Merkel defende acordo sobre refugiados no Bundestag
4 de julho de 2018
Após pacto com conservadores bávaros que evitou ruptura de coalizão e em meio à resistência dos social-democratas, chanceler federal alemã defende posição do governo em relação à questão migratória.
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Após a questão migratória ameaçar rachar a coalizão de governo alemã – o que foi evitado após intensas negociações entre a União Democrata Cristã (CDU) e seus tradicionais aliados da União Social Cristã (CSU) –, a chanceler federal Angela Merkel defendeu a posição do governo sobre o tema no Bundestag (Parlamento alemão) nesta quarta-feira (04/07).
Merkel discursou por ocasião de um debate sobre o orçamento federal. As discussões orçamentárias costumam servir de oportunidade para o governo oferecer justificativas para suas políticas, com enfrentamento direto da oposição. Desta vez, a imigração ganhou destaque.
Nesta segunda-feira, Merkel, da CDU, e seu ministro do Interior e líder da CSU, Horst Seehofer, chegaram a um acordo que prevê que requerentes de refúgio que já foram registrados em outros países europeus não sejam acolhidos pela Alemanha. Eles ficariam na fronteira – por exemplo com a Áustria – nos chamados centros de trânsito, que seriam criados para esse fim.
Dois dias depois do pacto entre CDU e CSU e em meio a novas tensões causadas pela resistência ao plano do governo para a imigração por parte do Partido Social-Democrata (SPD) – terceiro membro da coalizão governista –, Merkel saiu em defesa das políticas adotadas por seu governo, afirmando que o futuro de seu país está atrelado ao da Europa.
A chanceler ressaltou que a forma como a União Europeia (UE) lidar com a imigração será determinante para a sobrevivência do bloco. São necessárias respostas viáveis, realistas e solidárias para lidar com o problema.
"Deve haver mais organização em todas as formas de migração, para que as pessoas tenham a sensação de que a lei e a ordem estão sendo aplicadas", disse.
Numa cúpula da UE em Bruxelas na semana passada, os líderes dos países do bloco travaram extensas discussões sobre migração e, apesar dos diferentes interesses em jogo, concordaram que nenhum Estado-membro deve ter de lidar isoladamente com o problema. "Esta é uma tarefa que cabe a todos", reforçou Merkel no Bundestag.
A chanceler federal não fugiu de uma questão central do recente embate com Seehofer que quase resultou na ruptura da coalizão governista. Num aceno aos seus parceiros da sigla conservadora bávara, ela disse que a movimentação de migrantes entre os países da Europa deve ser controlada.
"Não é possível que os próprios refugiados decidam onde seus pedidos de asilo serão processados", afirmou, mencionando um acordo atingido com a Grécia, que possibilitará que a Alemanha envie migrantes de volta ao país no Mediterrâneo. Ela disse ainda que Seehofer se reunirá com autoridades de outras nações para buscar acordos semelhantes.
Resistência dos social-democratas
A implementação da decisão acordada por CDU e CSU ainda depende do terceiro membro da coalizão, o SPD, que já deixou claras as suas ressalvas em relação ao plano de Seehofer e Merkel, principalmente no que diz respeito à criação dos chamados centros de trânsito de migrantes na fronteira.
Em 2015, no auge da crise dos refugiados, o SPD já havia claramente rejeitado a criação das então chamadas zonas de trânsito para refugiados nas fronteiras da Alemanha – e conseguira impor seu ponto de vista, argumentando que, na prática, estariam sendo criados centros de detenção em massa.
A retomada dessa mesma ideia agora é vista como provocação pelos social-democratas. Eles alegam que CDU e CSU estariam desviando a atenção da sua própria briga interna ao provocar um desentendimento com o SPD, que, para continuar no governo, teria de aceitar algo que na verdade rejeita. E, se o governo ruir, a culpa passaria a ser do SPD, que, para piorar ainda mais sua situação, não alcança nem 20% dos votos nas atuais pesquisas eleitorais.
