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Mercosul e União Europeia anunciam acordo de livre comércio

Publicado 6 de dezembro de 2024Última atualização 6 de dezembro de 2024

Após 25 anos de negociações, blocos concluem texto final do acordo. Líder da UE afirma que pacto é "vitória para Europa". Ratificação deve, porém, encontrar resistência na Europa.

Javier Milei, Luis Lacalle Pou, Ursula von der Leyen, Lula e Santiago Peña
Texto final do acordo foi anunciado em encontro do Mercosul em MontevidéuFoto: EITAN ABRAMOVICH/AFP/Getty Images

O acordo de livre comércio entre o Mercosul e a União Europeia (UE) foi anunciado oficialmente nesta sexta-feira (06/12), após mais de 25 anos de negociações.

O anúncio foi feito durante o encontro do bloco sul-americano em Montevidéu. Estavam presentes os presidentes do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, da Argentina, Javier Milei, do Uruguai, Luis Lacalle Pou, e do Paraguai, Santiago Peña – os quatro países que integram o Mercosul –, além da chefe da Comissão Europeia, a alemã Ursula von der Leyen.

Em entrevista coletiva, Von der Leyen afirmou que o acordo com Mercosul é "vitória para Europa".

O acordo tem como objetivo criar uma das maiores zonas de livre comércio do mundo, abrangendo mais de 700 milhões de pessoas e quase 25% do Produto Interno Bruto (PIB) global. A aliança prevê a redução ou eliminação de tarifas e barreiras comerciais, facilitando a exportação de produtos de ambos os lados.

As negociações para o acordo de livre comércio foram iniciadas em 1999 e paralisadas depois de um acordo inicial alcançado em 2019. No entanto, a medida não havia saído do papel por pressão imposta por agricultores europeus.

Parte dos países da União Europeia, em destaque a França, não é favorável a uma abertura de mercado ao Mercosul. A Comissão Europeia, braço executivo do bloco e quem cuida da política comercial da região, fez um esforço para a consolidação de um texto final do acordo.  

"Este é um jogo econômico de ganha-ganha", disse Von der Leyen, assegurando aos europeus que eles também irão ganhar com a negociação, que vai representar "mais trabalhos e oportunidades".

"Estamos enviando uma clara mensagem ao mundo: num mundo em confrontação, mostramos que democracias podem vigorar. Isso é uma necessidade política, não apenas econômica."

Ursula von der Leyen terá o trabalho agora de convencer os países membros da UE a ratificar o acordoFoto: Matilde Campodonico/AP Photo/picture alliance

Reações

Mais cedo, o presidente francês, Emmanuel Macron, disse à Von der Leyen que o acordo é "inaceitável" nos termos em que está e que a França não pode aprová-lo. "Continuaremos a defender incansavelmente nossa soberania agrícola", disse a presidência francesa em uma mensagem publicada na rede social X.

A ministra interina francesa do Comércio Exterior, Sophie Primas, disse que a França lutará "em todas as etapas" do processo contra a aplicação do acordo, e destacou que o anúncio do pacto em Montevidéu não significa que ele tenha sido assinado. "A luta ainda não terminou", enfatizou em mensagem publicada sua conta no X.

A França argumenta que o acordo permitirá a entrada na UE de produtos que não atendem aos padrões europeus de saúde ou ambientais, e que isso representa uma concorrência desleal que prejudicará seus agricultores e criadores de gado. O governo francês também critica o fato de o pacto não ter integrado o Acordo de Paris sobre mudanças climáticas.

Na mesma linha, "o governo italiano considera que não existem condições para apoiar o texto atual". Roma exige "proteção adequada (...) para o setor agrícola", disseram fontes oficiais.

A Polônia, a Áustria e a Holanda também manifestaram dúvida quanto a um pacto comercial com o Mercosul.

