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Lula discursa no Parlamento Europeu e ataca Bolsonaro

15 de novembro de 2021

Ex-presidente diz que Bolsonaro é "cópia mal feita de Trump" que "representa peça importante da extrema direita fascista mundial". Lula ainda se reuniu com chefe da diplomacia da UE e não descartou Alckmin como vice.

Luiz Inácio Lula da Silva
"Vocês podem imaginar o quanto dói participar de grandes eventos internacionais como este e ter que declarar o quanto o Brasil andou para trás", disse Lula no Parlamento EuropeuFoto: Ricardo Stuckert/Instituto Lula

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse nesta segunda-feira (15/11) em Bruxelas, na Bélgica, que Jair Bolsonaro "representa uma peça importante da extrema direita mundial" e que o atual presidente brasileiro não passa de "uma cópia mal feita de Trump".

Lula ainda afirmou que as forças progressistas e social-democratas do mundo precisam se unir para derrotar a extrema direita. "O mundo precisa de democracia, de paz e não de guerra, precisa de livros e não de armas."

Líder nas pesquisas para as eleições de 2022, Lula participou no Parlamento Europeu de um evento organizado pela Aliança Progressista dos Socialistas e Democratas (S&D), grupo que reúne eurodeputados social-democratas e que controla a segunda maior bancada da Casa.

Agenda cheia

O petista está na Europa desde a semana passada. O giro europeu, que começou em Berlim, tem como objetivo reatar as relações com políticos do continente e oferecer um contraste com o isolado Jair Bolsonaro, que em três anos de governo não construiu nenhum relacionamento significativo com as potências europeias e se destacou mais pelos ataques que fez a líderes estrangeiros.

Com uma agenda cheia, repleta de encontros com colegas social-democratas, Lula já travou reuniões amistosas com algumas figuras proeminentes do bloco europeu, como Olaf Scholz (o provável próximo chanceler federal da Alemanha) e Josep Borrell (chefe da diplomacia da UE). Os encontros de fato contrastaram com a recente viagem de Bolsonaro à Itália, na qual o atual presidente brasileiro se viu isolado e sem travar diálogos relevantes com figuras do bloco europeu.

Muitas das falas de Lula na Europa também contrastaram com declarações recentes de Bolsonaro. O ex-presidente descreveu aos europeus um quadro de penúria econômica e social no Brasil e também falou da importância da preservação do meio ambiente.

Bolsonaro, que no momento cumpre uma agenda em Dubai, por outro lado disse aos seus anfitriões árabes nesta segunda-feira que a "Amazônia não pega fogo" por ser "úmida". Já seu ministro da Economia, Paulo Guedes, tentou pintar um quadro de crescimento da economia, que é desmentido por estatísticas do próprio governo. 

Parlamento Europeu

Nesta segunda-feira, Lula usou uma coletiva de imprensa e um discurso no plenário do Parlamento Europeu tanto para denunciar Bolsonaro e as atuais políticas do governo brasileiro quanto para agradecer a solidariedade que recebeu de políticos social-democratas enquanto esteve preso entre 2018 e 2019.

"Bolsonaro é uma cópia mal feita de Trump. (...) Bolsonaro representa hoje uma peça importante na extrema direita fascista e nazista mundial. O Brasil não merecia passar pelo que está passando", disse Lula durante a coletiva, ao lado da eurodeputada espanhola Iratxe García Pérez, que lidera o grupo S&D no Parlamento Europeu.

"Nunca imaginei que o Brasil fosse eleger uma pessoa como Bolsonaro para presidir. De qualquer forma, nós agora temos o compromisso de devolver a democracia e o bem-estar social ao nosso povo", disse Lula, um pouco depois, em discurso no plenário.

"Hoje estou inocente e livre", disse Lula. Ele também direcionou críticas ao ex-juiz Sergio Moro, que recentemente também sinalizou que pretende concorrer à Presidência em 2022. Lula afirmou que o ex-magistrado e ex-aliado de Bolsonaro conduziu um "julgamento político" e que Moro já tinha ambições políticas à época dos procedimentos judiciais.

Na plateia do plenário estava o ex-presidente equatoriano Rafael Correa, que hoje vive em Bruxelas e que, assim como Lula, sofreu problemas com a Justiça após deixar o poder e o Equador passar a ser presidido por um ex-aliado.

