Líder independentista tem data para explicar confuso discurso: até a próxima segunda, ele terá que dizer se declarou separação ou não. Governo central já se prepara para possível intervenção na Catalunha.
Anúncio
O primeiro-ministro da Espanha, Mariano Rajoy, deu nesta quarta-feira (11/10) um ultimato aos separatistas catalães: o governo da região autônoma terá até a próxima segunda para confirmar se realmente foi declarada a independência e até quinta para voltar à legalidade.
O comparecimento de Rajoy ao Parlamento é uma resposta ao confuso discurso da véspera de Carles Puigdemont, o chefe do governo regional que aparentemente declarou a independência catalã para, apenas oito segundo depois, suspender o processo e se dizer aberto ao diálogo.
"Os governantes da Catalunha usaram sua posição institucional para perpetrar um ataque desleal e muito perigoso contra a nossa Constituição, a unidade da Espanha e, o que é pior, contra a convivência pacífica entre cidadãos", afirmou o primeiro-ministro.
Rajoy pede para Catalunha dizer se declarou independência
01:30
O ultimato dado por Rajoy é o primeiro passo do governo central para acionar o artigo 155 da Constituição espanhola, uma opção que levaria à aplicação de medidas extraordinárias para suspender a autonomia política da Catalunha e assumir o controle da região.
Nunca usado na história da democracia espanhola, o artigo 155 afirma que, se uma região espanhola não cumprir suas obrigações ou atuar contra o interesse geral da Espanha, o governo central poderá adotar medidas para proteger o interesse geral do país.
"Está em sua mão [Puigdemont] voltar à legalidade e restabelecer a normalidade institucional, como todo mundo está pedindo, ou prolongar um período de instabilidade, tensões e quebra de convivência na Catalunha", discursou Rajoy.
Com seu discurso, Puigdemont conseguiu desagradar a muitos na Catalunha: os separatistas consideraram sua fala imprecisa e branda demais, e os opositores o criticaram por seguir adiante com um processo que pode pôr a democracia espanhola em xeque.
Já Rajoy, que desde 2016 chefia um governo de minoria no Parlamento, parece estar consolidando sua base de poder em Madri, com o apoio inclusive da maior força de oposição, o Partido Socialista, que é contra a separação catalã e apoia o uso do artigo 155 da Constituição.
No discurso no Parlamento, Rajoy afirmou que o direito de decidir, invocado pelos separatistas, "não existe em um país democrático" e "nenhum país do mundo" leva "minimamente a sério" a consulta de 1º de outubro feita pelos catalães, "que não resiste à prova mais elementar" de transparência e neutralidade.
O governante agradeceu pelas várias ofertas de mediação que recebeu, mas lembrou que não existe discussão sobre o que já está estabelecido na Constituição: a indivisibilidade da Espanha e que a soberania reside no conjunto dos espanhóis.
O impasse na Catalunha está sendo considerado a pior crise política da Espanha desde a tentativa frustrada de golpe militar de 1981.
RPR/efe/ots
Breve história da Catalunha
Desejo de independência da Espanha é acalentado pelos catalães há muito tempo. Ao longo dos séculos, região experimentou vários graus de autonomia e repressão.
Foto: picture-alliance/dpa/AP/F. Seco
Antiguidade rica
A Catalunha foi habitada por fenícios, etruscos e gregos, que estiveram nas áreas costeiras de Rosas e Ampúrias (acima). Depois vieram os romanos, que construíram mais assentamentos e infraestrutura. A Catalunha foi uma parte do Império Romano até ser conquistada pelos visigodos, no século 5.
Foto: Caos30
Condados e independência
A Catalunha foi conquistada pelos árabes no ano 711. O rei franco Carlos Magno interrompeu o avanço deles em Tours, no rio Loire, e em 759 o norte da Catalunha se tornou novamente cristão. Em 1137, os condados que compunham a Catalunha iniciaram uma aliança com a Coroa de Aragão.
Foto: picture-alliance/Prisma Archiv
Guerra e perda de território
No século 13, as instituições de autoadministração catalã foram criadas sob o nome Generalitat de Catalunya. Depois da unificação da Coroa de Aragão com a de Castela, em 1476, Aragão pôde manter suas instituições autônomas. No entanto, a revolta catalã – de 1640 a 1659 – fez com que partes da Catalunha fossem cedidas à atual França.
