Merkel visita Auschwitz pela primeira vez como chanceler
6 de dezembro de 2019
"Recordar os crimes, nomear seus autores e homenagear dignamente as vítimas é uma responsabilidade que não acaba nunca", diz chanceler federal alemã em visita histórica.
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Ao visitar pela primeira vez nesta sexta-feira (06/12) o antigo campo de concentração e extermínio nazista de Auschwitz-Birkenau, a chanceler federal alemã, Angela Merkel, disse ser preciso combater com determinação o antissemitismo.
"Não toleramos antissemitismo algum. Todas as pessoas na Alemanha e na Europa têm que se sentir seguras e em casa", afirmou. Ela frisou que há um aumento preocupante de agressões antissemitas e racistas no país e ressaltou que a Alemanha carrega especial responsabilidade neste assunto.
Em companhia do primeiro-ministro polonês, Mateusz Morawiecki, Merkel depositou uma coroa de flores no chamado Muro da Morte, local da execução de milhares de pessoas – sobretudo prisioneiros políticos poloneses. A chanceler visitou em seguida o antigo campo de extermínio de Birkenau.
"Auschwitz foi um campo de extermínio alemão, administrado por alemães", sublinhou a chanceler, em referência indireta à crítica do governo da Polônia de que alguns insistem em falar em "campos poloneses".
"É importante nomear claramente os criminosos. Nós, alemães, devemos isso às vítimas e a nós mesmos", afirmou, assegurando que essa responsabilidade "será sempre parte da identidade da Alemanha e nunca deixará de existir", embora "alguns tentem relativizar ou relativizar a história".
Merkel visita o memorial a convite da Fundação Auschwitz-Birkenau, que comemora seu décimo aniversário. A chanceler anunciou a doação de 60 milhões de euros à instituição, verba a ser usada pelo fundo que financia as obras de conservação do memorial.
O donativo se une a outros 60 milhões de euros que a Alemanha doou há 10 anos, quando o fundo foi criado, de acordo com informação do Museu Estatal de Auschwitz-Birkenau. Isso eleva a doação total alemã a 120 milhões de euros e torna a Alemanha, de longe, o mais generoso dos 38 países que contribuíram com a instituição. Como na doação anterior, metade da verba vem do governo federal e metade dos estados alemães, como um reconhecimento da responsabilidade da nação alemã pelo Holocausto.
"Recordar os crimes, nomear seus autores e homenagear dignamente as vítimas é uma responsabilidade que não acaba nunca. Não é negociável e é inseparável do nosso país. Ser consciente desta responsabilidade é uma parte da identidade nacional", disse a chanceler.
A última visita de um chefe de governo da Alemanha a Auschwitz foi há quase um quarto de século: em 1995, quando Helmut Kohl foi ao lugar pela segunda vez como chanceler, depois de ter estado em 1989 no antigo campo de concentração. Seu antecessor Helmut Schmidt esteve no local em 1977 como o primeiro chefe de governo alemão.
Desde que se tornou chanceler em 2005, Merkel visitou outros campos de concentração nazistas. Em 2009, ela esteve em Buchenwald com o presidente americano Barack Obama e em 2013 visitou Dachau junto com sobreviventes do campo de concentração. Ela voltou a Dachau em 2015, no 70° aniversário da libertação do campo. Merkel também já esteve cinco vezes no Museu do Holocausto de Israel e Centro de Memória Yad Vashem.
O Ministério do Exterior da Polônia chamou de "histórica" a visita de Merkel, em um reconhecimento do claro status único que Auschwitz tem na memória coletiva mundial.
Auschwitz-Birkenau foi o maior campo de extermínio dos nazistas. Cerca de 1,1 milhão de pessoas foram assassinadas no lugar, a maioria eram judeus. Entre os mortos no campo, 80 mil eram poloneses não judeus, 25 mil eram membros das etnias sinti e roma e 20 mil soldados soviéticos. O campo foi libertado pelo Exército Vermelho em 27 de janeiro de 1945.
Exposição em Berlim mostra a obra de artistas que sobreviveram aos campos de concentração nazistas. Além de documentar atrocidades, eles fizeram arte.
Foto: Staatliches Museum Auschwitz-Birkenau in Oœwiêcim
Os artistas esquecidos
Enquanto a chamada "arte degenerada" dos artistas perseguidos pelo nazismo desperta atenção, quase ninguém conhece o trabalho dos artistas que estavam em campos de concentração. Pintores como Waldemar Nowakowski (foto) estão quase esquecidos. Por isso a importância do livro e da exposição "A morte não tem a última palavra", a ser aberta no prédio do Bundestag em Berlim, a partir de 27 de janeiro.