Alerta a Trump
No Bundestag, Merkel também abordou as tensões comerciais entre Europa e Estados Unidos. Ela alertou o presidente americano, Donald Trump, de que sua ameaça de aumentar as tarifas sobre as importações de automóveis europeus para os EUA poderá resultar de fato numa guerra comercial.
A chanceler federal ressaltou que os dois lados já estão em um "conflito comercial", gerado após a decisão de Trump de impor tarifas sobre o aço e alumínio europeus, o que provocou reação semelhante por parte de Bruxelas.
O americano reclama que a UE e em particular a Alemanha possuem grandes superávits comerciais com os EUA. Merkel diz que essa análise é falha, uma vez que se baseia apenas nos bens, não incluindo os serviços.
"Se incluirmos serviços, como os serviços digitais, teremos uma balança comercial completamente diferente em relação aos EUA, demonstrando um superávit americano em relação à UE", observou, acrescentando que "é quase antiquado calcular apenas os bens e não incluir os serviços".
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Eles desafiaram Merkel - ou pelo menos tentaram
Ao longo de sua carreira, chanceler alemã deixou para trás diversos oponentes, inclusive seu mentor político, Helmut Kohl. Mas ele não foi o único homem no caminho de Merkel.
Foto: AP
Helmut Kohl, antigo mentor
O que dizem esses olhos? Gratidão? Afeição? Ou um sentimento de: "Eu nunca vou te perdoar!" Em meio ao caso de caixa 2 da União Democrata Cristã (CDU), em 1999, a então secretária-geral Merkel instou o partido a "entrar na luta mesmo sem seu antigo cavalo de batalha". Isso selou fim político do então presidente honorário da CDU e mentor político de Merkel, Helmut Kohl, aqui em reunião de 2012.
Foto: Reuters
Seu chefe no Leste: Lothar de Maizière
Dizer que Angela Merkel passou para trás o último premiê da antiga Alemanha Oriental seria exagero. Mas Lothar de Maizière teve que assistir ao desmoronamento de seu antigo país enquanto sua jovem vice-porta-voz Angela Merkel acompanhava as conversações para o Tratado de Reunificação, apostando assim na carta certa.
Foto: cc-by-sa/Bundesarchiv
Roland Koch, mais à direita
Alguns nostálgicos sonhadores na coligação CDU/CSU associam o devaneio a um sério senhor de Hessen: o ex-governador Roland Koch era visto como uma figura de orientação conservadora na CDU. Acredita-se que ele tenha pertencido ao círculo chamado "Pacto Andino" (combinado num voo para o Chile), que se tornou uma panelinha dentro da União CDU/CSU. Merkel escapou ilesa.
Foto: picture-alliance/dpa
Friedrich Merz, futuro interrompido
Sim, o Sr. Merz. Ele tinha uma carreira brilhante pela frente: como ministro das Finanças, com certeza, talvez até mesmo como chanceler federal. Um homem de sagacidade afiada, ternos bem ajustados e boas conexões na União CDU/CSU. Merkel, porém, afastou o político da Vestfália, em 2001, da liderança da bancada parlamentar da aliança de partidos conservadores.
Foto: picture-alliance/dpa/B. von Jutrczenka
Norbert Röttgen: demitido
Na foto, o ex-presidente alemão Joachim Gauck (dir.) caminha ao lado de Angela Merkel na residência presidencial em Berlim, Palácio Bellevue. Por trás deles, vê-se o demissionário ministro do Meio Ambiente, Norbert Röttgen. Depois de perder a eleição para governador na Renânia do Norte-Vestfália como candidato da CDU e ter posto a culpa também em sua chefe, Röttgen caiu em desgraça e foi demitido.
