Agressões sexuais, indo até o estupro, não são raridade na festa da cerveja. Antes "toleradas" ou silenciadas, também por vergonha, hoje há mais coragem de denunciá-las. Uma vendedora de rosas relata.
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Meu dia de trabalho na Oktoberfest começa com o mesmo ritual que o de tantas outras colegas da festa anual: me fazer bonita. Primeiro, esconder as olheiras cada dia maiores, depois aplicar todo um arsenal de maquiagem, retocar os lábios, vestir a blusa e a meia-calça, entrar no dirndl, o traje bávaro, amarrar o avental para a esquerda ou para a direita, ajeitar o decote, acertar o xale típico sobre os ombros, e, por fim, colocar o short de ciclista.
Um momento: para que o calção debaixo do dirndl? Para quem trabalha ao ar livre, ele é útil contra o frio, mas para as garçonetes nas tendas, pode servir de barreira protetora contra os bolinadores. O short de ciclista debaixo da saia é acolchoado nas partes sensíveis, e ao mesmo tempo é tão justo que fica invisível. Caso uma mão masculina se perca lá por baixo, a mensagem imediata a seu dono é: acesso proibido.
Assim equipadas, garçonetes e vendedoras de flores e pretzels vão trabalhar na Oktoberfest de Munique, dia após dia, ao longo de duas semanas – em 2019, até este domingo, 6 de outubro. Ainda antes do meio-dia, visitantes, servidores, cozinheiros e vendedores já percorrem a Theresienwiese. Tudo o que cozinhas e barris tenham a oferecer é consumido avidamente.
O clima se descontrai, e estranhos se transformam em amigos, turistas de todo o mundo se abraçam. Na confraternização movida a álcool, as distâncias interpessoais se reduzem, vai ficando mais apertado entre os frequentadores, e alguns dedos saem em missão de exploração. Não só furtos, mas também agressões sexuais são infelizmente rotina na festa bávara da cerveja, conhecida como "Wiesn" pelos locais.
Quer colaboradora, quer visitante, nenhuma mulher está a salvo de assédio: ainda na primeira metade desta 186ª edição, a delegacia municipal da capital da Baviera já registrava 25 delitos sexuais, entre os quais três estupros. Ao todo, cometeram-se em oito dias 465 atos criminosos, incluindo furto, vandalismo e outros.
O dado positivo é que, desde o recorde absoluto de 2017, com 67 agressões, os delitos sexuais vêm diminuindo, tendo sido registrado um total de 45 no ano seguinte, relata à DW a porta-voz da polícia muniquense Claudia Künzel. Independente dos números, porém, cada incidente que possa atingir uma turista ou empregada da Oktoberfest é um incidente que nunca deveria ter acontecido.
No passado, atentados à moral e bons costumes eram "tolerados" como "pecadilhos entre cavalheiros", ou simplesmente silenciados, muitas vezes por vergonha. Desde o debate #MeToo, contudo, a conversa é outra: as vítimas de agressões sexuais estão mais corajosas e seguras de si. Mulheres – e, em casos isolados, também homens – não aceitam mais passivamente a ofensa, mas sim denunciam os agressores à polícia.
Apalpar o traseiro da garçonete, afagar o rosto da vendedora de flores ou dar um beijinho na desconhecida à esquerda, no banco de cervejaria: há muito esses não são mais atos que fiquem sem consequências, pois neste meio-tempo a opinião pública avalia tais intimidades de forma totalmente diferente.
O resultado são antes questões complexas do que respostas simples: o que um homem pode se permitir? E uma mulher? Quão perto se pode chegar delas, em geral, e quais são seus limites? Diretores de empresas ainda podem dar flores a suas empregadas? Sinais supostamente inocentes de afeição estarão sendo cada vez mais interpretados de forma equivocada? Estarei infringindo um código de comportamento ao emitir sinais que o outro possa entender como "cantada" ou erótico?
Alguns frequentadores da Oktoberfest, de fato, estão mais sensíveis, e preferem pensar duas vezes antes de engatar no braço da vizinha para se balançar ao som da música. A maioria dos visitantes, porém, continua aproveitando a jovial atmosfera de cervejaria para paquerar impiedosamente.
Um grupo entre incorrigíveis até tem um apelido próprio: Kussjäger, "caçadores de beijos" que fazem questão de chegar ao fim do dia com o rosto coberto do batom das mais variadas beldades da Wiesn. Contra eles, as garçonetes da Oktoberfest desenvolveram uma arma simples: usar batom vermelho-escuro, o qual, consta, tem a propriedade de intimidar os homens.
É isso o que eu faço como vendedora de rosas – e até agora tenho me saído muito bem.
Guia das tendas da Oktoberfest
Beber ao menos uma cerveja numa tenda da Oktoberfest é obrigatório, e as filas começam cedo. A escolha pode ser influenciada pela marca da cerveja oferecida, a comida ou mesmo a idade dos frequentadores.
Foto: Tommy Loesch, München Tourismus
Schottenhamel
No parque da Oktoberfest são montadas grandes tendas. A mais antiga é a Schottenhammel, de 1867. Naquela época, ela era de madeira e com 50 lugares. Hoje, cabem na parte interna e no biergarten 10 mil pessoas. É na Schottenhammel que acontece a tradicional abertura da Oktoberfest, em que o prefeito de Munique abre o primeiro barril de cerveja. Aliás, aqui é servida a Spatenbräu.
