Milhares contra manifestação neonazista na Alemanha
9 de novembro de 2019
Extremistas de direita marcaram aniversário da Noite do Pogrom de 1938 com passeata em Bielefeld. Sindicatos, Igrejas e partidos reagiram sob o slogan "Fascismo não é opinião, é um crime". Placar: 14 mil contra 230.
Anúncio
Em Bielefeld, no estado alemão da Renânia do Norte-Vestfália, extremistas de direita desfilaram neste sábado (09/11). A data marca os 81 anos da Noite do Pogrom do Terceiro Reich, também denominada "Noite dos Cristais". No entanto, muito maior foi o número dos cidadãos que se manifestaram nas ruas pela liberdade, respeito e dignidade humana.
Com barricadas de metal, a polícia manteve os cerca de 230 partidários da sigla A Direita afastados dos 14 mil participantes de um total de 14 manifestações contrárias. As passeatas transcorreram basicamente pacíficas.
Os neonazistas convocaram a marcha para evocar a onda de saques, incêndios, atos de vandalismo e violência, instigados pelo partido nacional-socialista, contra sinagogas e estabelecimentos da população judaica, em 9 de novembro de 1938.
Com isso, os ultradireitistas queriam chamar a atenção para a negadora do Holocausto condenada Ursula Haverbeck, presa em Bielefeld por agitação popular. Em oposição, sindicatos, Igrejas, confederações e partidos se manifestaram sob o slogan "Fascismo não é opinião, é um crime".
O presidente do parlamento estadual da Renânia do Norte-Vestfália, André Kuper, reforçou que o 9 de novembro é o dia da Reunificação da Alemanha, mas também o dia em que, "perplexo e envergonhado", o país lembra os crimes do nazismo: "Por isso hoje estamos do lado de nossas cidadãs e cidadãos judeus."
Cerca de mil policiais de todo o estado foram mobilizados. O organizador do comício dos extremistas de direita recebeu uma lista com palavras de ordem proibidas, contendo expressões que instiguem ao ódio contra partes da população ou possam perturbar a ordem pública.
No fim de setembro, o Tribunal Administrativo da cidade de Minden cassara uma liminar da central de polícia de Bielefeld exigindo a antecipação da manifestação neonazista, em respeito à memória histórica da Noite do Pogrom antissemítico. Por isso os radicais tiveram permissão para desfilar neste sábado.
Os Pogroms de Novembro, conhecidos como "Noite dos Cristais"
Em 9 e 10 de novembro de 1938, o Terceiro Reich lançou um pogrom antijudaico de características medievais. A "Noite dos Cristais" entrou para a história como um exemplo da barbárie nazista.
Foto: gemeinfrei
O que ocorreu entre 9 e 10 de novembro de 1938?
Ataques antissemitas, liderados por paramilitares da SA, foram lançados por toda a Alemanha nazista. Sinagogas como esta, na cidade de Chemnitz, no leste do país, e outros estabelecimentos de propriedade de judeus foram destruídos. Judeus foram sujeitados à humilhação pública e presos. Pelo menos 91 deles – mas provavelmente muitos mais – foram mortos.
Foto: picture alliance
Por trás do nome
A violência contra os judeus alemães observada nas ruas de todo o país é conhecida por uma série de nomes. Em Berlim, costuma-se referir-se a ela como "Kristallnacht", ou, em português, "Noite dos Cristais". Atualmente, porém, é mais comum entre os alemães falar na "Noite do Pogrom" ou nos "Pogroms de Novembro".
Foto: Getty Images
O que desencadeou o pogrom?
O estopim do episódio foi o assassinato do diplomata alemão Ernst vom Rath, em Paris, por um adolescente judeu polonês chamado Herschel Grynszpan. Não se sabe ao certo se ele sobreviveu ao regime nazista ou se morreu em algum campo de concentração.
Foto: picture-alliance/Imagno/Schostal Archiv
Como a violência realmente começou?
Após a morte de von Rath, Adolf Hitler deu uma permissão verbal ao Ministro da Propaganda, Josef Goebbels, para lançar o pogrom. A violência já havia eclodido em alguns lugares. Os paramilitares da SS foram instruídos a permitir "apenas medidas que não impliquem nenhum perigo para vidas e propriedades alemãs".
Foto: dpa/everettcollection
A violência foi uma expressão de raiva popular?
Não. Essa foi a versão oficial do partido nazista, mas ninguém acreditou nela. Referências constantes a "operações" e "medidas" indicam claramente que a violência foi um ato de Estado. Não está claro o que a população alemã achou do episódio. Há evidências de desaprovação popular – embora o fato de o casal à esquerda da foto estar rindo também dizer muito.
Foto: Bundesarchiv, Bild 146-1970-083-42/CC-BY-SA
O que os nazistas esperavam obter com a violência?
Conforme a ideologia racista do partido, os nazistas queriam intimidar os judeus para que estes deixassem a Alemanha. Com esse intuito, judeus eram frequentemente exibidos de forma humilhante pelas ruas, como nesta imagem. Seus algozes também tinham motivações econômicas: judeus fugindo do Terceiro Reich tinham que pagar "taxas de emigração", e suas propriedades eram confiscadas com frequência.
Foto: gemeinfrei
O pogrom alcançou o seu propósito?
Após o episódio, os judeus não podiam mais nutrir qualquer ilusão sobre as intenções dos nazistas, e aqueles que tiveram a chance, fugiram. Mas a agressão aberta caiu mal na imprensa internacional e contrariou muitos alemães que defendiam a ordem. Foi assim que surgiram medidas mais burocráticas, como a exigência de que os judeus usassem estrelas de David amarelas visíveis em suas roupas.
Foto: gemeinfrei
Qual foi o resultado imediato?
Depois do pogrom, a liderança nazista instituiu uma série de medidas antijudaicas, inclusive – não sem um certo cinismo – uma taxa para ajudar a pagar pelos danos de 9 a 10 de novembro de 1939. Hermann Göring, o segundo homem mais poderoso do Terceiro Reich na época, notoriamente observou: "Eu não gostaria de ser judeu na Alemanha".
Foto: AP
O que os Pogroms de Novembro representaram para a história?
Em 1938, ainda faltavam dois anos para o início do Holocausto. Mas há uma clara linha de continuidade desde o pogrom até o assassinato em massa de judeus europeus, na qual a liderança nazista continuaria a desenvolver e aprimorar seu ódio antissemita. Nas palavras de um historiador contemporâneo, o pogrom foi um "prelúdio do genocídio".