Morre Dick Cheney, arquiteto da "guerra ao terror"
4 de novembro de 2025
Dick Cheney, o neoconservador controverso que se tornou um dos vice-presidentes mais poderosos e polarizadores da história dos EUA e arquiteto da "guerra ao terror" morreu aos 84 anos, segundo comunicado divulgado por sua família nesta terça-feira (04/11).
Cheney, que morreu de complicações de uma pneumonia e doenças cardíacas, enfrentou problemas cardíacos durante décadas e chegou a realizar um transplante de coração.
Discreto, porém incisivo, Cheney serviu a dois presidentes, pai e filho, liderando as Forças Armadas como secretário de Defesa durante a Guerra do Golfo Pérsico no governo de George H.W. Bush, antes de retornar à vida pública como vice-presidente no governo de George W. Bush.
Em seu mandato, de 2001 a 2009, a vice-presidência deixou de ser mero cargo cerimonial. Cheney a transformou numa rede de canais reservados para influenciar políticas sobre o Iraque, terrorismo, poderes presidenciais, energia e outros pilares de uma agenda conservadora.
Guerra no Iraque marca sua vice-presidência
Sua vice-presidência, sob W. Bush, foi também definida pela era do terrorismo e pelo que ficou conhecido como "guerra ao terror".
Cheney defendeu de forma consistente o uso de ferramentas extraordinárias de vigilância, detenção e interrogatório em resposta aos ataques terroristas de 11 de setembro de 2001.
No entanto, tribunais derrubaram seus esforços para ampliar poderes presidenciais e autorizar tratamentos duros a suspeitos de terrorismo, entre eles técnicas que configuravam tortura, como afogamento simulado (waterboarding) e privação de sono.
Anos depois, ele defenderia publicamente o uso das técnicas. "Chamar o interrogatório reforçado de programa de tortura (...) é difamar os profissionais dedicados que salvaram vidas americanas e apresentar terroristas e assassinos como vítimas inocentes", disse, em 2015.
Nos meses após os ataques de 2001, Cheney atuou muitas vezes de locais não revelados, separado de Bush para garantir que um dos dois sobreviveria a eventual ataque sucessivo à liderança do país.
Linha-dura e cada vez mais isolado na administração Bush, Cheney alegou vínculos, nunca comprovados, entre os ataques de 2001 contra os EUA e o Iraque pré-guerra, se tornou um forte defensor da invasão ao país do Oriente Médio em 2003, que acabaria abrindo a porta para uma guerra civil que deixaria um saldo de centenas de milhares de mortos.
Ele e esteve entre os mais contundentes membros do governo a alertar sobre o perigo do suposto arsenal iraquiano de armas de destruição em massa. Nenhuma dessas armas foi encontrada.
Cheney também acreditava que tropas americanas seriam recebidas como libertadoras no Iraque e declarou que a insurgência iraquiana estava em sua derrocada em maio de 2005, quando 1.661 militares americanos foram mortos.
O conflito acabou se estendendo por anos, mas Cheney insistiu, anos depois, que a invasão foi a decisão correta com base nas informações disponíveis à época e pela consequente remoção do então presidente iraquiano Saddam Hussein do poder.
Décadas na Casa Branca
Cheney foi para Washington em 1969 como estagiário do Congresso e ocupou vários cargos na Casa Branca durante os governos republicanos de Richard Nixon e Gerald Ford, incluindo a chefia de gabinete, antes de se tornar ministro. No final dos anos 1990, estava atuando na Halliburton Corporation quando W. Bush o escolheu para ser seu companheiro de chapa na eleição presidencial de 2000.
Sua esposa, Lynne, tornou-se uma voz conservadora em temas culturais. Liz, a filha mais velha, foi eleita para o Congresso em 2016, após construir uma reputação de defender posições de política externa intervencionistas semelhantes às do pai.
Ela se tornou uma influente parlamentar republicana, mas perdeu sua cadeira após se opor a Donald Trump e votar por seu impeachment após o ataque de 6 de janeiro de 2021 ao Capitólio. Seu pai, que concordou com ela, disse que votaria na candidata democrata Kamala Harris em 2024.
"Em toda a história de 248 anos da nossa nação, nunca houve alguém que representasse uma ameaça maior à nossa república do que Donald Trump", disse o homem que por muito tempo fora inimigo da esquerda.
Apesar do perfil conservador, Cheney defendeu pautas progressistas, como o apoio ao relacionamento entre pessoas do mesmo sexo, o que o colocou em desacordo com a tentativa do governo Bush de aprovar uma emenda constitucional contra o casamento gay.
Sua vida controversa continuou a persegui-lo mesmo após deixar o governo Bush. Ele foi tema de um filme biográfico crítico em 2018 chamado Vice, estrelado por Christian Bale, que ganhou 18 kg e raspou a cabeça para imitar a barriguinha e a calvície do ex-vice-presidente.
gq/jps (AP, Reuters, OTS)