Em pesquisa de opinião pública divulgada neste domingo (20/11), mais da metade dos entrevistados (54%) disseram que ele fez um bom trabalho.