Maxim Gorki, um escritor sem medo de palavras fortes
28 de março de 2018
A mãe, Os veranistas ou A vida de Klim Samgin contam entre os romances mais famosos de Maxim Gorki; peças de teatro como O submundo, Pequeno-burgueses ou Os filhos do Sol, são encenadas em palcos do mundo inteiro.
Alexei Maximovich Peshkov (1868-1936) era de origem pobre, autodidata e escrevia sob o pseudônimo que, em russo, significa "o amargo". Suas incontáveis narrativas descrevem a vida na Rússia pré e pós-revolucionária. "Gorki é cheio de contradições e clichês", afirma Armin Knigge, professor emérito de filologia eslava. "Não é um clássico como Dostoiévski, mas, ainda sim, um grande da literatura mundial."
Knigge não é apenas um conhecedor, mas um apaixonado por Gorki. O que o fascina em particular é a riqueza linguística do autor, cujo trabalho contempla como se fosse uma "galeria de retratos dos russos". Gorki, o admirador do ser humano, o observador astuto e preciso, com um talento ficcional no mesmo nível de Thomas Mann: O Gorki desconhecido (Der unbekannte Gorki) é o nome do blog que Knigge dedica ao russo desde 2006.
Poeta da Revolução?
Os 150 anos de nascimento de Gorki e a recente eleição presidencial na Rússia coincidiram quase exatamente por estes dias. Para Knigge, não é coincidência, pois o "previsível resultado de 77% para Putin e a encenação eleitoral de caráter folclórico" desencadearam as velhas perguntas de sempre.
"Por que, um século após a queda dos czares, os russos ainda pensam e sentem de forma monarquista e patriarcal? Por que 'liberdade' e 'democracia' são, na Rússia de hoje, uma espécie de palavrão?", indaga em seu blog.
Certo está que a verdadeira imagem de Gorki se forma nos olhos de quem vê. O autor de O canto do petrel, de 1901, escrito após uma demonstração estudantil brutalmente reprimida em São Petersburgo, seria mesmo o "Poeta da Revolução"? Seria coincidência o fato de a tempestade, anunciada pelo pássaro do título com "o poder da ira, a chama da paixão e a certeza da vitória", ter sido recitada em reuniões revolucionárias?
Escritor proletário
A Maxim Gorki, nascido em 28 de março de 1868, nunca faltaram palavras fortes. Não em sua obra literária – quer nas primeiras peças teatrais de crítica social, que o tornaram tão popular, quer no romance A mãe, de 1907, que se tornaria um clássico da literatura soviética, pois o herói é um operário de fábrica e, portanto, um verdadeiro proletário. E tampouco em sua amizade com o herói da Revolução Russa Vladimir Lênin.
Apreciação literária e apropriação política se confundem no Império Soviético. Em 22 de outubro de 1927, quando a Academia Comunista decidiu reconhecer Gorki como "escritor proletário", abriu-se para o autor uma era de honrarias: ele recebeu a Ordem de Lênin, maior honra da União Soviética, tornou-se membro do Comitê Central do Partido Comunista.
Seu aniversário de 60 anos foi festejado em todo o país, e numerosas instituições, batizadas em sua homenagem. Até sua cidade natal, Níjni Novgorod, mudou de nome para Gorki em 1932, permanecendo assim até 1990.
Honras estatais ambivalentes
As atenções se concentram sobretudo naqueles elementos da obra de Gorki que se enquadram nos cânones do realismo soviético. Será que A mãe serve como modelo para a nova literatura soviética?
"A elevação ao posto de poeta do Estado soviético prejudicou terrivelmente Gorki e sua reputação ", avalia Knigge. "O estado soviético fez dele um soldado partidário. Maxim Gorki, porém, jamais foi stalinista!" Certo está que, após a Revolução, o relacionamento de Gorki com os poderosos fica cheio de contradições.
Em seus Pensamentos anacrônicos sobre cultura e revolução, publicados no jornal Novaia Jizn entre 1917 e 1918, por exemplo, ele ainda se posiciona decididamente contra os horrores da Revolução de Outubro e critica Lênin. Mais tarde, porém, dá uma guinada em direção à linha bolchevique: com sua reportagem amenizada sobre o Gulag no Mar Branco, como lugar onde "vasos de flores são colocados nas janelas das barracas", Gorki se revela ingênuo.
Ao fim, torna-se uma figura de proa de Josef Stalin e objeto de um desmedido culto à personalidade. Gorki teve que passar muitos anos no exterior, antes de morrer em Moscou em 18 de junho de 1936. Rumores sobre sua morte se proliferam até hoje: teria Stalin mandado assassiná-lo?
Seja como for, o Grande Terror – no qual, estima-se, cerca de 1,5 milhão morreram por ordens de Stalin – ele não presenciou. Quando a União Soviética entrou em colapso em 1991, o escritor do Estado também caiu do pedestal. E hoje não há dúvidas: há que se separar o escritor Gorki o máximo possível do político Gorki.
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