Milhares marcham em Barcelona contra independência catalã
8 de outubro de 2017
Em discurso de encerramento da passeata, Nobel de Literatura Mario Vargas Llosa chama líderes catalães de "golpistas". Chefe de governo espanhol rejeita diálogo, argumentando que unidade do país não é negociável.
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Centenas de milhares de pessoas foram às ruas de Barcelona neste domingo (08/10) para protestar contra as intenções de independência da Catalunha e pela unidade da Espanha. A passeata reuniu entre 350 mil, segundo a polícia, e 950 mil participantes, de acordo com os organizadores. O Prêmio Nobel de Literatura Mario Vargas Llosa discursou no comício de fechamento.
Milhares de pessoas saíram da praça Urquinaona em direção à estação de metrô de França, erguendo bandeiras espanholas e catalãs sob a palavra de ordem "Basta! Recuperemos a sensatez".
Entre a profusão de bandeiras espanholas, catalãs e europeias, a marcha começou a avançar lentamente a partir das 12h (horário local), entre gritos de "Puigdemont para a prisão", numa referência ao líder do governo autônomo catalão, ou "viva Espanha, viva Catalunha".
Em seu discurso, o escritor Mario Vargas Llosa criticou a "paixão nacionalista", chamou de "golpistas" os líderes do governo regional e ressaltou que a "conspiração independentista não destruirá 500 anos de história" da Espanha unida nem a converterá num país "terceiro mundista".
Vargas llosa afirmou que "todos os povos modernos ou antigos vivem na sua história momentos em que a razão é ultrapassada pela paixão nacionalista" que "pode ser destrutiva e feroz quando é movida pelo fanatismo e pelo racismo".
O escritor disse que o nacionalismo é "a pior de todas as paixões, a que causou mais estragos na história", que provocou "sangue e cadáveres" na Europa, no mundo e na Espanha.
"Estamos aqui para parar os estragos do independentismo e, por isso, hoje milhares de catalães foram para a rua, são democratas que não acreditam que sejam traidores, catalães que não consideram o adversário um inimigo, que acreditam na democracia, na liberdade, no estado de direito, na Constituição", sublinhou Vargas Llosa.
O presidente do governo da Espanha, Mariano Rajoy, afirmou, em entrevista publicada neste domingo pelo jornal El País, que impedirá que uma eventual declaração de independência da Catalunha produza quaisquer efeitos, rejeitando o diálogo para resolver o desafio independentista catalão, ressaltando que "a unidade da Espanha não se negocia" e "sob chantagem não é possível construir nada".
"Espanha não vai se dividir"
Na sua primeira entrevista a um diário espanhol desde o início da crise entre Madri e Barcelona, Rajoy assegurou que "a única coisa que existe é a ideia de que não se pode dialogar sobre a unidade da Espanha, nem intermediar nem ser objeto de mediação, nem negociar com a ameaça de romper a unidade do Estado".
Ao longo da entrevista, ele reiterou que a Espanha "não vai se dividir" e que o governo usará "todos os instrumentos que a legislação dá" para conseguir isso, acrescentando que "quem tiver que tomar a decisão deve fazê-lo com prudência e estando consciente das consequências da decisão que tomar".
As tensões entre Madri e Barcelona mergulharam a Espanha na sua mais grave crise política desde o regresso à democracia, em 1977.
A crise divide a Catalunha, onde vivem 16% dos espanhóis e onde, segundo as sondagens, metade da população não defende a independência.
Entenda a crise na Catalunha
02:31
Justiça condenou referendo
A Justiça espanhola considerou ilegal o referendo para a independência convocado para 1° de outubro pelo governo regional catalão e deu ordem para que os Mossos d'Esquadra selassem os locais de votação.
Perante a inação da polícia catalã em alguns locais, foram chamadas forças de segurança de âmbito nacional, que protagonizaram os maiores momentos de tensão para tentar impedir o referendo, realizando batidas policiais contra eleitores e forçando a entrada em vários locais de votação ocupados de véspera por pais, alunos e residentes, para garantir que permaneceriam abertos.
A violência policial fez 893 feridos mas, apesar da repressão, 43,03% dos 5,3 milhões de eleitores conseguiram votar, e 90,18% deles votaram a favor da independência, segundo o governo regional da Catalunha.
MD/lusa/efe/dpa/afp/rtr
Breve história da Catalunha
Desejo de independência da Espanha é acalentado pelos catalães há muito tempo. Ao longo dos séculos, região experimentou vários graus de autonomia e repressão.
Foto: picture-alliance/dpa/AP/F. Seco
Antiguidade rica
A Catalunha foi habitada por fenícios, etruscos e gregos, que estiveram nas áreas costeiras de Rosas e Ampúrias (acima). Depois vieram os romanos, que construíram mais assentamentos e infraestrutura. A Catalunha foi uma parte do Império Romano até ser conquistada pelos visigodos, no século 5.
