Ministro alemão é criticado após suicídio de migrante
Jefferson Chase av
11 de julho de 2018
Enquanto o chefe da pasta do Interior da Alemanha, Horst Seehofer, fazia piada sobre afegãos deportados, um deles se suicidava. Agora, até mesmo integrantes da coalizão no poder querem que ele deixe o governo.
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Nesta terça-feira (10/07), o ministro alemão do Interior, Horst Seehofer, fez uma piada que poderá sair pela culatra. Ao apresentar seu assim chamado "plano mestre" para a migração, gabou-se: "Vejam só, no meu aniversário de 69 anos, sem nenhuma ordem da minha parte, 69 pessoas foram enviadas de volta para o Afeganistão."
Na ocasião, o político conservador não podia imaginar que, algumas horas antes, um dos deportados havia se enforcado num campo provisório na capital afegã. O suicídio de Jamal Nasser Mahmoudi, de 23 anos, foi anunciado no dia seguinte pelo órgão encabeçado por Seehofer e confirmado por encarregados dos refugiados no Afeganistão. Em breve comunicado, o Ministério do Interior classificou a morte de "uma ocorrência profundamente lamentável".
Seehofer, que é também o presidente da União Social Cristã (CSU), da Baviera, é uma figura controvertida na Alemanha, desde que liderou a oposição à política de boas-vindas da chanceler federal Angela Merkel para com migrantes. Muitos temiam que a rebelião dele pudesse fazer naufragar o governo.
A crise foi evitada no início deste mês, graças a um consenso com a União Democrata Cristã (CDU), de Merkel, e o parceiro de coalizão minoritário, o Partido Social-Democrata (SPD). No entanto, os níveis de aprovação de Seehofer despencaram, e agora as vozes exigindo sua renúncia tornam-se cada vez mais audíveis, mesmo dentro da coalizão governamental.
Alguns social-democratas, já irritados com o que consideram a insolência do ministro, foram às redes sociais para exigir que ele entregue o cargo.
"Horst Seehofer é um cínico patético e inadequado a seu cargo, em termos de caráter", escreveu no Twitter o influente líder da ala jovem do SPD, Kevin Kühnert: "A renúncia dele já passou da hora. Tem alguém aí prestando atenção, coalizão?"
A representação do partido no estado mais populoso da Alemanha, a Renânia do Norte-Vestfália, concordou, comentando: "Um ministro do Interior tão carente de humanidade prejudica nossa democracia, à qual devemos tanto."
Cansel Kiziltepe, deputado social-democrata do Parlamento Federal, exigiu que Merkel demita o chefe de pasta. "Cínico, desumano e misantrópico!", tuitou. "Seehofer tem vidas humanas na consciência, e não pode ser mais tolerado como ministro, Sra. Merkel!"
AfD e CDU se calam
Críticas também partiram da oposição, naturalmente. O presidente do centro-direitista Partido Liberal Democrático (FDP) no estado da Renânia-Palatinado, Volker Wissing, lembrou: "Enquanto ministro do Interior, Horst Seehofer é também o ministro da Constituição e, como tal, guardião da ordem fundamental democrática livre e dos nossos valores. Ele mostrou conclusivamente que não está à altura do desafio."
"Um ministro do Interior que expressa publicamente alegria por ter gente sendo mandada de volta para um país em guerra, não só obviamente carece de empatia humana, mas também das qualificações para o emprego", reforçou Ulla Jelpke, porta-voz do partido A Esquerda para assuntos internos. "Em minha opinião, Seehofer merece ser demitido."
"É óbvio que ele está moralmente sobrecarregado para esse posto e é simplesmente inadequado para realizar seu trabalho com responsabilidade", declarou numa rádio alemã Toni Hofreiter, chefe da bancada parlamentar do Partido Verde.
Os principais líderes da Alternativa para a Alemanha (AfD), legenda anti-imigração e populista de direita que ingressou no Parlamento após as eleições de 2017, não comentou imediatamente o assunto – da mesma forma que quaisquer figuras da liderança da CDU, ou a própria Merkel.
Na noite desta quarta-feira, Seehofer se encontra com ministros da Justiça e do Interior de outros Estados-membros da União Europeia em Innsbruck, na Áustria. Isso distrairá um pouco da controvérsia criada por seu comentário em relação aos migrantes deportados. No entanto, está claro que Seehofer se transformou num risco político para o governo Merkel, e seus dias à frente da pasta do Interior podem estar contados.
Ao longo de sua carreira, chanceler alemã deixou para trás diversos oponentes, inclusive seu mentor político, Helmut Kohl. Mas ele não foi o único homem no caminho de Merkel.
Foto: AP
Helmut Kohl, antigo mentor
O que dizem esses olhos? Gratidão? Afeição? Ou um sentimento de: "Eu nunca vou te perdoar!" Em meio ao caso de caixa 2 da União Democrata Cristã (CDU), em 1999, a então secretária-geral Merkel instou o partido a "entrar na luta mesmo sem seu antigo cavalo de batalha". Isso selou fim político do então presidente honorário da CDU e mentor político de Merkel, Helmut Kohl, aqui em reunião de 2012.
Foto: Reuters
Seu chefe no Leste: Lothar de Maizière
Dizer que Angela Merkel passou para trás o último premiê da antiga Alemanha Oriental seria exagero. Mas Lothar de Maizière teve que assistir ao desmoronamento de seu antigo país enquanto sua jovem vice-porta-voz Angela Merkel acompanhava as conversações para o Tratado de Reunificação, apostando assim na carta certa.