Foto: B. Roemmelt, München Tourismus
Hofbräu
Seguindo a tradição da Hofbräuhaus no centro de Munique, também aqui é servida a cerveja de mesmo nome regada com muita música típica ao vivo, que leva nativos e turistas a dançarem sobre os bancos. Dez mil pessoas cabem na tenda. A figura pendurada no teto é o anjo Aloisius. Diz a lenda que ele está no céu, xingando porque não pode beber cerveja.
Foto: Frank Bauer, München Tourismus
Hacker
Também a cervejaria Hackerbräu tem uma grande tenda na festa em Munique. Com capacidade para 9.300 pessoas, ela é frequentada principalmente por jovens e turistas. Reformada este ano, ela recebeu um melhor sistema de ventilação. O teto, que tem uma parte que pode ser aberta, é decorado pelo famoso "céu dos bávaros".
Foto: A. Kupka, München Tourismus
Bräurosl
Beber, dançar e festejar: a tenda da Bräurosl é conhecida por seu ambiente agitado. Especialmente no primeiro domingo da Oktoberfest, gays e lésbicas se reúnem para o "Gay Sunday". O nome da tenda lembra a filha do ex-dono da cervejaria Pschorr, Rosi. A cada ano, uma pessoa que cante "jodel", a tradicional forma de canto tirolês, pode se autointitular "Bräurosl" e animar o público na tenda.
Foto: G. Blank, München Tourismus
Winzerer Fähndl
Na Oktoberfest, são servidos apenas os produtos de seis cervejarias de Munique. Na tenda Winzerer Fähndl, a cerveja é da Paulaner. A enorme tenda, com capacidade para mais de 10 mil pessoas sentadas, permite que todos vejam os músicos. O público é variado e inclui celebridades, como os jogadores do Bayern.
Foto: B. Roemmelt, München Tourismus
Augustiner
A Augustiner é a mais antiga cervejaria da capital da Baviera. Sua cerveja é armazenada em barris de carvalho, e não em tanques de aço como nas outras tendas. Por isso, muitos apreciadores a consideram a melhor cerveja da Oktoberfest. Além disso, as garçonetes são consideradas muito simpáticas.
Foto: Tommy Loesch, München Tourismus
Tenda dos atiradores
Todos os anos, acontece nesta tenda com 110 estandes de tiro, a Schützenfestzelt, o campeonato estadual de tiro ao alvo. Até os anos 1960, havia apenas provas de tiro. Só depois é que passaram a ser oferecidas especialidades culinárias. Um prato recomendado é o leitão ao molho de cerveja preta. A tenda é frequentada por quem aprecia ambientes sofisticados e é ponto de encontro da nobreza alemã.
Foto: Tommy Loesch, München Tourismus
Tenda dos besteiros
Tudo é bem alpino na Armbrustschützenzelt, a tenda dos praticantes de besta, uma modalidade parecida com o arco e flecha. Cada área tem o nome de um animal típico da região e não falta música folclórica, como numa tradicional festa bávara. E, claro, há competições de besta (diz-se bésta). O público é misto, com visitantes de todas as faixas etárias.
Foto: B. Roemmelt, München Tourismus
Marstall, a tenda dos cavaleiros
A tenda Marstall substituiu o Hippodrom em 2014. Os cavalos são um tema presente desde o início da Oktoberfest, há 200 anos. O palco lembra um carrossel de cavalos. Esta é a primeira tenda da Oktober a oferecer comida vegana.
Foto: Tommy Loesch, München Tourismus
Löwenbräu
Na tenda Löwenbräu (cervejaria do leão), não poderia faltar a estátua do rei dos animais. E ninguém pode ignorar o rugido do animal gritando o nome da marca na entrada da tenda. Há lugar para 8.500 pessoas sentadas. Para apreciar o caneco de cerveja, nada melhor do que uma das especialidades: pernil de porco, pato e leitão.
Foto: Fernanda Vilela
A tenda do boi no espeto
A especialidade desta tenda, a Ochsenbraterei, é uma atração da Oktoberfest há mais de 130 anos. Um boi assado de 250 quilos rende 500 porções. O nome do animal tradicionalmente fica escrito em uma placa dentro da tenda. É tradição também que o primeiro animal assado na festa receba o nome do açougueiro e, o último, o do chefe de cozinha da tenda.
Foto: picture alliance/M. C. Hurek
Fischer Vroni, especializada em peixes
O nome já revela: Fischer é pescador. A especialidade é o Steckerlfisch, onde os peixes enfiados em pauzinhos são assados um ao lado do outro em uma fileira de 15 metros. Com quase 3.400 lugares, a Fischer Vroni é uma das menores entre as grandes tendas da Oktober e muito procurada por turistas e pessoas mais velhas.
Foto: Christian Kasper, München Tourismus
Kufflers Weinzelt, a tenda do vinho
Vinho entre as tendas de cerveja? Sim, desde 1984 a família Kuffler, do ramo da gastronomia, oferece aqui vinho e espumantes. Em vez de sentar em bancos rústicos, os visitantes ficam em nichos separados e com bancos de madeira mais trabalhados. Na parte interna, cabem 1.920 pessoas, e, fora, 580. Enquanto a maioria das tendas fecha às 23h30, esta fica aberta até 1 hora.
Foto: picture alliance/BREUEL-BILD/ABB
Käfer
Esta tenda pitoresca é muito frequentada pela alta sociedade internacional. Por isso, é bastante difícil conseguir um dos 3 mil lugares. Por dentro, ela parece uma cabana de montanha, com vários ambientes decorados de forma rústica e muitos cantinhos aconchegantes.