Ministério Público reabre investigação sobre morte de Herzog
31 de julho de 2018
Reabertura do inquérito ocorre após Corte Interamericana de Direitos Humanos condenar Estado brasileiro pela falta de investigação e aplicação da Lei da Anistia no caso. Jornalista foi assassinado por militares em 1975.
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Após condenação da Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH), o Ministério Público Federal de São Paulo reabriu nesta segunda-feira (30/07) a investigação sobre a morte do jornalista Vladimir Herzog, ocorrida em 1975, durante a ditadura militar.
No início de julho, a Corte IDH condenou o Estado brasileiro pela falta de investigação e pela aplicação da Lei da Anistia no caso. Foi a primeira vez que o tribunal, sediado na Costa Rica, considerou que um delito cometido durante a ditadura militar no Brasil (1964-1985) deve ser tipificado como crime contra a humanidade.
As resoluções do tribunal, que faz parte da Organização dos Estados Americanos (OEA), são de cumprimento obrigatório para os países que reconheceram sua jurisprudência. A Corte deu um prazo de um ano ao Brasil.
"Essa sentença é histórica porque a Corte considerou que a ditadura militar no Brasil ocorreu dentro de um contexto de crime contra a humanidade. Isso coloca o Brasil em um lugar onde só outros sete países do continente tiveram sentenças similares", afirmou a diretora do Centro de Justiça e Direito Internacional (Cejil), Beatriz Affonso.
De acordo com o procurador Marlon Weichert, essa será a quarta tentativa de investigar, processar e punir os responsáveis pelo assassinato de Herzog. As outras investigações acabaram sendo arquivadas devido à Lei da Anistia, promulgada em 1979 pelo general João Baptista Figueiredo, que garantiu perdão a todos que cometeram crimes relacionados ao regime militar.
Militares forjaram suicídio
Herzog nasceu na ex-Iugoslávia em 1937 e emigrou para o Brasil em razão da Segunda Guerra Mundial. Mais tarde, adotou a nacionalidade brasileira e se tornou um jornalista e fotógrafo reconhecido no país.
No dia 24 de outubro de 1975, durante o governo do general Ernesto Geisel (1974-1979), Herzog, então diretor de jornalismo da TV Cultura, foi intimado a depor por agentes da 2ª Divisão do Exército em São Paulo sobre suas ligações com o Partido Comunista.
Ele compareceu voluntariamente para depor, sendo torturado e morto no mesmo dia pelos militares. Para tentar encobrir o crime, o Exército afirmou que Herzog havia se suicidado e forjou uma fotografia em que ele aparecia enforcado.
A missa pela morte do jornalista, em dezembro do mesmo ano, se tornou um dos primeiros grandes atos pela restauração da democracia no país, reunindo cerca de 8 mil pessoas no centro de São Paulo, entre estes, vários artistas e intelectuais.
Em maio deste ano, a liberação ao público de um documento secreto de 1974 elaborado pela CIA, a agência de inteligência dos Estados Unidos, revelou que Geisel deu sua aprovação para uma política de "execução sumária" de "subversivos" durante o regime militar.
O documento, liberado pelo Departamento de Estado dos EUA, aponta que Geisel teria incumbido a Figueiredo, que viria a ser sucessor na Presidência, a analisar e autorizar pessoalmente qualquer execução. À época, o general chefiava o Serviço Nacional de Informações (SNI).
A repressão durante os 21 anos da ditadura no Brasil levou uma série de artistas e líderes políticos a deixar o país em busca de segurança e liberdade. Muitos só retornariam após a Lei da Anistia, promulgada em 1979.
Foto: picture-alliance/AP
Caetano Veloso
Após ter uma série de suas composições censuradas pelo regime militar, em dezembro de 1968 Caetano foi preso com o parceiro Gilberto Gil. Ambos foram acusados de terem desrespeitado o hino nacional e a bandeira do Brasil. Os dois músicos foram soltos apenas em fevereiro do ano seguinte. Depois de liberados da prisão, Caetano e Gil fizeram um show de despedida, em julho de 1969...
