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Moro depõe por oito horas sobre acusações contra Bolsonaro

3 de maio de 2020

Ex-ministro foi ouvido na sede da Polícia Federal em Curitiba, no inquérito que investiga se o presidente tentou interferir politicamente na corporação. Segundo jornal, Moro apresentou novas provas contra o mandatário.

Sergio Moro, ex-juiz e ex-ministro da Justiça
Ao anunciar sua demissão em 24 de abril, Moro acusou Bolsonaro de tentar interferir politicamente na PFFoto: Reuters/U. Marcelino

O ex-juiz e ex-ministro da Justiça Sergio Moro concluiu seu depoimento de mais de oito horas na Superintendência da Polícia Federal (PF) em Curitiba na noite deste sábado (02/05). O testemunho ocorreu no âmbito da investigação aberta contra o presidente Jair Bolsonaro, acusado de tentar interferir politicamente na PF.

Moro chegou por volta das 13h15 à sede da corporação em Curitiba, cidade onde liderou, como magistrado, a operação anticorrupção Lava Jato e condenou vários empresários e políticos, incluindo o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Ele deixou o prédio por volta da meia-noite, segundo a imprensa brasileira, sem falar com os jornalistas presentes. O jornal Folha de S. Paulo relatou que o depoimento durou cerca de oito horas, entre 14h e 22h, aproximadamente.

Desta vez foi o ex-juiz a se submeter às perguntas de delegados da PF, sob o olhar de três procuradores nomeados para acompanhar as diligências pelo procurador-geral da República, Augusto Aras, que foi quem pediu a abertura da investigação. A oitiva foi conduzida também pela delegada Christiane Correa Machado, chefe do chamado Serviço de Inquéritos Especiais (Sinq), que apura investigações em trâmite no Supremo Tribunal Federal (STF).

Segundo o jornal O Globo, em seu depoimento Moro reafirmou, desta vez oficialmente à Polícia Federal, as acusações feitas contra Bolsonaro no pronunciamento em que anunciou sua demissão do Ministério da Justiça, em 24 de abril.

O ex-ministro também teria entregado provas contra o presidente sobre sua atuação para interferir diretamente na PF, e colocado à disposição seu celular, para que os investigadores tenham acesso a conversas mantidas por ele em aplicativos de mensagens.

Moro já havia mostrado ao Jornal Nacional, da TV Globo, uma troca de mensagens com Bolsonaro, em que o presidente cobra a troca do comando da Polícia Federal após citar uma investigação envolvendo aliados do governo. Segundo O Globo, o ex-ministro apresentou novas provas à PF neste sábado, além das mensagens já divulgadas pela imprensa brasileira.

A Procuradoria-Geral da República (PGR) havia pedido que, na oitiva, Moro fizesse uma "manifestação detalhada sobre os termos do pronunciamento [que anunciou sua demissão], com a exibição de documentação idônea que eventualmente possua acerca dos eventos em questão".

Citado pelo jornal carioca, o advogado de Moro, Rodrigo Sanches Rios, informou em nota que, "como a investigação está em andamento, nossa manifestação será apenas nos autos".

À espera do ex-juiz, tanto manifestantes pró-Moro quanto adeptos de Bolsonaro se concentraram desde a manhã de sábado próximo à sede da polícia. Registraram-se protestos e momentos de tensão, rapidamente apaziguados pelos agentes locais, segundo a imprensa.

Horas antes de o ex-ministro começar seu depoimento na Superintendência da Polícia Federal, Bolsonaro se referiu a ele como "Judas", à saída do Palácio da Alvorada, em Brasília. Neste domingo, em aparente referência à fala de seu ex-chefe, Moro escreveu no Twitter: "Há lealdades maiores do que as pessoais."

O juiz do Supremo Tribunal Federal (STF) Celso de Mello ordenara na quinta-feira que Moro testemunhasse no prazo máximo de cinco dias, após as graves acusações que lançou contra Bolsonaro ao se demitir. Caso se conclua que não são verdadeiras, o ex-ministro poderá ter que responder por denunciação caluniosa e crimes contra a honra.

Em entrevista à revista Veja na última quinta-feira, Moro afirmou que não vai admitir ser chamado de mentiroso e disse ter provas contra Bolsonaro. "Reitero tudo o que disse no meu pronunciamento. Esclarecimentos adicionais farei apenas quando for instado pela Justiça. As provas serão apresentadas no momento oportuno, quando a Justiça solicitar", afirmara.

O embate entre Moro e Bolsonaro

Em 24 de abril, Moro entregou o cargo de ministro da Justiça e Segurança Pública, que ocupava desde janeiro de 2019, na sequência da demissão do ex-chefe da Polícia Federal Maurício Valeixo. Em pronunciamento, ele acusou Bolsonaro de tentar usar a corporação para bloquear investigações contra seus familiares e aliados políticos.

Segundo Moro, o presidente queria na chefia da PF "uma pessoa da confiança pessoal dele, que ele pudesse ligar, que ele pudesse colher informações, relatórios de inteligência". Ainda segundo o ex-ministro, Bolsonaro "tinha preocupação com inquéritos em curso no STF".

Moro ainda acusou o governo de falsificar a publicação do Diário Oficial sobre a saída de Valeixo, que informara que a demissão ocorreu "a pedido" deste. O ex-ministro afirmou que o ex-diretor nunca solicitou a demissão. A publicação ainda trazia a assinatura eletrônica de Moro. "Eu não assinei esse decreto", disse.

Bolsonaro rebateu algumas das acusações de Moro em um pronunciamento no mesmo dia. Ao lado de vários de seus ministros, o presidente acusou seu ex-aliado de condicionar uma troca no comando da PF a uma indicação do seu próprio nome para uma vaga no STF.

Momentos depois, o procurador-geral Augusto Aras pediu ao Supremo autorização para investigar possíveis crimes cometidos por Moro ou por Bolsonaro.

No inquérito, o presidente será investigado se cometeu obstrução de Justiça e advocacia administrativa, caso realmente tenha usado a PF para interferir em investigações, ou falsidade ideológica, ao colocar a assinatura de Moro na exoneração do então diretor da PF sem que o então ministro da Justiça tivesse de fato a assinado, entre outros crimes.

Já Moro pode ter de responder por crime de denunciação caluniosa se não tiver provas de que Bolsonaro realmente tenha tentado usar a PF para proteger aliados, ou prevaricação, se for provado que ele sabia de eventuais crimes cometidos pelo presidente e não cumpriu sua obrigação como ministro da Justiça de denunciá-los.

EK/ots

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