Morte de guarda de Auschwitz priva sobreviventes de justiça
8 de abril de 2016
Ernst Tremmel, de 93 anos, morreu uma semana antes de ir a tribunal na Alemanha, acusado de cumplicidade em 1.075 assassinatos. Nonagenários que resistiram ao campo de concentração aguardavam julgamento.
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A morte de um ex-guarda de Auschwitz dias antes de seu julgamento na Alemanha frustrou as esperanças de dois judeus idosos que sobreviveram ao regime nazista e buscavam justiça para seus pais, que morreram quando o acusado trabalhava no campo de extermínio.
Ernst Tremmel, de 93 anos, morreu nesta quinta-feira (07/04), uma semana antes de ir a tribunal. Ele era acusado de cumplicidade em 1.075 assassinatos quando trabalhava no campo de extermínio e iria ser julgado a partir da próxima quarta-feira na cidade de Hanau.
Israel Löwenstein, sobrevivente do Holocausto e hoje com 91 anos, e Henry Foner, um químico de 83 anos, esperavam que Tremmel enfrentasse a Justiça mesmo no fim da vida. "Mas, por outro lado, nem sabemos se ele teria dito a verdade sobre Auschwitz – muitos dos acusados não dizem, afinal", disse Löwenstein, depois de saber da morte do ex-guarda.
"Nunca pode haver um ponto final. Um ponto final para mim é sem sentido – você não pode recuperar o que foi tomado", acrescenta Foner, após reconhecer ser positivo que a Alemanha esteja julgando os últimos cúmplices vivos do Holocausto. "Mas isso, por algum motivo, não me comove", ressalta.
Tremmel serviu na divisão Totenkopf da SS, processando a chegada de prisioneiros, e teria estado diretamente envolvido em três transportes, vindos de Berlim, da cidade francesa de Drancy e de Westerbork, na Holanda.
"Entre os deportados, pelo menos 1.075 pessoas foram cruelmente assassinadas imediatamente após a chegada em Auschwitz", afirmou o tribunal de Hanau ao anunciar o julgamento, em fevereiro.
O difícil legado da cidade de Auschwitz
03:24
Por Tremmel ter entre 19 e 20 anos na época de seus supostos crimes, ele deveria ser julgado sob a lei penal juvenil, apesar de sua idade avançada. Devido à sua saúde frágil, o tribunal tinha ordenado que as audiências se limitassem a quatro horas por dia.
Precedente
O fundamento legal para processar ex-nazistas mudou em 2011, com a condenação na Alemanha do ex-guarda de campo de extermínio John Demjanjuk. O veredicto foi baseado no fato de ele ter trabalhado no campo de Sobibor, na Polônia ocupada, sem que fosse necessário comprovar o envolvimento direto dele nos assassinatos. Antes desse precedente, a Justiça alemã requeria que fosse atestada a culpa do réu em um crime específico, o que dificultava o trabalho da acusação em tais casos.
Tremmel era um dos 14 suspeitos que foram alvo de ações coordenadas pelas autoridades alemãs em fevereiro de 2014, numa tentativa de levar à Justiça os últimos autores vivos do Holocausto.
No entanto, o julgamento de um ex-médico de Auschwitz – Hubert Zafke, de 95 anos – na cidade de Neubrandenburg, sob a acusação de cumplicidade em 3.681 assassinatos, foi suspenso pela segunda vez no mês passado. O motivo foi a saúde precária do acusado, levantando dúvidas sobre se o caso poderá prosseguir.
Um terceiro homem, o ex-guarda da SS Reinhold Hanning, de 94 anos, foi a julgamento em 11 de Fevereiro deste ano, acusado de cumplicidade em 170 mil mortes em Auschwitz.
MD/rtr/afp
A arte e os horrores de Auschwitz
Exposição em Berlim mostra a obra de artistas que sobreviveram aos campos de concentração nazistas. Além de documentar atrocidades, eles fizeram arte.
Foto: Staatliches Museum Auschwitz-Birkenau in Oœwiêcim
Os artistas esquecidos
Enquanto a chamada "arte degenerada" dos artistas perseguidos pelo nazismo desperta atenção, quase ninguém conhece o trabalho dos artistas que estavam em campos de concentração. Pintores como Waldemar Nowakowski (foto) estão quase esquecidos. Por isso a importância do livro e da exposição "A morte não tem a última palavra", a ser aberta no prédio do Bundestag em Berlim, a partir de 27 de janeiro.
