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PolíticaHungria

Milhares protestam na Hungria contra universidade chinesa

6 de junho de 2021

Projeto de campus é apoiado pelo governo ultradireitista de Viktor Orbán, que abriu seu país para os chineses. Em reação, prefeito verde de Budapeste rebatiza vias da capital com nomes como "rua Dalai Lama".

Proteste in Ungarn
Opositores do projeto argumentam que valores deveriam ser usado para construir moradiaspara estudantesFoto: Laszlo Balogh/AP Photo/picture alliance

Pelo menos 10 mil húngaros saíram às ruas de Budapeste no sábado (05/06) para protestar contra o projeto de construção de um campus de uma universidade chinesa na capital húngara.

O projeto, que é apoiado pelo primeiro-ministro ultranacionalista Viktor Orbán, prevê que os húngaros arquem com grande parte dos custos da iniciativa. O campus seria uma filial da Universidade Fudan, que tem sede em Xangai. Se o projeto for adiante, esta será a primeira universidade chinesa com um campus na Europa.

A iniciativa prevê que cerca de 1,3 bilhão de euros a serem pagos pelos húngaros viriam na forma de um empréstimo chinês, de acordo com documentos obtidos pelo grupo húngaro de jornalismo investigativo Direkt36.

A entrega do campus, a ser erguido numa área de 500 mil m² quadrados, está prevista para 2024. O projeto prevê que campus será construído inteiramente com mão de obra e materiais chineses.

Prefeito verde lidera reação

De acordo com pesquisas, a grande maioria dos húngaros se opõe ao plano de pagar pela construção de uma universidade estrangeira na área, que originalmente estava reservada para a construção de moradias populares para estudantes de famílias rurais de baixa renda.

"Não concordo com o fortalecimento das relações feudais de nosso país com a China", disse Patrik, um estudante de 22 anos que participou dos protestos. Segundo ele, o valor da obra deveria ser usado ​​"para melhorar nossas próprias universidades, em vez de construir uma chinesa".

O prefeito de Budapeste, Gergely KaracsonyFoto: Laszlo Balogh/AP Photo/picture alliance

"O Fidesz [partido de Orbán] está vendendo no atacado a moradia dos estudantes húngaros e seu futuro, apenas para trazer uma universidade de elite da ditadura chinesa para o país", escreveram os organizadores do protesto no Facebook.

Gergely Karacsony, prefeito verde de Budapeste, que lidera uma coalizão de centro-esquerda e é um dos principais críticos de Orbán , pediu que o primeiro-ministro abandone o projeto.

Recentemente, para reforçar sua oposição, o prefeito determinou a mudança dos nomes de várias vias públicas que ficam nas proximidades do terreno reservado para a obra. Os nomes foram especialmente escolhidos para provocar os chineses, constranger Orbán e denunciar as violações dos direitos humanos no país asiático. Entre os novos nomes estão, "Rua Hong Kong Livre", "Rua Dalai Lama" e "Rua dos Mártires Uigures".

Gergely Karacsony já anunciou que pretende lançar uma candidatura a premiê nas eleições de 2022.

Os chineses reagiram furiosos. "Esse comportamento é desprezível", disse Wang Wenbin, porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China.

Acusações de hipocrisia

O governo de Orbán argumenta que a Universidade Fudan pode permitir que milhares de estudantes húngaros e internacionais possam adquirir uma educação de alta qualidade.

Mas o projeto também provocou acusações de hipocrisia contra o premiê ultranacionalista, já que Órban ganhou popularidade entre a extrema direita mundial ao praticamente expulsar do país a Central European University (CEU), do bilionário e filantropo húngaro-americano George Soros.

Fundada em 1991, em Budapeste, a CEU deixou a Hungria em 2018, após o governo húngaro dificultar a renovação da autorização de funcionamento. Soros, de 90 anos, costuma ser alvo de teorias conspiratórias por movimentos extremistas pelo mundo, que o pintam como um "globalista" e o usam regularmente como bode expiatório para todo o tipo de crise. Muitas vezes, as acusações contra Soros usam linguagem próxima do antissemitismo.

A CEU irritava especialmente o grupo de Orbán por patrocinar causas democráticas, pró-europeias e liberais. O grupo de Orbán também costumava acusar, sem provas, a CEU de minar as fundações do estado húngaro e até mesmo a civilização europeia.

O fato de Orbán, que usa de retórica anticomunista, ter liderado uma ofensiva contra a CEU e agora incentivar a construção do primeiro campus de uma universidade chinesa não passou despercebido pelos húngaros. Vários críticos temem que Órban, que é próximo de Pequim, esteja transformando  a Hungria em um "Cavalo de Troia".

O grupo de jornalismo independente Direkt36 destacou no sábado um artigo em que aponta preocupações com as intenções chinesas. "A política de abertura para o oriente de Viktor Orbán ajudou a inteligência chinesa a colocar os pés na Hungria, transformando o país em uma zona de colisão entre a China e os EUA."

Orbán e o presidente chinês Xi Jinping. Premiê húngaro se aproximou dos chineses e da Rússia enquanto brigava com a UEFoto: Andrea Verdelli/AFP/Getty Images

Szabolcs Panyi, o jornalista Direkt36 que escreveu o artigo, disse à DW que a aproximação com a Hungria cria um ambiente amigável para a inteligência chinesa. Observando a tendência de Pequim para coagir seus estudantes no exterior a auxiliar a agência de inteligência do país, Panyi disse: "Quanto maior a presença chinesa na Hungria, maior o risco de espionagem".

Nos últimos anos, Orbán construiu não só laços cordiais com a China, mas também com a Rússia e outros governos autoritários, enquanto brigava com a União Europeia e restringia a independência da pesquisa científica, do Judiciário e da mídia no seu país. Recentemente, o líder húngaro chegou a usar seu poder para bloquear uma declaração da UE que condenava a repressão de Pequim às liberdades civis em Hong Kong.

Em janeiro de 2019, Orbán também participou da posse de Jair Bolsonaro no Brasil. Em março de 2021, o deputado Eduardo Bolsonaro, fez elogios ao premiê húngaro durante seu discurso de despedida da presidência da Comissão de Relações Exteriores da Câmara. Orbán também é popular entre a extrema direita mundial por suas posições radicais contra a imigração e os direitos LGBT.

Embora Orbán tenha imaginado grandes quantias de dinheiro chinês em troca de sua fidelidade contínua a Pequim, pouco se materializou nos últimos 10 anos, levando os críticos a argumentar que ele ofereceu a Hungria como um aliado da China dentro da UE e da Otan, sem receber nada em troca.

jps (ap, dpa, dw, ots)

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