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"Missão cumprida": mas qual é o plano para Síria?

Michael Knigge
15 de abril de 2018

Trump correu para declarar ataque como meta atingida. Mas o que ele fez agora não é muito diferente do que já fizera em 2017. Questão síria vai muito além de Assad, e EUA parecem não ter estratégia para lidar com isso.

Imagem de Assad em Ghouta Oriental, região retomada pelo regime com ajuda russa
Imagem de Assad em Ghouta Oriental, região retomada pelo regime com ajuda russaFoto: Getty Images/AFP/Y. Karwashan

O presidente americano Donald Trump, seu governo e o Pentágono foram enfáticos ao rapidamente declararem o bombardeio da madrugada de sábado (14/04) como "missão cumprida". Mas qual é, de fato, a missão dos Estados Unidos na Síria?

O discurso é de que os mais de cem mísseis lançados tinham como objetivo destruir o arsenal químico do regime de Bashar al-Assad e impedir que ele volte a usar esse tipo de arma – como fez, segundo EUA e seus aliados, em Duma recentemente.

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O ataque aconteceu um ano após uma ação americana semelhante, mas de proporção menor, que mirou uma base aérea síria com mais de 50 mísseis.  A ação, na ocasião, também foi uma retaliação ao uso de armas químicas por Assad.

Desta vez, o bombardeio americano foi cercado de dias de expectativa, numa intervenção que, como vem virando rotina em Washington, começou pelo Twitter: com Trump ameaçando Assad, Irã e Rússia, com implicações para a região politicamente mais volátil do mundo.

Quando o ataque de fato aconteceu, teve aliados importante – França e Reino Unido, com apoio uníssono da União Europeia – e um alcance limitado, com três alvos apenas. No final, avaliam observadores, algo bem diferente do que bradava Trump.

E isso leva a algumas perguntas. Uma delas é se o bombardeio realmente foi suficiente para fazer a mensagem – não use mais armas químicas – chegar a Assad. Há um ano, isso claramente não funcionou.

"Não estou convencido", opina Ryan Crocker, ex-embaixador americano em Iraque, Afeganistão e Paquistão. "Basicamente fizemos a mesma coisa de 2017, numa escala um pouco maior. Isso não vai minar a capacidade de Assad de usar armas químicas no futuro."

Para Philip Breedlove, ex-chefe das tropas americanas e da Otan na Europa, essa é exatamente a questão que fica em aberto. "Não esqueça que esse criminoso, esse monstro que lidera a Síria, tem o apoio da Rússia e do Irã", comenta.

Para muitos, como Mona Yacoubian, especialista em Síria do americano Instituto da Paz, mudar o cálculo de Assad provavelmente demandaria uma ameaça aos alicerces de seu regime. "E esses bombardeios foram limitados demais para isso", analisa.

O que Assad consegue sozinho

Tanto Rússia como Irã perseguem o objetivo de se estabelecer como potências capazes de determinar os rumos no Oriente Médio. Ao mesmo tempo, querem restringir a influência dos EUA na região.

A guerra síria, em seu sétimo ano, deixou um vácuo de poder na região, que as potências – não apenas regionais – tentam preencher de forma cada vez mais decisiva. Nesta guerra, há muito tempo o mais importante deixou de ser os interesses da oposição ou de Assad.

Em jogo está algo de maior dimensão. Enquanto Rússia e Irã, aliados do regime sírio, tentam ampliar sua influência na região, seus adversários – sobretudo EUA e, cada vez mais, Israel – buscam evitar isso.

"Lembre: Assad, sozinho, não é capaz de fazer todas essas coisas que estão acontecendo a seu redor. Ele é capacitado, encorajado e empoderado por Rússia e Irã", comenta Breedlove. "Se eles falarem 'não fala isso de novo', ele provavelmente não o fará", complementa Crocker.

Para o ex-embaixador, é importante olhar especialmente para o Irã neste caso. "Não acho que os iranianos estão de acordo com isso. Eles sofreram com muitos ataques químicos na guerra com o Iraque, sabem o que é passar por isso".

E a Rússia, diz Yacoubian, apesar da retórica belicosa, também não teria interesse numa escalada do conflito com os EUA na Síria e poderia estar inclinada, ela mesma, a conter o uso de armas químicas por Assad.

Quem pode influenciar o presidente

Crocker vê como positiva a decisão americana de, desta vez, não atacar sozinho, mas avalia com preocupação a não participação de outros países, além de França e Reino Unido, na ação. O diplomata lembra que os cem anos do Tratado de Versalhes estão chegando, e esse é um mau sinal para o mundo árabe.

"Ninguém no Ocidente vai tuitar sobre isso, mas todo mundo no Oriente Médio vai: porque foram os britânicos e franceses, é claro, que dividiram os territórios otomanos no Oriente Médio", diz o ex-embaixador.

Dias antes do ataque, o Pentágono parecia tentar conter o ímpeto de guerra, com o secretário de Defesa, James Mattis, alertando para os riscos de um conflito maior. A forma como o bombardeio foi executado leva a crer que ele teve influência na decisão final.

"Está claro que ele foi capaz de acalmar o presidente", diz Crocker. "Não são muitas as pessoas que conseguem fazer isso." A pergunta agora, segundo especialistas, é se Trump vai continuar a ouvir seus assessores, especialmente com a ascensão do linha-dura John Bolton como conselheiro de segurança nacional da Casa Branca.

Também desperta interesse se a nova equipe ao redor de Trump – Mattis, Bolton e Mike Pompeo, que deve ser confirmado como secretário de Estado – vai se ocupar da questão que Crocker, como diplomata, considera central: "Ainda não há uma estratégia para a Síria em Washington".

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