Foto: cc-by-sa/Bundesarchiv
Roland Koch, mais à direita
Alguns nostálgicos sonhadores na coligação CDU/CSU associam o devaneio a um sério senhor de Hessen: o ex-governador Roland Koch era visto como uma figura de orientação conservadora na CDU. Acredita-se que ele tenha pertencido ao círculo chamado "Pacto Andino" (combinado num voo para o Chile), que se tornou uma panelinha dentro da União CDU/CSU. Merkel escapou ilesa.
Foto: picture-alliance/dpa
Friedrich Merz, futuro interrompido
Sim, o Sr. Merz. Ele tinha uma carreira brilhante pela frente: como ministro das Finanças, com certeza, talvez até mesmo como chanceler federal. Um homem de sagacidade afiada, ternos bem ajustados e boas conexões na União CDU/CSU. Merkel, porém, afastou o político da Vestfália, em 2001, da liderança da bancada parlamentar da aliança de partidos conservadores.
Foto: picture-alliance/dpa/B. von Jutrczenka
Norbert Röttgen: demitido
Na foto, o ex-presidente alemão Joachim Gauck (dir.) caminha ao lado de Angela Merkel na residência presidencial em Berlim, Palácio Bellevue. Por trás deles, vê-se o demissionário ministro do Meio Ambiente, Norbert Röttgen. Depois de perder a eleição para governador na Renânia do Norte-Vestfália como candidato da CDU e ter posto a culpa também em sua chefe, Röttgen caiu em desgraça e foi demitido.
Foto: dapd
Gerhard Schröder subestimou Merkel
Quando Schröder perdeu a eleição para Merkel em 2005, ele esperou, inicialmente, que seu Partido Social-Democrata (SPD) recusasse negociações com vista a uma grande coalizão de governo. "Que bom que vocês ainda me chamem de chanceler", bradava Schröder ainda na noite eleitoral, enquanto sua adversária já fazia as contas da aritmética do poder. Dois meses depois, Merkel era eleita chanceler.
Foto: picture-alliance/AP Photo/J. Finck
Arranjo de Poder: Wolfgang Schäuble
Wolfgang Schäuble poderia ter sido alguém perigoso para Merkel. Mas Kohl não transferiu o poder para seu "príncipe-herdeiro". Um atentado que o deixou paraplégico e seu envolvimento no escândalo de doações da CDU em 2000 marcaram o fim de sua carreira como líder partidário e de bancada. Merkel o nomeou ministro das Finanças, mas frustrou suas aspirações ao cargo de chanceler federal.
Foto: picture alliance/AP Photo/M. Meissner
Edmund Stoiber, uma conta em aberto
Atualmente, Edmund Stoiber, ex-governador da Baviera pela União Social Cristã (CSU), pode ser visto em "talk shows" falando veementemente contra a política de refugiados de Merkel. A atual chanceler federal desistiu de sua candidatura nas eleições parlamentares de 2002 em prol de Stoiber, que parece ainda não ter se recuperado da derrota para Schröder. Ele nunca quis ser ministro sob Merkel.
Foto: picture-alliance/U. Baumgarten
Horst Seehofer, o rebelde
Na disputa pelo poder na Baviera, Horst Seehofer abriu o caminho para Markus Söder e aceitou o cargo de ministro do Interior em Berlim, ao lado de sua chefe, Angela Merkel, que ele humilhou publicamente num congresso da CSU em 2015. Quem precisa de inimigos quando se tem tal ministro? O que Seehofer quer? Menos refugiados ou menos Merkel?
Foto: Reuters/H. Hanschke
Era uma vez Martin Schulz
Martin Schulz, ex-presidente do Parlamento Europeu (dir.), perdeu as eleições parlamentares de 2017 como candidato do SPD. A princípio, recusou-se a formar um governo com Merkel; depois, negou-se a formar um governo sem Merkel e, no final, saiu de mãos abanando. Como deputado em Berlim, nada mais lhe resta que assistir à chanceler governar – se Seehofer (c.) deixar.
Foto: Getty Images/C. Koall
Donald Tusk, amizade desbotada
Na foto, Merkel conversa com o presidente do Conselho Europeu, o polonês Donald Tusk (dir.). Ele foi durante muito tempo um importante aliado dos alemães, que também o ajudaram na sua ascensão tardia em Bruxelas. Recentemente, Tusk parece ter procurado distância, frustrando até mesmo tentativas de Merkel com vista a uma solução europeia para crise migratória, de acordo com correspondentes.
Foto: picture-alliance/AP Photo/J. Macdougal
Jens Spahn veio para ficar
Jens Georg Spahn é: político da CDU, deputado federal, ministro alemão da Saúde, conservador – e, segundo escreveu a agência de notícias DPA em 2016, um "oponente da chanceler". Para surpresa de alguns analistas, Merkel decidiu trazer Spahn para seu gabinete. Se a intenção de Merkel foi "controlá-lo", funcionou melhor do que com o ministro do Interior, Horst Seehofer.
Foto: picture-alliance/dpa/M. Kappeler
Alexander Gauland, antigo "correligionário"
O líder da bancada parlamentar da legenda populista de direita AfD, Alexander Gauland, foi um influente membro da CDU até 2013. Há poucas fotos comuns de Gauland e Merkel: não é o tipo de entorno que desperta o interesse da chanceler . Mas quando ele fala no Bundestag, ela às vezes escuta. E ela certamente ouve as vozes advertindo que o caos na União CDU/CSU beneficiou acima de tudo a AfD.