Mais de 200 investidores pedem ações em defesa da Amazônia
19 de setembro de 2019
Em declaração conjunta, investidores pedem que empresas adotem medidas para impedir desmatamento, alertando que colapso do ecossistema traria "perturbações graves ao setor agrário e a outras atividades econômicas".
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Um grupo de mais de 200 investidores institucionais de diversos países assinou uma declaração exigindo que empresas tomem ações concretas para impedir a destruição da Floresta Amazônica e alertando para os efeitos econômicos de um colapso do ecossistema na região.
A ONG Ceres, que divulgou o documento nesta quarta-feira (18/09), afirmou em nota que 230 gestores de investimentos, responsáveis pela administração de 16,2 trilhões de dólares, requisitam com urgência a empresas que redobrem seus esforços para "demostrar compromisso claro de eliminar o desmatamento no âmbito de suas operações e cadeias de abastecimento".
Os signatários incluem investidores como os departamentos de gestão de ativos dos bancos HSBC, BNP Paribas e Deka e fundos de pensão públicos como o CalPERS, da Califórnia, segundo a nota da Ceres. A organização, sediada em Boston, visa promover a sustentabilidade entre os investidores.
"É com grande preocupação que acompanhamos a crescente crise do desmatamento e dos incêndios florestais no Brasil e na Bolívia. Como investidores, que têm o dever fiduciário de agir no melhor interesse de longo prazo de nossos beneficiários, reconhecemos o papel crucial que as florestas tropicais têm no combate às mudanças climáticas, na proteção da biodiversidade e na garantia dos serviços ecossistêmicos", diz a declaração.
"O desmatamento na região poderia, potencialmente, levar todo o ecossistema perigosamente a um ponto de inflexão, após o qual a floresta tropical não estará apta a se manter, se tonando gradualmente um sistema semelhante às savanas, bem mais seco, sem biodiversidade e armazenando quantidades significativamente menores de carbono."
"Isso causaria perturbações graves ao setor agrário e a outras atividades econômicas, com a redução das chuvas e o aumento das temperaturas no longo prazo", diz o documento.
A declaração pede que as empresas implementem uma "política antidesmatamento" que inclua "comprometimentos quantificáveis" e avalie e torne públicos os riscos que as cadeias de abastecimento impõem às florestas.
Os investidores também pedem um sistema de monitoramento dos parceiros nessas cadeias e relatos anuais sobre a "exposição e gerenciamento do risco de desmatamento".
Jan Erik Saugestad, CEO da gestora de ativos norueguesa Storebrand, uma das signatárias da declaração, avalia que os "significativos impactos econômicos negativos associados a essas questões representam um risco que os investidores não podem ignorar".
A declaração não diz explicitamente que os signatários estão ameaçando retirar investimentos de empresas, mas aumenta a pressão que as corporações internacionais e os investidores vêm exercendo sobre parceiros que operam na Amazônia.
Dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) afirmam que apenas no mês de agosto, a Amazônia perdeu 1.698 quilômetros quadrados de cobertura vegetal, área 222% maior do que a desmatada no mesmo mês de 2018, que foi de 526 quilômetros quadrados.
A área desflorestada da Amazônia nos oito primeiros meses de 2019 chegou a 6.404 quilômetros quadrados, número 92% superior ao registrado no mesmo período do ano anterior (3.337 quilômetros quadrados), segundo dados obtidos pelo Deter, levantamento rápido de alertas de evidências de alteração da cobertura florestal na Amazônia, feito pelo Inpe.
Focos de incêndio na Floresta Amazônica atingem seu pior agosto em quase uma década. Em Rondônia, fogo é a última etapa de uma cadeia criminosa que inclui invasão de terras, extração ilegal de madeira e desmatamento.
Foto: Imago Images/Agencia EFE/J. Alves
Chamas em agosto
Com 30.901 focos de queimadas registrados por satélites no bioma Amazônia, o mês de agosto de 2019 superou o registrado no mesmo mês em todos os anos anteriores até 2010, quando o número chegou a 45.018. Os dados são do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que monitora as queimadas desde 1998. O recorde para o mês de agosto ainda é de 2007, com 63.764 focos.