Do outro lado, o chanceler federal alemão, Olaf Scholz, celebrou o acordo e afirmou que "um importante passo para o pacto" foi superado. "Agora, um mercado livre poderá ser criado para mais de 700 milhões de pessoas, como mais crescimento e competitividade", escreveu em na sua conta no X.

O presidente Lula comemorou a celebração do acordo. Em seu discurso na reunião de Cúpula do Mercosul, disse: "Estamos criando uma das maiores áreas de livre comércio do mundo, reunindo mais de 700 milhões de pessoas. Nossas economias juntas representam um PIB de 22 trilhões de dólares."

Em comunicado, o Ministério das Relações Exteriores do Brasil informou que, nos últimos dois anos, as duas partes realizaram sete rodadas de negociações, entre outras reuniões, e "comprometeram-se a revisar as matérias relevantes".

"À luz do progresso alcançado desde 2023, o Acordo de Parceria entre o Mercosul e a União Europeia está agora pronto para revisão legal e tradução. Ambos os blocos estão determinados para conduzir tais atividades nos próximos meses, com vistas à futura assinatura do acordo."

Próximos passos

Para entrar em vigor, o documento precisa ser ratificado pelos parlamentos dos 31 países envolvidos. Portanto, é provável que a resistência de alguns países do bloco europeu ao acordo ainda atravesse o processo.

"Agora estou ansiosa para discuti-lo com os países europeus", acrescentou Von der Leyen, referindo-se à necessidade de que esse compromisso seja endossado pela maioria dos membros da UE para entrar em vigor.

A Comissão Europeia, e não os governos, é responsável pela negociação de acordos comerciais. No entanto, França e a Itália disseram que, embora as partes tenham concordado com um texto, o processo de ratificação enfrentará um muro de resistência.

A questão central é a proteção do setor agrícola, que considera que terá de competir em condições inferiores com os países sul-americanos.

"É muito importante que o mundo se abra para nós", disse o presidente uruguaio, Luis Lacalle Pou, cujo país ocupa a presidência temporária do Mercosul, falando do acordo como "uma oportunidade" não apenas para o comércio.

Pressionados pelo Brasil, mas também pela Alemanha e Espanha, os dois blocos concentraram esforços nas últimas semanas para tentar chegar a um acordo sobre o texto antes da chegada de Donald Trump e sua guerra tarifária à Casa Branca, em janeiro.

"Ouvimos as preocupações de nossos agricultores e agimos de acordo. Esse acordo inclui salvaguardas robustas para proteger nossos meios de subsistência", disse Von der Leyen em uma declaração à imprensa ao lado dos líderes do Mercosul.

Von der Leyen afirmou que o tratado foi o "maior acordo já feito" sobre a proteção de denominações de origem e enfatizou que os padrões europeus de saúde e alimentos "permanecem intocáveis". Ela acrescentou que o acordo economizará às empresas europeias 4 bilhões de euros por ano em tarifas e abrirá oportunidades de emprego e crescimento em ambos os blocos.

A Europa espera, com o pacto comercial, exportar mais carros, máquinas e medicamentos, fazendo frente à competição chinesa na região. O Mercosul espera vender mais produtos como soja, carne e mel para a Europa.

Outras reações

O Greenpeace disse em uma declaração em Bruxelas que um acordo de livre comércio entre a UE e o Mercosul seria "tóxico".

"Vinte e cinco anos de negociações secretas a portas fechadas (...) resultaram hoje em um entendimento que aumentará o comércio de carne, pesticidas e plásticos, com impactos desastrosos sobre a Amazônia, o clima e os direitos humanos", disse Lis Cunha, porta-voz da ONG. "Pedimos a todos os políticos da Europa e dos países do Mercosul que ouçam a ampla oposição pública e votem contra ele", concluiu.

A Federação das Indústrias da Alemanha (BDI) saudou o acordo e afirmou que ele trará "um impulso de crescimento urgentemente necessário para a economia alemã e europeia". Os setores automotivo e químico alemães serão dois dos grandes beneficiários com a eliminação de tarifas.

sf/cn (AP, EFE, ots)