Foto: Caos30
Condados e independência
A Catalunha foi conquistada pelos árabes no ano 711. O rei franco Carlos Magno interrompeu o avanço deles em Tours, no rio Loire, e em 759 o norte da Catalunha se tornou novamente cristão. Em 1137, os condados que compunham a Catalunha iniciaram uma aliança com a Coroa de Aragão.
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Guerra e perda de território
No século 13, as instituições de autoadministração catalã foram criadas sob o nome Generalitat de Catalunya. Depois da unificação da Coroa de Aragão com a de Castela, em 1476, Aragão pôde manter suas instituições autônomas. No entanto, a revolta catalã – de 1640 a 1659 – fez com que partes da Catalunha fossem cedidas à atual França.
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Lembrando a derrota
No final da Guerra da Sucessão, Barcelona foi tomada, em 11 de setembro de 1714, pelo rei espanhol Felipe 5°, as instâncias catalãs foram dissolvidas e a autoadministração chegou ao fim. Todos os anos, em 11 de setembro, os catalães fazem uma grande comemoração para lembrar o fim do seu direito à autonomia.
Foto: Getty Images/AFP/L. Gene
República passageira
Após a abdicação do rei Amadeo 1°, da Espanha, a primeira república espanhola foi declarada em fevereiro de 1873. Ela durou apenas um ano. Os partidários da república estavam divididos, com um grupo apoiando uma república centralizada e outros, um sistema federal. A foto mostra Francisco Pi y Maragall, um partidário do federalismo e um dos cinco presidentes da república de curta duração.
Foto: picture-alliance/Prisma Archivo
Tentativa fracassada
A Catalunha tentou estabelecer um novo Estado dentro da república espanhola, mas isso apenas exacerbou as diferenças entre os republicanos e os enfraqueceu. Em 1874, a monarquia e a Casa de Bourbon, liderada pelo rei Afonso 12 (foto), retomaram o poder.
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Direitos de autonomia
Entre 1923 e 1930, o general Primo de Rivera liderou uma ditadura – com o apoio da monarquia, do Exército e da Igreja. A Catalunha se tornou um centro de oposição e resistência. Após o fim do regime, o político Francesc Macia (foto) conseguiu impor direitos importantes de autonomia para a Catalunha.
Fim da liberdade
Na Segunda República Espanhola, os legisladores catalães trabalharam no Estatuto de Autonomia da Catalunha, aprovado pelo Parlamento espanhol em 1932. Francesc Macia foi eleito presidente da Generalitat de Catalunha pelo Parlamento catalão. No entanto, a vitória de Franco no fim da Guerra Civil Espanhola (1936 a 1939) acabou com tudo isso.
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Opressão
O ditador Francisco Franco governou com mão de ferro. Partidos políticos foram proibidos, e a língua e a cultura catalãs, reprimidas.
Foto: picture alliance/AP Photo
Novo estatuto de autonomia
Após as primeiras eleições parlamentares que se seguiram ao fim da ditadura de Franco, a Generalitat da Catalunha foi provisoriamente restaurada. Sob a Constituição democrática espanhola de 1978, a Catalunha recebeu um novo estatuto de autonomia, apenas um ano depois.
O novo estatuto de autonomia reconheceu a autonomia da Catalunha e a importância da língua catalã. Em comparação com o estatuto de 1932, ele apresentou avanços nos campos da cultura e educação, mas restrições no âmbito da Justiça. A foto é de Jordi Pujol, que foi por longo tempo chefe de governo da Catalunha depois da ditadura.
Foto: Jose Gayarre
Anseio por independência
O desejo por independência da Espanha se tornou mais forte nos últimos anos. Em 2006, a Catalunha recebeu um novo estatuto, que ampliou ainda mais os poderes do governo catalão. No entanto, eles são perdidos após uma queixa levada pelo conservador Partido Popular ao Tribunal Constitucional espanhol.
Foto: Reuters/A.Gea
Primeiro referendo
Um referendo sobre a independência estava previsto para 9 de novembro de 2014. A primeira questão era "você quer que a Catalunha se torne um Estado?" No caso de uma resposta afirmativa, a segunda pergunta era "você quer que esse Estado seja independente?" No entanto, o Tribunal Constitucional suspendeu a votação.
Foto: Reuters/G. Nacarino
Luta de titãs
Desde janeiro de 2016, Carles Puigdemont é o presidente do governo catalão. Ele deu continuidade ao curso separatista de seu antecessor, Artur Mas, e convocou um novo referendo para 1° de outubro de 2017. O primeiro-ministro espanhol, Mariano Rajoy, disse que a consulta é inconstitucional.