Foto: Staatliches Museum Auschwitz-Birkenau in Oœwiêcim
Horrores de Theresienstadt em gravura
Por mais de 15 anos, o autor, curador e historiador de arte Jürgen Kaumkötter se dedicou à arte dos perseguidos entre 1933 e 1945. Para isso, não considerou apenas quadros que surgiram nessa época, mas também aqueles que tematizaram os acontecimentos em retrospecto. Leo Haas executou esta gravura sobre Theresienstadt em 1947. Mas há também obras feitas no campo de concentração.
Foto: Bürgerstiftung für verfolgte Künste – Else-Lasker-Schüler- Zentrum – Kunstsammlung Gerhard Schneider
Pinturas no "museu do campo"
É sabido que artistas pintaram em Theresienstadt. Mas também em Auschwitz 1 houve um "museu do campo". Lá havia lápis, papel, pincéis à disposição dos artistas, para que executassem encomendas para a SS. Outros motivos surgiram secretamente. Em contrapartida, praticamente não há obras de arte oriundas de Auschwitz 2. Na foto: "Autorretrado de Marian Ruzamski", de 1943/44.
Foto: Staatliches Museum Auschwitz-Birkenau in Oœwiêcim
Imagem de sonhos em Auschwitz
O artista Jan Markiel criou esse retrato, em 1944, sem os materiais que tinha oficialmente à disposição em Auschwitz 1. A filha do padeiro do vilarejo próximo de Jawiszowice ajudou o prisioneiro trazendo pão e intermediando mensagens para a resistência. A têmpera utilizada pelo artista veio de pigmentos raspados da parede. O tecido grosso dos colchões de palha serviu como tela.
Foto: Staatliches Museum Auschwitz-Birkenau in Oœwiêcim
Testemunha dos crematórios
Em 1942, aos 13 anos, Yehuda Bacon (na foto, à dir.) veio para Theresienstadt e, em dezembro de 1943, para Auschwitz-Birkenau. Ele foi utilizado como mensageiro – podendo se aquecer nos fornos dos crematórios no inverno. O que testemunhou, ele relatou não somente durante o célebre Julgamento de Auschwitz em Frankfurt, mas também expressou nos desenhos que executou após a guerra.
Foto: Bürgerstiftung für verfolgte Künste – Else- Lasker-Schüler-Zentrum – Kunstsammlung Gerhard Schneider
Símbolo da morte
Yehuda Bacon mostrou esse desenho aos juízes em Frankfurt, como prova dos crimes cometidos em Auschwitz: chaminés retangulares dos crematórios, um chuveiro, pessoas que são apenas esboços. Para o historiador da arte Kaumkötter, esse desenho é um símbolo da morte nas câmaras de gás e da sepultura nos céus. Trata-se não somente de um testemunho, mas também de uma grande obra de arte.
Foto: Yehuda Bacon
A segunda geração
Michel Kichka é um dos cartunistas mais influentes de Israel. Em 2014, ele publicou a novela gráfica "Segunda geração – o que o meu pai nunca me contou", sobre o menino Kichka e o seu pai, sobrevivente de Auschwitz. Os traumas do pai passaram para o filho. Somente quanto ouve o pai contar piadas sobre o campo, Kichka consegue superar seus pesadelos.
Foto: Egmont Graphic Novel
Metáforas do Holocausto
Também os pais da artista israelense Sigalit Landau são sobreviventes do Holocausto, e o professor de desenho dela foi Yehuda Bacon, que trabalha até hoje como artista e professor de arte em Israel. Os trabalhos de Landau são repletos de alusões metafóricas ao Holocausto, como estes sapatos, que logo lembram a montanha de calçados que ainda hoje pode ser vista na exposição permanente de Auschwitz.
Foto: Sigalit Landau
A morte não tem a última palavra
Sigalit Landau coletou cem pares de sapatos em Israel e os afundou no Mar Morto. O mar os envolveu com uma camada de sal curativa – eles se tornaram símbolo da vida, em vez da morte. O desejo da artista era mostrá-los em Berlim, como sinal de que a esperança derrota o desespero. A mostra "A morte não tem a última palavra" está em cartaz até o dia 27 de fevereiro no prédio do Bundestag, em Berlim.