Imagem do Brasil

Lula ainda mencionou os mais de 610 mil mortos pela pandemia no Brasil, afirmando que essas estatísticas não são resultado de "alguma fatalidade", mas da "política criminosa" de Bolsonaro, a quem acusou de minimizar a doença, "zombar dos mortos", atrasar a compra de vacinas e distribuir medicamentos comprovadamente ineficazes contra a covid-19.

"Experiências com medicamentos ineficazes usando seres humanos como cobaias involuntárias chegaram a ser realizadas no Brasil, reeditando horrores do nazismo", disse Lula.

O ex-presidente também mencionou realizações do seu governo e a imagem positiva que o país exibia no exterior há poucos anos.

"Vocês podem imaginar o quanto dói participar de grandes eventos internacionais como este e ter que declarar o quanto o Brasil andou para trás desde o golpe de 2016 contra a presidente Dilma Rousseff e a chegada da extrema direita ao poder", disse. "O Brasil vive hoje uma tragédia social, econômica, ambiental e sanitária sem precedentes."

Por outro lado, Lula manifestou otimismo de que será possível mudar esse quadro.

"O Brasil tem jeito. O Brasil é muito maior do que qualquer pessoal que tente destruí-lo. (...) Felizmente, essa área de trevas que se abateu sobre o planeta por conta da ascensão de governos de extrema direita pelo mundo afora emite claros sinais de que está chegando ao fim. Partidos e candidatos progressistas vêm conquistando importantes vitórias. Isso está acontecendo em vários países, e estou certo de que também vai acontecer no Brasil a partir da eleição do próximo ano. O Brasil voltará a ser uma força positiva no mundo."

Em falas claramente direcionadas para contrastar com Bolsonaro, Lula ainda se manifestou sobre a importância do multilateralismo, do Mercosul, da preservação do meio ambiente e de manter boas relações com os países da União Europeia. "O povo brasileiro não quer que essa destruição continue. Os brasileiros querem a Amazônia viva e de pé." 

Alianças

Ao lado de Lula em parte do evento no Parlamento, a eurodeputada Iratxe García Pérez afirmou que o bloco social-democrata europeu deve assinar um memorando de entendimento com o PT.

"É um momento crucial e precisamos acabar com o governo de Bolsonaro”, afirmou. "Pelo seu autoritarismo, porque isso põe em risco a democracia, pelo seu comportamento, poderíamos dizer, criminoso na pandemia, pelo seu negacionismo climático e pela exclusão da biodiversidade no Brasil, pela sua misoginia, ódio e ataques às mulheres. É necessário que haja uma mudança no Brasil e o grupo social-democrata estará trabalhando e colaborando para isso", disse a eurodeputada.

"A esquerda, os socialistas do mundo inteiro precisam se unir e discutir onde e em que momento cometemos alguns erros e por que a extrema direita se fortaleceu tanto. E nós temos que ir às ruas para derrotá-los porque o mundo não suporta mais fascismo e nazismo. O mundo precisa de democracia, de paz e não de guerra, precisa de livros e não de armas", disse Lula aos social-democratas europeus presentes no Parlamento.

Além de Lula, o evento organizado pelo S&D também contou com a participação de Claudia Sheinbaum Pardo, prefeita da Cidade do México, e do ex-premiê espanhol José Luis Rodríguez Zapatero.

Alckmin como vice?

Questionado durante a coletiva de imprensa se considera mesmo uma candidatura à Presidência que tenha o ex-governador Geraldo Alckmin como vice, Lula evitou responder, mas também não negou. Nos últimos dias, cresceram as especulações de que Lula vem conversando com o tucano sobre uma possível aliança. Os dois foram rivais no pleito presidencial de 2006.

Lula disse que existe uma "extraordinária relação de respeito" entre ele e Alckmin e que não há diferenças que não possam ser reconciliadas.

"Eu tenho uma extraordinária relação de respeito com o Alckmin. Eu fui presidente quando ele foi governador, nós conversamos muito. Não há nada que aconteceu entre eu e o Alckmin que não possa ser reconciliado", disse Lula.

"Política às vezes é como um jogo de futebol, você dá uma botinada no cara, ele cai de dor, mas depois que acaba o jogo, eles se abraçam e vão tomar uma cerveja e discutir o próximo jogo. Eu disputei as eleições de 2006 com o Alckmin, mas tenho profundo respeito por ele. Mas eu não tô discutindo vice ainda porque não discuti a minha candidatura. Quando eu decidir ser candidato, aí sim eu vou sair a campo para escolher um vice", disse Lula.

