Diferente dos sistemas de governo presidencialistas, como no Brasil, a chanceler federal Angela Merkel pode, teoricamente, governar a Alemanha até o fim da vida. Na Europa, isso não é nenhuma exceção.
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A Constituição alemã não prevê qualquer limite para a duração do cargo de chanceler federal. Nesse ponto, a Alemanha não é nenhuma exceção na Europa, onde somente o presidente francês precisa entregar o posto após dez anos ou dois mandatos consecutivos.
Em sistemas parlamentaristas, como na Alemanha, o chefe de governo – chanceler federal ou governador – não é eleito diretamente pelo povo. Isso cabe ao Parlamento. Assim, ao votar nas eleições parlamentares, o eleitor tem influência sobre quem estará à frente do governo após as eleições.
Segundo Frank Decker, professor de Ciências Políticas da Universidade de Bonn, a inexistência de um prazo limite para o exercício da Chancelaria Federal em Berlim não resulta em nenhum problema: "Nos sistemas de governo parlamentaristas, essa questão se regula em certa medida por si mesma, de forma que um limite temporal não se faz necessário."
Especificamente, um chefe de governo pode ser derrubado por um voto de desconfiança. Como aconteceu em 1982, quando o ex-chanceler federal do Partido Social-Democrata (SPD), Helmut Schmidt, teve que deixar o cargo. Ele foi sucedido por Helmut Kohl, da União Democrata Cristã (CDU).
Longos mandatos não são déficit democrático
Em alguns países europeus, esse sistema levou a mudanças relativamente frequentes: nos últimos 70 anos, por exemplo, a Itália já conheceu desde o fim da Segunda Guerra mais de 20 chefes de governo; o Reino Unido, 15. O fato de na Alemanha um chanceler federal – Helmut Kohl – ter permanecido 16 anos e agora Angela Merkel consiga governar por semelhante período de tempo, caso seja reeleita, são exceções na Europa.
Um chefe de governo que não quer largar o poder – isso corresponde à ideia básica de uma democracia? "À primeira vista, parece uma pergunta pertinente", afirmou o cientista político Frank Decker. "Uma vez, Helmut Kohl deu uma boa resposta. Ao ser indagado que ele já estava perto de alcançar o antigo chanceler imperial Bismarck, ele disse: 'Diferentemente de Bismarck, eu sempre fui reeleito.'"
Segundo o cientista político, na Alemanha e em outros sistemas parlamentaristas de governo, as longas permanências no cargo resultaram, basicamente, do fato de o chefe de governo ter sido reafirmado pelo povo após cada período legislativo.
EUA e Brasil: máximo de dois termos
Em sistemas presidencialistas, por exemplo, no continente americano, longos períodos à frente do governo não existem. Ali, o chefe de Estado é escolhido diretamente pelo povo, independentemente do Parlamento – e, na maioria dos casos, para dois mandatos consecutivos, como no Brasil ou nos EUA.
Assim, há um limite de oito anos no poder. De acordo com Frank Decker, isso se deve simplesmente a uma "coincidência histórica" nos EUA. "Após dois mandatos, o primeiro presidente americano, George Washington, declarou por si mesmo: eu vou parar. E todos os seus demais sucessores se ativeram a esse exemplo." Durante a Segunda Guerra Mundial, Franklin D. Roosevelt quebrou essa tradição ao se candidatar, em 1940, a um terceiro mandato. Posteriormente, estabeleceu-se um limite de oito anos para o cargo de presidente na Constituição americana.
Na Alemanha, também há vozes que defendam um limite temporal para a permanência do chefe de governo. O cientista político Frank-Rudolf Korte, da Universidade Duisburg-Essen, sustenta que Merkel deveria recusar uma nova candidatura e que, no geral, um chanceler federal possa permanecer somente dois períodos legislativos no cargo: "Os partidos e os eleitores seriam poupados de candidatos exaustos ou lutas sucessórias indignas", escreveu Korte na revista Focus.
O momento certo de partir
Frank Decker também é da opinião que um político deva reconhecer, apesar das possibilidades aparentemente ilimitadas, que, a certa altura, é hora de partir: "Em algum momento, os eleitores vão estar fartos de ver aquela pessoa." Decker disse acreditar que o partido do chefe de governo agiria muito rapidamente quando tal cansaço se tornasse perceptível na população: "Se a CDU, por exemplo, notasse que a Sra. Merkel cometeu um erro em algum lugar ou que com ela não se venceria a eleição, então ela sairia rapidamente. Ela seria afastada pelos próprios correligionários."
Frank Decker presume, no entanto, que no caso de Angela Merkel, a situação vai ser diferente: "Provavelmente, ela vai refletir, em meados do período legislativo, ou seja, em 2019, em abrir o caminho para um sucessor ou sucessora de seu partido."
Merkel seria, assim, a primeira chefe de governo alemã a deixar voluntariamente o cargo. Para tal, contudo, ela terá que vencer, em 2017, a sua quarta eleição parlamentar como candidata à Chancelaria Federal.
Merkel a caminho do quarto mandato
Quem poderia pensar? Vista como líder interina de seu partido após saída de Helmut Kohl, Merkel chefia a CDU desde 2000 e, há 11 anos, a Chancelaria Federal. Confira momentos de uma carreira que ainda não chegou ao fim.
Foto: Getty Images/C. Koall
Primeiro juramento
"Eu quero servir a Alemanha". A promessa foi feita por Angela Merkel no dia 22 de novembro de 2005, quando tomou posse como chanceler. Depois da vitória apertada nas eleições gerais, ela se tornou a primeira mulher e a primeira alemã da antiga parte oriental a ocupar o cargo. Merkel se tornou a chefe de governo, comandado pela grande coalizão formada entre os partidos CDU, CSU e SPD.