Foto: Staatliches Museum Auschwitz-Birkenau in Oœwiêcim
Horrores de Theresienstadt em gravura
Por mais de 15 anos, o autor, curador e historiador de arte Jürgen Kaumkötter se dedicou à arte dos perseguidos entre 1933 e 1945. Para isso, não considerou apenas quadros que surgiram nessa época, mas também aqueles que tematizaram os acontecimentos em retrospecto. Leo Haas executou esta gravura sobre Theresienstadt em 1947. Mas há também obras feitas no campo de concentração.
Foto: Bürgerstiftung für verfolgte Künste – Else-Lasker-Schüler- Zentrum – Kunstsammlung Gerhard Schneider
Pinturas no "museu do campo"
É sabido que artistas pintaram em Theresienstadt. Mas também em Auschwitz 1 houve um "museu do campo". Lá havia lápis, papel, pincéis à disposição dos artistas, para que executassem encomendas para a SS. Outros motivos surgiram secretamente. Em contrapartida, praticamente não há obras de arte oriundas de Auschwitz 2. Na foto: "Autorretrado de Marian Ruzamski", de 1943/44.
Foto: Staatliches Museum Auschwitz-Birkenau in Oœwiêcim
Imagem de sonhos em Auschwitz
O artista Jan Markiel criou esse retrato, em 1944, sem os materiais que tinha oficialmente à disposição em Auschwitz 1. A filha do padeiro do vilarejo próximo de Jawiszowice ajudou o prisioneiro trazendo pão e intermediando mensagens para a resistência. A têmpera utilizada pelo artista veio de pigmentos raspados da parede. O tecido grosso dos colchões de palha serviu como tela.
Foto: Staatliches Museum Auschwitz-Birkenau in Oœwiêcim
Testemunha dos crematórios
Em 1942, aos 13 anos, Yehuda Bacon (na foto, à dir.) veio para Theresienstadt e, em dezembro de 1943, para Auschwitz-Birkenau. Ele foi utilizado como mensageiro – podendo se aquecer nos fornos dos crematórios no inverno. O que testemunhou, ele relatou não somente durante o célebre Julgamento de Auschwitz em Frankfurt, mas também expressou nos desenhos que executou após a guerra.
Foto: Bürgerstiftung für verfolgte Künste – Else- Lasker-Schüler-Zentrum – Kunstsammlung Gerhard Schneider
Símbolo da morte
Yehuda Bacon mostrou esse desenho aos juízes em Frankfurt, como prova dos crimes cometidos em Auschwitz: chaminés retangulares dos crematórios, um chuveiro, pessoas que são apenas esboços. Para o historiador da arte Kaumkötter, esse desenho é um símbolo da morte nas câmaras de gás e da sepultura nos céus. Trata-se não somente de um testemunho, mas também de uma grande obra de arte.
Foto: Yehuda Bacon
A segunda geração
Michel Kichka é um dos cartunistas mais influentes de Israel. Em 2014, ele publicou a novela gráfica "Segunda geração – o que o meu pai nunca me contou", sobre o menino Kichka e o seu pai, sobrevivente de Auschwitz. Os traumas do pai passaram para o filho. Somente quanto ouve o pai contar piadas sobre o campo, Kichka consegue superar seus pesadelos.
Foto: Egmont Graphic Novel
Metáforas do Holocausto
Também os pais da artista israelense Sigalit Landau são sobreviventes do Holocausto, e o professor de desenho dela foi Yehuda Bacon, que trabalha até hoje como artista e professor de arte em Israel. Os trabalhos de Landau são repletos de alusões metafóricas ao Holocausto, como estes sapatos, que logo lembram a montanha de calçados que ainda hoje pode ser vista na exposição permanente de Auschwitz.
Foto: Sigalit Landau
A morte não tem a última palavra
Sigalit Landau coletou cem pares de sapatos em Israel e os afundou no Mar Morto. O mar os envolveu com uma camada de sal curativa – eles se tornaram símbolo da vida, em vez da morte. O desejo da artista era mostrá-los em Berlim, como sinal de que a esperança derrota o desespero. A mostra "A morte não tem a última palavra" está em cartaz até o dia 27 de fevereiro no prédio do Bundestag, em Berlim.