Lula demite Silvio Almeida após denúncias de assédio sexual
Publicado 6 de setembro de 2024Última atualização 7 de setembro de 2024
Então titular da pasta dos Direitos Humanos e Cidadania foi acusado por ONG de assediar sexualmente diversas mulheres. Segundo imprensa, entre as vítimas está ministra Anielle Franco. Almeida repudia acusações.
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O presidente Luiz Inácio Lula da Silva demitiu nesta sexta-feira (06/09) o até então ministro dos Direitos Humanos e Cidadania, Silvio Almeida, na esteira de denúncias de assédio e importunação sexual.
Almeida recebeu a notícia do presidente no Palácio do Planalto, no início da noite. A decisão de exonerar Almeida foi tomada após Lula se reunir com outros ministros ao longo da tarde.
"O presidente considera insustentável a manutenção do ministro no cargo considerando a natureza das acusações de assédio sexual", diz nota da Presidência.
O portal "Metrópoles" foi o primeiro a divulgar a existência das denúncias, na quinta-feira (05/09). Segundo o site, os episódios teriam ocorrido no ano passado e uma das vítimas foi a ministra Anielle Franco, da Igualdade Racial.
A ONG Me Too, dedicada ao combate da violência sexual, confirmou ter recebido queixas contra Almeida.
Desde então, diversos veículos de imprensa passaram a publicar sobre casos que teriam envolvido Almeida, alguns de mais de uma década atrás, enquanto professor universitário, e outros mais recentes, quando ele já ocupava o posto de ministro.
Após a demissão, Anielle Franco divulgou uma nota em seu Instagram na qual afirma que não é aceitável relativizar ou diminuir episódios de violência.
"Reconhecer a gravidade dessa prática e agir imediatamente é o procedimento correto, por isso ressalto a ação contundente do presidente Lula e agradeço a todas as manifestações de apoio e solidariedade que recebi", afirmou.
Almeida afirmou, por meio de nota, que pediu ao presidente Lula (PT) a sua demissão. Ele disse ainda que a decisão teve a intenção de garantir a isenção das apurações sobre o caso. "Será uma oportunidade para que eu prove a minha inocência e me reconstrua", disse na noite da sexta.
Veja o que se sabe sobre as denúncias:
Quem é Silvio Almeida
Silvio Luiz de Almeida, de 48 anos, ocupava desde janeiro de 2023 no governo Lula o cargo de ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, antiga pasta da Família do governo Bolsonaro. Com uma carreira essencialmente acadêmica na área do Direito, Almeida não é um político profissional, mas se destacou publicamente por sua atuação como ativista e autor de estudos raciais no Brasil, incluindo o livro Racismo Estrutural. Ele também cofundou em 2008 e presidiu o Instituto Luiz Gama, uma associação civil baseada em São Paulo que se define como organização "que atua na defesa das causas populares, com ênfase nas questões sobre os negros".
Antes de ser ministro, Almeida também integrava o grupo Prerrogativas, formado em 2015 e composto por advogados contrários críticos à Lava Jato e à prisão de Lula em 2018. Em 2022, após a eleição de Lula, ele passou a integrar o grupo técnico de Direitos Humanos do gabinete de transição e seu nome chegou a ser sondado como um possível titular da pasta da Justiça, antes de Lula indicá-lo para o reformulado Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania.
Como surgiram as acusações
As primeiras acusações contra Almeida foram divulgadas nesta quinta-feira pela coluna do jornalista Guilherme Amado no Portal Metrópoles, com base em denúncias reunidas pela Me Too Brasil, uma ONG fundada há quatro anos e que presta apoio a vítimas de violência sexual.
"A organização de defesa das mulheres vítimas de violência sexual, Me Too Brasil, confirma, com o consentimento das vítimas, que recebeu denúncias de assédio sexual contra o ministro Silvio Almeida, dos Direitos Humanos. Elas foram atendidas por meio dos canais de atendimento da organização e receberam acolhimento psicológico e jurídico", declarou a ONG em nota divulgada à imprensa.
"Como ocorre frequentemente em casos de violência sexual envolvendo agressores em posições de poder, essas vítimas enfrentaram dificuldades em obter apoio institucional para a validação de suas denúncias. Diante disso, autorizaram a confirmação do caso para a imprensa", prosseguiu a ONG, presidida pela advogada Marina Ganzarolli, que também é cofundadora da Rede Feminista de Juristas.
"A exposição de um suposto agressor poderoso pode encorajar outras vítimas a romperem o silêncio. Em muitos casos, o abuso não ocorre isoladamente, e a denúncia pode abrir caminho para que outras pessoas também busquem justiça."
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O que se sabe sobre as denúncias
A nota divulgada inicialmente pela ONG Me Too Brasil tem tom genérico, e não revela nomes de supostas vítimas ou quantidade de pessoas que teriam apresentado denúncias. Mas diversos veículos de imprensa logo passaram a divulgar informações mais detalhadas, algumas envolvem casos que teriam ocorrido há mais de uma década e outras episódios mais recentes, após Almeida passar a integrar o governo Lula.
O Metrópoles apontou que uma das vítimas de Almeida foi uma de suas colegas de Esplanada, a ministra Anielle Franco, da Igualdade Racial.
