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Mídia dos EUA critica Alemanha na crise da Grécia

Gero Schliess, de Washington (ca)9 de julho de 2015

Vozes críticas à posição alemã predominam, apesar de algumas dissonâncias. E o "New York Times" afirma que a Alemanha esqueceu a lição do passado, quando ela mesma foi beneficiada por um corte de dívidas.

Premiê Alexis Tsipras e Merkel durante um dos encontros para tentar solucionar o problema do endividamento gregoFoto: Reuters/Y. Herman

"Merkel está fazendo da Grécia um Estado pária?", indaga com uma nitidez provocante a revista Newsweek. E a emissora CNBC prognostica: "A Alemanha é quem vai sair perdendo, não a Grécia". A rede de TV complementa a sua previsão sombria com uma declaração recente do Prêmio Nobel de Economia Joseph E. Stiglitz: "A Alemanha é o problema, não a Grécia".

As vozes críticas à Alemanha na mídia dos EUA elevaram cada vez mais o tom no decurso da crise grega. "Poder alemão polariza a Europa" é o título de um artigo do influente Wall Street Journal desta terça-feira, no qual o político espanhol Pablo Iglesias, crítico da austeridade econômica, é citado com a frase: "Não queremos nos tornar uma colônia alemã".

E Paul Krugman, importante colunista de esquerda do New York Times, exigiu dramaticamente em um comentário: "Estanquem o sangramento!" Krugman compara a chanceler federal Angela Merkel e os chefes de governo europeus com médicos medievais que aplicam a sangria como tratamento ao paciente Grécia. Mas, em vez de curar a enfermidade, o doente fica cada vez mais lânguido.

"Estanquem o sangramento!", escreve Paul KrugmanFoto: picture-alliance/ dpa

No mundo financeiro também se escuta opiniões semelhantes. No blog de finanças Zero Hedge, que analisa os desenvolvimentos da Bolsa de Valores, Merkel é associada ao Tratado de Versalhes. De acordo com o blog, o que importa é a hegemonia alemã.

Bode expiatório e cordeirinho inocente

A mídia americana está sendo tomada por uma onda de ressentimentos contra os alemães? Merkel seria para a mídia um bode expiatório e a Grécia, um cordeirinho inocente? O analista econômico americano e especialista em assuntos europeus Jacob Kirkegaard vê a situação de outra forma. Ele concorda que articulistas de esquerda, como Joseph Stiglitz ou Paul Krugmam, defendem uma posição muito antialemã. Mas, para eles, a Grécia seria somente uma "batalha representativa" no debate interno em torno da política econômica correta, na qual ambos defendem o aumento do consumo e da demanda.

Kirkegaard lembra que há outras opiniões. Uma das mais proeminentes é a de Charles Krauthammer, colunista do Washington Post e convidado assíduo da conservadora Fox News. "A Grécia mama nos seios da Alemanha" é uma frase dele. Para Krauthammer, os gregos se comportam como jovens mimados, que não param de sacar dinheiro com o cartão de crédito do papai, mas somente para comprar coisas banais, sem investir no futuro.

Kirkegaard diz que as opiniões sobre a Grécia miram a política econômica internaFoto: PIIE

O próprio Washington Post argumenta de forma mais equilibrada. Embora ele também constate que a Alemanha seria "parcialmente responsável" pela crise da Grécia, o jornal admite em opinião escrita pelo venerável conselho editorial: "A Alemanha pode alegar com razão que, devido à Grécia, aceitou correr altos riscos financeiros". Além disso, os alemães estariam certos com a análise de que a economia grega estaria "profundamente desajustada" e precisaria reformas direcionadas para o crescimento, acrescenta o jornal.

Interesses estratégicos de Obama

O presidente Barack Obama falou recentemente por telefone com Merkel sobre a crise da Grécia. Em declarações oficiais, ele se abstém de críticas. O secretário do Tesouro, Jack Lew, foi bem mais claro ao defender, nesta quarta-feira, um corte na dívida da Grécia. Para Obama, o que importa é que, no final, a Grécia continue na zona do euro e que a sua adesão à União Europeia e à Otan não seja questionada.

Nesse ponto, ele está de olho principalmente na Rússia e nos interesses estratégicos dos americanos. Segundo Kirkegaard, causa um certo estranhamento, em Washington, que Merkel e os europeus ainda não tenham conseguido resolver a crise. Enquanto o presidente Obama saúda a liderança alemã na Europa, de acordo com Kirkegaard, existe outra facção em Washington. "Nos EUA, alguns estão insatisfeitos com a posição dominante da Alemanha na Europa, porque eles preferem uma Europa fraca e dividida", disse o especialista em assuntos europeus. Mas essa seria uma visão muito antiga e que não reflete o pensamento da elite política e econômica.

Delegação alemã durante o acordo de reestruturação da dívida em 1953Foto: picture-alliance/dpa

O dilema de Merkel

Muitos órgãos da mídia americana apontam que, embora Merkel seja a chefe de governo mais poderosa da Europa, ela se encontra atualmente num dilema: por um lado, ela tem de manter a coesão da União Europeia e também a viabilidade do projeto europeu, mas, por outro, ela não tem mais como "vender" ao seu partido e aos alemães a ideia de novas concessões financeiras para a Grécia. Regularmente, os jornais americanos divulgam pesquisas de opinião, segundo as quais somente 10% dos alemães apoiam novas concessões à Grécia.

Para explicar essa posição aos seus leitores, o Washington Post afirma que os alemães respeitam regras e acordos. Num país em que culpa (Schuld) e dívidas (Schulden) são praticamente a mesma palavra, o endividamento dos gregos é visto quase como um imperdoável sacrilégio, constata a renomada publicação. Segundo essa interpretação da psiquê alemã, isso explicaria a dificuldade de Merkel e seus compatriotas em aceitar o corte da dívida, exigido também pelo Fundo Monetário Internacional (FMI).

É justamente nesse ponto em que o New York Times insiste e afirma que, na luta em torno de um perdão de dívida, a Alemanha esqueceu a sua lição. Embaixo de uma foto datada de 1953, que mostra a delegação alemã sob o comando do banqueiro Hermann Josef Abs assinando um acordo de reestruturação da dívida em Londres, encontra-se um comentário malicioso: "O principal credor a exigir dos gregos que paguem pelos desperdícios do passado se beneficiou, nem tanto tempo atrás, de condições mais suaves do que as que está disposto a oferecer".

Com uma canetada, afirma o jornal, a dívida alemã foi reduzida pela metade. E a publicação também não se esqueceu de comentar que, entre os generosos credores, estava um país que se encontra hoje no fogo cruzado da crítica alemã: a Grécia.

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