Foto: Flávio Forner
Prejuízos à saúde
Na região de Porto Velho, capital de Rondônia, a fumaça das queimadas causa problemas sérios de saúde. Em um estudo realizado no estado, a Fiocruz analisou dados de 1998 a 2005 e concluiu que o número de mortes de idosos acima de 65 anos por doenças respiratórias aumenta durante os meses de queimadas. Até 80% das mortes estão relacionadas aos incêndios florestais.
Foto: Flávio Forner
O futuro da floresta nacional
A Floresta Nacional do Bom Futuro, perto de Porto Velho, foi criada em 1988 para proteger originalmente 280 mil hectares da Floresta Amazônica. Em 2010, um decreto reduziu a área para 98 mil hectares por conta da ocupação da região. A Flona (floresta nacional) é uma das mais ameaçadas no bioma, com histórico de invasões, desmatamento e queimadas.
Foto: Flávio Forner
Plantão na floresta
Brigadistas do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) ficam de plantão na região da Floresta Nacional do Bom Futuro 24 horas por dia na época das queimadas, de julho a outubro. Eles fazem rondas diárias para evitar crimes e, quando identificam fogo, usam bombas costais e abafador para apagar as chamas.
Foto: Flávio Forner
Solo mais pobre
O primeiro efeito da queimada é a perda de nutrientes e da biota do solo, alerta o biólogo Marcelo Ferronato, da ONG Ecoporé. Com o passar dos anos, os nutrientes que estavam ali sendo depositados pelas florestas desaparecem, como folhas e galhos. "O solo vai se enfraquecendo, a área começa a ser degradada, a produtividade cai, e novas áreas são abertas, alimentando o ciclo do desmatamento."
Foto: Flávio Forner
Lote ilegal
O capim cresce na área já desmatada dentro da Floresta Nacional do Bom Futuro. A estaca fixada no chão serve para demarcar o lote que, mais para frente, será vendido de forma ilegal. A área onde o crime ocorreu fica a menos de um quilômetro da estrada de terra que corta a unidade de conservação.
Foto: DW/N. Pontes
Desmatamento antes do fogo
Esta clareira na Floresta Nacional do Bom Futuro foi aberta cinco dias antes de a equipe da DW Brasil visitar o local. Algumas árvores mais antigas ainda estão de pé, como uma da espécie tauari de 200 anos, de cerca de 40 metros de altura, que também é um porta-sementes. Segundo brigadistas, os criminosos esperam a mata derrubada secar por alguns dias antes de colocar fogo.
Foto: Flávio Forner
Reflorestamento em risco
Alguns projetos de compensação ambiental de outros empreendimentos são revertidos para a Floresta Nacional do Bom Futuro. Na foto, árvores nativas da Amazônia crescem numa área do tamanho de 70 campos de futebol que foi desmatada. Se elas sobreviverem aos crimes cometidos na região, precisarão de 50 anos para voltar a ganhar o aspecto de uma floresta densa.
Foto: Flávio Forner
Pressão em terras indígenas
No estado de Rondônia, 21 reservas são destinadas a povos indígenas. A Terra Indígena Uru-Eu-Wau-Wau, a cerca de 300 quilômetros de Porto Velho, tem sete aldeias e comunidades que escolheram viver isoladas na Floresta Amazônica. Criado em 1985, o território de uso exclusivo dos indígenas sofre ameaças constantes de madeireiros e grileiros.
Foto: Flávio Forner
Preocupação com a floresta
Segundo os indígenas, a destruição da floresta é muito rápida. Eles acreditam que a "empreitada" para desmatar e queimar a mata, que conta com entre 10 e 15 pessoas, seja custeada por quem tem muito dinheiro. Depois de tirar a madeira, os criminosos queimam a área e jogam sementes de capim, conta Taroba Uru-Eu-Wau-Wau (foto).
Foto: Flávio Forner
Desmatamento e pastagem
Segundo estudos de pesquisadores da Universidade Federal de Rondônia (Unir), o desmatamento ilegal serve para ampliar áreas de pastagem. Dados oficiais estimam que o rebanho no estado ultrapasse 14 milhões de cabeças. Aos poucos, as pastagens têm se convertido em plantações, como de soja, afirma a pesquisadora Maria Madalena Cavalcante, da Unir.