A informação também foi publicada pela coluna da jornalista Mônica Bergamo, da Folha de S.Paulo, que apontou que Anielle Franco relatou a integrantes do governo que havia sido assediada sexualmente por Almeida. Bergamo ainda apontou que procurou em junho a ministra para comentar os relatos, mas que Anielle evitou confirmar ou negar, impedindo que o caso viesse a público naquela época.
Ainda segundo a Folha, interlocutores da ministra apontaram que Anielle "não queria transformar o caso em um escândalo público para não prejudicar o governo Lula". "Ela foi procurada por mais de um jornalista no período, mas preferiu guardar silêncio e não formalizou a denúncia", diz o jornal.
De acordo com o Metrópoles, Almeida teria tocado na perna da colega de Esplanada e dado beijos inapropriados ao cumprimentá-la, além de usar palavras de cunho sexual e baixo calão. Os episódios teriam ocorrido em 2023.
Segundo o jornal O Globo, Anielle teria conversado sobre o assunto com Janja e os ministros da Secretaria de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, e Vinicius Carvalho, da Controladoria-Geral da União (CGU), antes que as denúncias se tornassem públicas.
No mesmo dia, a revista Veja publicou uma reportagem no qual apontou que estudantes da Universidade São Judas Tadeu, em São Paulo, ouviram relatos de colegas mulheres que teriam sido assediadas sexualmente pelo atual ministro entre 2007 e 2012. Silvio Almeida lecionou por 14 anos na instituição, até 2019. "Os relatos são de tentativa de troca de favores sexuais para que a avaliação das provas fosse alterada para melhor, incluindo alunas que corriam o risco de reprovação nas matérias ensinadas por ele", diz a reportagem da revista.
Ao Metrópoles, o ex-secretário dos Direitos da Criança e do Adolescente, pasta vinculada ao Ministério dos Direitos Humanos, o advogado Ariel de Castro lamentou as denúncias contra o ministro Almeida, mas se disse estar "aliviado" que elas tenham vindo à tona. "Eu soube que muitos colegas que iniciaram comigo deixaram o ministério por desrespeitos do ministro", disse Castro, que ficou apenas cinco meses no cargo e que atribuiu sua saída a intrigas internas que teriam sido promovidas por Almeida e assessores leais ao ministro. "Agora a verdade apareceu e o país todo sabe quem ele é", acrescentou.
Na quarta-feira (04/09), antes que a denúncia de assédio sexual viesse à tona, a UOL também havia publicado uma reportagem sobre casos de assédio moral no Ministério dos Direitos Humanos. Segundo o portal, dez casos foram reportados dentro da pasta até janeiro deste ano – sete acabaram arquivados. De acordo com a reportagem, ao menos 52 pessoas deixaram o ministério desde o início do governo Lula – várias delas por supostas condutas inadequadas por parte de Almeida e assessores.
Como Silvio Almeida reagiu
Em nota divulgada na noite de quinta-feira, Almeida negou as acusações, afirmou ser vítima de "difamações" e de uma campanha para "afetar" sua "imagem enquanto homem negro em posição de destaque".
"As falsas acusações, conforme definido no artigo 339 do Código Penal, configuram ‘denunciação caluniosa'", diz a nota. "De acordo com movimentos recentes, fica evidente que há uma campanha para afetar a minha imagem enquanto homem negro em posição de destaque no Poder Público, mas estas não terão sucesso. Isso comprova o caráter baixo e vil de setores sociais comprometidos com o atraso, a mentira e a tentativa de silenciar a voz do povo brasileiro, independentemente de visões partidárias."
"Toda e qualquer denúncia deve ter materialidade. Entretanto, o que percebo são ilações absurdas com o único intuito de me prejudicar, apagar nossas lutas e histórias, e bloquear o nosso futuro. Confesso que é muito triste viver tudo isso, dói na alma. Mais uma vez, há um grupo querendo apagar e diminuir as nossas existências, imputando a mim condutas que eles praticam. Com isso, perde o Brasil, perde a pauta de direitos humanos, perde a igualdade racial e perde o povo brasileiro", prossegue a nota.
"Quaisquer distorções da realidade serão descobertas e receberão a devida responsabilização. Sempre lutarei pela verdadeira emancipação da mulher, e vou continuar lutando pelo futuro delas. Falsos defensores do povo querem tirar aquele que o representa. Estão tentando apagar a minha história com o meu sacrifício."
A mulher de Almeida, Ednéia Carvalho, também defendeu publicamente seu marido, rechaçando as acusações e afirmando que ele é vítima de racismo. "É sempre assim. A branquitude não aceita a negritude no poder", escreveu ela em uma das publicações.
Já o Instituto Luiz Gama, ligado a Almeida, afirmou em publicações em redes sociais que as acusações são "mentiras" orquestradas para derrubar Almeida e insinuou que ele é vítima de racismo. "Muitas pessoas mesquinhas e racistas não querem um ministro negro", diz uma das publicações. Outra publicação parece ser um recado para Anielle Franco: ""Infelizmente, há pessoas negras que também não querem, gente que há muito tempo trama contra ele e reclama que está sendo ofuscada por ele."
jps/cn (ots)
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Foto: ITAR-TASS/Imago Images
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Foto: Diego H. Carcedo/Anadolu/picture alliance
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Foto: Florion Goga/REUTERS
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