Foto: dapd
Gerhard Schröder subestimou Merkel
Quando Schröder perdeu a eleição para Merkel em 2005, ele esperou, inicialmente, que seu Partido Social-Democrata (SPD) recusasse negociações com vista a uma grande coalizão de governo. "Que bom que vocês ainda me chamem de chanceler", bradava Schröder ainda na noite eleitoral, enquanto sua adversária já fazia as contas da aritmética do poder. Dois meses depois, Merkel era eleita chanceler.
Foto: picture-alliance/AP Photo/J. Finck
Arranjo de Poder: Wolfgang Schäuble
Wolfgang Schäuble poderia ter sido alguém perigoso para Merkel. Mas Kohl não transferiu o poder para seu "príncipe-herdeiro". Um atentado que o deixou paraplégico e seu envolvimento no escândalo de doações da CDU em 2000 marcaram o fim de sua carreira como líder partidário e de bancada. Merkel o nomeou ministro das Finanças, mas frustrou suas aspirações ao cargo de chanceler federal.
Foto: picture alliance/AP Photo/M. Meissner
Edmund Stoiber, uma conta em aberto
Atualmente, Edmund Stoiber, ex-governador da Baviera pela União Social Cristã (CSU), pode ser visto em "talk shows" falando veementemente contra a política de refugiados de Merkel. A atual chanceler federal desistiu de sua candidatura nas eleições parlamentares de 2002 em prol de Stoiber, que parece ainda não ter se recuperado da derrota para Schröder. Ele nunca quis ser ministro sob Merkel.
Foto: picture-alliance/U. Baumgarten
Horst Seehofer, o rebelde
Na disputa pelo poder na Baviera, Horst Seehofer abriu o caminho para Markus Söder e aceitou o cargo de ministro do Interior em Berlim, ao lado de sua chefe, Angela Merkel, que ele humilhou publicamente num congresso da CSU em 2015. Quem precisa de inimigos quando se tem tal ministro? O que Seehofer quer? Menos refugiados ou menos Merkel?
Foto: Reuters/H. Hanschke
Era uma vez Martin Schulz
Martin Schulz, ex-presidente do Parlamento Europeu (dir.), perdeu as eleições parlamentares de 2017 como candidato do SPD. A princípio, recusou-se a formar um governo com Merkel; depois, negou-se a formar um governo sem Merkel e, no final, saiu de mãos abanando. Como deputado em Berlim, nada mais lhe resta que assistir à chanceler governar – se Seehofer (c.) deixar.
Foto: Getty Images/C. Koall
Donald Tusk, amizade desbotada
Na foto, Merkel conversa com o presidente do Conselho Europeu, o polonês Donald Tusk (dir.). Ele foi durante muito tempo um importante aliado dos alemães, que também o ajudaram na sua ascensão tardia em Bruxelas. Recentemente, Tusk parece ter procurado distância, frustrando até mesmo tentativas de Merkel com vista a uma solução europeia para crise migratória, de acordo com correspondentes.
Foto: picture-alliance/AP Photo/J. Macdougal
Jens Spahn veio para ficar
Jens Georg Spahn é: político da CDU, deputado federal, ministro alemão da Saúde, conservador – e, segundo escreveu a agência de notícias DPA em 2016, um "oponente da chanceler". Para surpresa de alguns analistas, Merkel decidiu trazer Spahn para seu gabinete. Se a intenção de Merkel foi "controlá-lo", funcionou melhor do que com o ministro do Interior, Horst Seehofer.
Foto: picture-alliance/dpa/M. Kappeler
Alexander Gauland, antigo "correligionário"
O líder da bancada parlamentar da legenda populista de direita AfD, Alexander Gauland, foi um influente membro da CDU até 2013. Há poucas fotos comuns de Gauland e Merkel: não é o tipo de entorno que desperta o interesse da chanceler . Mas quando ele fala no Bundestag, ela às vezes escuta. E ela certamente ouve as vozes advertindo que o caos na União CDU/CSU beneficiou acima de tudo a AfD.