O próprio Lula evitou falar diretamente da sua própria candidatura à Presidência, limitando-se a afirmar que o PT vai ter um candidato em 2022. "Queremos ganhar para colocar o Brasil novamente num patamar respeitável", completou Lula.

Giro europeu

No domingo, Lula se reuniu em Bruxelas com o chefe da pasta da diplomacia da União Europeia, Josep Borrell. Acompanharam o encontro os ex-ministros Celso Amorim e Aloizio Mercadante. "Conversamos muito sobre a conjuntura brasileira e latino-americana", disse Lula.

"Ele nos relatou preocupação com a urgência climática e com a viabilização do acordo Brasil-União Europeia. E defendeu uma multipolaridade política, tecnológica e comercial", completou o ex-presidente.

"Fico feliz em dar as boas-vindas ao ex-presidente Lula em Bruxelas esta noite. Tivemos um bom intercâmbio sobre as relações UE-América Latina, incluindo relações bilaterais com Brasil, Mercosul, Nicarágua e Venezuela. O Brasil é um parceiro estratégico da UE desde 2007", escreveu Borrell no Twitter após o encontro.

Em Bruxelas, Lula ainda posou para fotos ao lado de apoiadores brasileiros que vivem na capital belga. Ele ainda se reuniu com Sharan Burrow, secretária geral da Confederação Sindical Internacional (Ituc), organização que representa mais de 200 milhões de trabalhadores em cerca de 160 país, e com o americano Joseph Stiglitz, que foi laureado com o Nobel da Economia em 2001 e é conhecido por posições críticas ao neoliberalismo.

Etapa alemã

Antes da etapa em Bruxelas, Lula visitou uma série de políticos alemães em Berlim, com destaque para uma reunião com Olaf Scholz, atual ministro das Finanças da Alemanha e vencedor da eleição legislativa de setembro.

Lula e o vice-chanceler alemão Olaf ScholzFoto: Ricardo Stuckert/Instituto Lula

No momento, Scholz lidera as negociações para a formação de uma coalizão de governo que deve tê-lo como chanceler federal.

As conversas envolvem a legenda de Scholz, o Partido Social-Democrata (SPD), o Partido Verde e o Partido Liberal Democrático. O SPD terminou a eleição em primeiro lugar, com 25,7% dos votos. Se as negociações forem bem-sucedidas, Scholz deve ser o sucessor da conservadora Angela Merkel e passar a comandar a maior economia da Europa.

"Estou muito satisfeito com nossas boas discussões e aguardo com expectativa continuar nosso diálogo!", escreveu Scholz no Twitter em inglês após o encontro.

Em Berlim, ele também se reuniu com os políticos do partido Die Linke (A Esquerda) Gregor Gysi e Heinz Bierbaum. O primeiro é um membro influente da legenda e foi o último líder do Partido Socialista Unificado (SED) da antiga Alemanha Oriental. Já Bierbaum é atualmente líder do Partido da Esquerda Europeia, um agrupamento de legendas de esquerda da UE.

Lula ainda se reuniu com Martin Schulz, ex-líder do SPD alemão e ex-presidente do Parlamento Europeu. Schulz, que chegou a concorrer à chancelaria alemã em 2017 mas foi derrotado por Angela Merkel, visitou Lula na prisão em Curitiba em agosto de 2018. Lula se referiu a Schulz depois do encontro como "um companheiro das horas mais difíceis, a quem sou grato por ter feito questão de ir até o Brasil me visitar quando estava preso em Curitiba".

No mesmo dia, Lula ainda se encontrou com as deputadas do SPD Yasmin Fahimi e Isabel Cademartori. O ex-presidente brasileiro ainda teve encontros em Berlim com figuras do sindicalismo alemão, incluindo Reiner Hoffmann, presidente da influente Confederação Alemã de Sindicatos (DGB); Michael Vassiliadis, presidente do Sindicato de Minas, Química e Energia (IG BCE); Frank Werneke, presidente do Sindicato Unido de Serviços (ver.di); e Christiane Bonner,  copresidente do IG Metall, o maior sindicato de trabalhadores da indústria em toda a Europa e que mantém laços com a CUT e Sindicato dos Metalúrgicos do ABC.

Na terça-feira, ele seguirá para Paris, onde vai conceder uma palestra durante a conferência sobre o Brasil no Instituto de Estudos Políticos de Paris (Sciences Po). A conferência "Qual o lugar do Brasil no mundo de amanhã?" ocorre para marcar os dez anos do título de Doutor Honoris Causa que Lula recebeu da Sciences Po.