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Quem tem medo do cão de Putin?
Merkel é conhecida por sempre ser racional e se manter calma. O presidente da Rússia, Vladimir Putin, quis aparentemente testar os nervos da chanceler quando a recebeu na residência presidencial em Sochi, em 2007. Putin conseguiu revelar o ponto fraco de Merkel: ela tem medo de cães. Isso não impediu que o presidente russo deixasse o labrador Koni farejar os sapatos da chanceler.
Foto: picture-alliance/dpa/D. Astakhov
Resgate financeiro
Em situações de crise, Merkel age com frieza. Quando os mercados financeiros entraram em colapso em 2008 e ameaçaram prejudicar a economia alemã, a chanceler se empenhou na proteção do euro e na criação de fundos de resgate para as economias mais fracas do bloco europeu. Ela se destacou como eficiente gestora de crises, mas não escapou de receber críticas de países como Grécia e Espanha.
Foto: picture-alliance/epa/H. Villalobos
Caminho para o segundo mandato
Apesar do pior desempenho da aliança conservadora na história, Merkel venceu as eleições de 27 de setembro de 2009. Depois de se aliar ao Partido Social-Democrata (SPD), a chanceler estava pronta para iniciar o segundo mandato ao lado de outro parceiro, o Partido Liberal Democrático (FDP).
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Resposta rápida
Merkel que, como física, é conhecida por pensar de forma objetiva, não previu a catástrofe nuclear de Fukushima, no Japão. Defensora da política nuclear na Alemanha, Merkel mudou de posição em tempo recorde. A extensão do prazo de funcionamento das usinas foi suspenso e a Alemanha iniciou o processo de colocar fim ao uso da energia nuclear.
Foto: Getty Images/G. Bergmann
O homem ao seu lado
Quem o reconheceria? Quem conhece sua voz? Há dez anos, o marido de Merkel, Joachim Sauer, professor de Química da Universidade Humboldt, em Berlim, se mantém discreto. Eles estão casados desde 1998.
Foto: picture alliance/Infophoto
Amizade em crise
As escutas de comunicações de políticos alemães por parte da Agência de Segurança Nacional (NSA), dos Estados Unidos, abalaram as relações da Alemanha com a Casa Branca. Até o celular de Merkel foi alvo de espionagem. Uma frase da chanceler ficou famosa: "Não é aceitável que países amigos espiem uns aos outros".
Foto: Reuters/F. Bensch
O paciente grego
O clube de fãs de Merkel é extenso, mas na Grécia é provavelmente menor. A hostilidade contra a chanceler alemã nunca foi tão grande como em 2014, no auge da crise da dívida grega. A imagem de velha inimiga ressurgiu, mas Merkel se manteve firme em relação à política de austeridade que previu cortes e reformas a serem cumpridos por Atenas.
Foto: picture-alliance/epa/S. Pantzartzi
Emotiva, às vezes
Tipicamente reservada, Merkel quebrou os protocolos durante a final da Copa do Mundo de 2014 no Rio de Janeiro. A chanceler federal alemã celebrou a vitória da Alemanha sobre a Argentina ao lado do presidente alemão, Joachim Gauck. Ela estava no auge de sua popularidade, assim como a seleção vitoriosa.
Foto: imago/Action Pictures
"Nós podemos fazer isso!"
Para Merkel, o direito de asilo a refugiados não pode ser limitado. "Nós podemos fazer isso" se tornou o credo da chanceler sobre a política alemã de acolhida aos migrantes que fogem de guerras e perseguições. Se o país dará conta da enorme demanda, isso já é uma pergunta ainda em aberto.
Foto: picture-alliance/dpa/S. Hoppe
"E agora, Merkel?"
Sexta-feira 13 – um massacre em novembro. A França está em situação de emergência e Merkel ofereceu "toda a assistência" ao país vizinho. O medo do terrorismo se espalha. Não há dúvidas de que esse é o maior desafio de Merkel em dez anos no poder.
Foto: picture-alliance/dpa/B. von Jutrczenka
Barulho na coalizão
Foi o castigo máximo para a chanceler federal. No congresso da CSU, em novembro de 2015, Horst Seehofer a repreendeu. O líder da legenda-irmã do partido de Merkel na Baviera criticou que a política migratória da chefe alemã de governo fez com que o país perdesse o controle de suas próprias fronteiras. Uma humilhação que Merkel teve que suportar de pé e sem oportunidade de resposta.
Foto: picture-alliance/AP Photo/S. Hoppe
Será que ele não poderia ficar?
Seria um alívio para Merkel continuar a lidar com Obama. Mas, no início, ela era bastante cética quanto a ele. O monitoramento do celular da chanceler federal, no contexto do escândalo de espionagem da NSA, parecia abonar a sua postura reservada. Mas, agora, um parceiro previsível sai de cena e dá lugar a Donald Trump. O jornal "New York Times" já a chama de "defensora do Ocidente liberal".
Foto: Reuters/F. Bensch
Merkel mais uma vez
Finalmente, após meses de intensas especulações em torno de sua candidatura à reeleição, Merkel confirma a sua intenção de concorrer a um quarto mandato. Durante entrevista coletiva em 20/11, ela diz à liderança de seu partido, a União Democrata Cristã (CDU), estar preparada para chefiar a legenda na eleição parlamentar alemã, prevista para setembro ou outubro de 2017.