Foto: picture alliance
Gilberto Gil
Logo após a apresentação, os dois partiram para o exílio na Inglaterra, acompanhados de suas mulheres. Os dois casais se estabeleceram em Londres, no bairro de Chelsea, e a cidade serviu de inspiração para uma série de composições. A dupla retornaria ao Brasil apenas em 1972.
Foto: picture-alliance/dpa
Chico Buarque
Detido no fim de 1968, o músico foi interrogado sobre suas atividades pessoais e artísticas, consideradas "subversivas" pelo governo da ditadura. Em janeiro de 1969, depois de obter autorização dos militares, Chico seguiu rumo à França para uma apresentação em Cannes. Em seguida, iria para o exílio na Itália, onde passou a viver com a família em Roma.
Foto: picture-alliance/dpa
Ferreira Gullar
Militante do Partido Comunista Brasileiro, o poeta foi preso logo após a assinatura do Ato Institucional nº 5, de dezembro de 1968. Atuando na clandestinidade desde então, somente em 1971 é que Gullar deixou o país. Durante os anos de exílio, passou por Moscou, na Rússia; Santiago, no Chile; Lima, no Peru; e Buenos Aires, na Argentina. Seu retorno ao Brasil aconteceu somente em março de 1977.
Foto: José Olympio Editora/Cristina Lacerda
Fernando Henrique Cardoso
Ameaçado de prisão pelo regime logo após o golpe, Fernando Henrique foi para o Chile com a mulher, Ruth Cardoso. O casal ficou neste país até 1967 e depois seguiu para a França. Um ano mais tarde, FHC retornou ao Brasil para disputar a cátedra de Ciência Política na Universidade de São Paulo (USP). Com a instituição do AI-5, porém, foi aposentado compulsoriamente. Presidiu o Brasil de 1995 a 2002.
Foto: picture-alliance/dpa
Oscar Niemeyer
Membro do Partido Comunista Brasileiro desde 1945, o arquiteto foi perseguido pelo governo após o golpe. Impedido de trabalhar no Brasil, em 1967 seguiu para a França, onde se instalou em Paris, e recebeu autorização de Charles De Gaulle para exercer sua profissão no país. Reconhecido e valorizado no exterior, Niemeyer só voltou para o Brasil no início da década de 1980.
Foto: AP
Glauber Rocha
O aumento da repressão durante a ditadura fez com que o cineasta partisse para o exílio em 1971. Durante a temporada fora do Brasil – que duraria cinco anos –, Rocha passou por diversos países da América Latina, Europa e nos EUA. Executou uma série de projetos no período em que ficou no exterior e retornou ao Brasil apenas em 1976.
Foto: Filmmuseum Düsseldorf
Fernando Gabeira
No final dos anos 1960, o jornalista e ex-deputado ingressou na luta armada contra a ditadura militar, tendo participado do sequestro do embaixador americano Charles Elbrick. Foi preso e, depois de ser libertado, partiu para o exílio. Durante este tempo, passou por Chile, Suécia e Itália. Ficou dez anos fora do Brasil. Retornou com a anistia, no fim de 1979.
Foto: Getty Images
Augusto Boal
A entrada em vigor do AI-5 fez com que o dramaturgo deixasse o país com o Teatro Arena, em uma excursão de um ano, entre 1969 e 1970, por EUA, México, Argentina e Peru. Quando voltou ao Brasil, foi preso e torturado e decidiu seguir para a Argentina. Boal passaria ainda por uma série de outros países antes de voltar ao Brasil, em 1984.
Foto: CC-BY-SA-Thehero
Leonel Brizola
Após tentar organizar – sem sucesso – uma resistência ao golpe, o deputado deixou o Brasil ainda em 1964 para viver no Uruguai. Depois do país latino-americano, ele ainda passou pelos EUA e por Portugal. Seu retorno ao Brasil só aconteceria mais de dez anos depois: Brizola só voltou em 1979, após a anistia.