Foto: picture-alliance/Prisma Archivo
Lembrando a derrota
No final da Guerra da Sucessão, Barcelona foi tomada, em 11 de setembro de 1714, pelo rei espanhol Felipe 5°, as instâncias catalãs foram dissolvidas e a autoadministração chegou ao fim. Todos os anos, em 11 de setembro, os catalães fazem uma grande comemoração para lembrar o fim do seu direito à autonomia.
Foto: Getty Images/AFP/L. Gene
República passageira
Após a abdicação do rei Amadeo 1°, da Espanha, a primeira república espanhola foi declarada em fevereiro de 1873. Ela durou apenas um ano. Os partidários da república estavam divididos, com um grupo apoiando uma república centralizada e outros, um sistema federal. A foto mostra Francisco Pi y Maragall, um partidário do federalismo e um dos cinco presidentes da república de curta duração.
Foto: picture-alliance/Prisma Archivo
Tentativa fracassada
A Catalunha tentou estabelecer um novo Estado dentro da república espanhola, mas isso apenas exacerbou as diferenças entre os republicanos e os enfraqueceu. Em 1874, a monarquia e a Casa de Bourbon, liderada pelo rei Afonso 12 (foto), retomaram o poder.
Foto: picture-alliance/Quagga Illustrations
Direitos de autonomia
Entre 1923 e 1930, o general Primo de Rivera liderou uma ditadura – com o apoio da monarquia, do Exército e da Igreja. A Catalunha se tornou um centro de oposição e resistência. Após o fim do regime, o político Francesc Macia (foto) conseguiu impor direitos importantes de autonomia para a Catalunha.
Fim da liberdade
Na Segunda República Espanhola, os legisladores catalães trabalharam no Estatuto de Autonomia da Catalunha, aprovado pelo Parlamento espanhol em 1932. Francesc Macia foi eleito presidente da Generalitat de Catalunha pelo Parlamento catalão. No entanto, a vitória de Franco no fim da Guerra Civil Espanhola (1936 a 1939) acabou com tudo isso.
Foto: picture-alliance/AP Photo
Opressão
O ditador Francisco Franco governou com mão de ferro. Partidos políticos foram proibidos, e a língua e a cultura catalãs, reprimidas.
Foto: picture alliance/AP Photo
Novo estatuto de autonomia
Após as primeiras eleições parlamentares que se seguiram ao fim da ditadura de Franco, a Generalitat da Catalunha foi provisoriamente restaurada. Sob a Constituição democrática espanhola de 1978, a Catalunha recebeu um novo estatuto de autonomia, apenas um ano depois.
O novo estatuto de autonomia reconheceu a autonomia da Catalunha e a importância da língua catalã. Em comparação com o estatuto de 1932, ele apresentou avanços nos campos da cultura e educação, mas restrições no âmbito da Justiça. A foto é de Jordi Pujol, que foi por longo tempo chefe de governo da Catalunha depois da ditadura.
Foto: Jose Gayarre
Anseio por independência
O desejo por independência da Espanha se tornou mais forte nos últimos anos. Em 2006, a Catalunha recebeu um novo estatuto, que ampliou ainda mais os poderes do governo catalão. No entanto, eles são perdidos após uma queixa levada pelo conservador Partido Popular ao Tribunal Constitucional espanhol.
Foto: Reuters/A.Gea
Primeiro referendo
Um referendo sobre a independência estava previsto para 9 de novembro de 2014. A primeira questão era "você quer que a Catalunha se torne um Estado?" No caso de uma resposta afirmativa, a segunda pergunta era "você quer que esse Estado seja independente?" No entanto, o Tribunal Constitucional suspendeu a votação.
Foto: Reuters/G. Nacarino
Luta de titãs
Desde janeiro de 2016, Carles Puigdemont é o presidente do governo catalão. Ele deu continuidade ao curso separatista de seu antecessor, Artur Mas, e convocou um novo referendo para 1° de outubro de 2017. O primeiro-ministro espanhol, Mariano Rajoy, disse que a consulta é inconstitucional.