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Revolta após morte de médico que alertou sobre coronavírus

8 de fevereiro de 2020

Li Wenliang foi repreendido pela polícia de Wuhan após alertar sobre nova doença em dezembro. Após a sua morte, pelo coronavírus, chineses manifestam indignação e questionam regime nas redes sociais, algo raro no país.

Li Wenliang
Li Wenliang alertou sobre um novo tipo de coronavírus semelhante à SarsFoto: picture-alliance/AP

A morte, pelo novo coronavírus, de um médico chinês que havia sido punido por emitir um alerta sobre a doença desencadeou uma onda de luto no país nesta sexta-feira (07/02), além de expressões online de raiva e repúdio contra o governo chinês, algo raro no país.

Oftalmologista num hospital em Wuhan, epicentro do surto doença respiratória, Li Wenliang se tornou uma das figuras mais conhecidas da atual crise após revelar publicamente que foi um dos oito médicos repreendidos pela polícia da cidade chinesa no mês passado, após "espalhar boatos" sobre o coronavírus.

"Wuhan, realmente, deve desculpas a Li Wenliang. E as autoridades de Wuhan e de Hubei [província central chinesa cuja capital é Wuhan] também devem desculpas solenes à população de Hubei e deste país", postou na plataforma chinesa Weibo (similar ao Twitter) Hu Xijn, o editor do Global Times, tabloide apoiado pelo regime.

A notícia da morte de Li, aos 34 anos, se tornou o assunto mais lido no Weibo nesta sexta, com mais de 1,5 bilhão de visualizações, e também estava sendo amplamente discutida em grupos privados de mensagens da plataforma WeChat, nos quais usuários expressaram indignação e tristeza.

Também há indícios de que discussões sobre a morte do oftalmologista estavam sendo censuradas, especialmente as mensagens críticas ao governo. Assuntos marcados com "a prefeitura de Wuhan deve desculpas ao médico Li Wenliang" e "queremos liberdade de expressão" chegaram aos trending topics (assuntos mais comentados) no Weibo na noite de quinta, mas não davam resultados em buscas efetuadas nesta sexta.

Uma selfie de Li deitado num leito de hospital no início da semana, com uma máscara de oxigênio e mostrando sua carteira de identidade chinesa, está sendo amplamente compartilhada.

O caso do médico é controverso para a liderança chinesa após Pequim ser acusada de encobrir informações sobre o real alcance da Síndrome Respiratória Aguda Grave (Sars) em 2003. Autoridades pediram transparência durante a crise do novo coronavírus.

As autoridades locais de Hubei e Wuhan já haviam sofrido críticas inéditas e sem censura nas últimas semanas por, aparentemente, terem minimizado o tamanho do surto. Enquanto a Organização Mundial da Saúde (OMS) e especialistas elogiaram a China por suas medidas decisivas para conter o vírus, críticos dizem que o governo local perdeu muito tempo com falta de ação.

A revolta contra a morte de Li parece ter pego o aparato de propaganda do governo central chinês rigorosamente controlado de surpresa. Nas últimas semanas, instâncias de censura haviam liberado os usuários para criticarem autoridades de Hubei livremente – uma decisão que, segundo analistas, focou a atenção da população nos políticos locais em vez do governo central.

Porém, após a morte do médico, as críticas ultrapassaram a raiva direcionada aos representantes locais, e usuários criticam passaram a criticar a natureza do próprio regime comunista.

Relatos sobre a morte de Li apareceram em veículos estatais antes da meia-noite de quinta-feira (horário chinês), foram removidos, e voltaram a ser publicados na manhã de sexta.

O hospital de Wuhan onde o oftalmologista trabalhava divulgou em sua conta no Weibo que ele morreu às 02h58 da manhã desta sexta.

A Comissão Central da China para Inspeção de Disciplina, que pune casos de corrupção de autoridades, afirmou que enviaria investigadores a Wuhan para apurar "temas levantados pela população em conexão com o Dr. Li Wenliang", sem dar maiores detalhes.

A Organização Mundial da Saúde afirmou via Twitter estar "profundamente triste" com a notícia da morte do médico. A Comissão Nacional de Saúde da China e o governo regional de Wuhan também emitiram declarações de condolências.

Em dezembro passado, Li disse a um grupo de médicos pelo aplicativo de mensagens WeChat que sete casos de uma doença semelhante à Sars havia sido ligada a um mercado de frutos do mar em Wuhan.

Acredita-se que o mercado seja a fonte da transmissão do vírus para seres humanos. Segundo a agência Reuters, Li postou uma foto do resultado de testes confirmando um coronavírus "semelhante ao da Sars" numa amostra de um paciente.

Uma carta da polícia com data do dia 3 de janeiro endereçada a Li dizia que ele havia "perturbado seriamente a ordem social" com suas mensagens. As autoridades pediram que ele prometesse parar com o comportamento ilegal imediatamente. Caso contrário, seria indiciado.

Num post no Weibo, Li divulgou que foi obrigado a assinar a carta. No dia 1º de fevereiro, ele disse ter sido infectado com o coronavírus.

Desde 11 de janeiro, data do anúncio da primeira morte, até o momento, a China registrou mais de 630 mortes e mais de 30 mil pessoas infectadas.

Nesta sexta-feira, o Japão anunciou mais 41 casos do coronavírus a bordo do cruzeiro Diamond Princess. O país recusou a entrada de outro cruzeiro de luxo com o aumento dos casos no mundo.

Cingapura, por sua vez, aumentou o nível de alerta depois que o número de casos de coronavírus subiu para o mesmo nível que o país registrou na época da Sars: 33. Nesta sexta, o país confirmou três casos adicionais (incluídos nos 33) que não têm ligação com infecções anteriores ou com viagens à China.

RK/rtr/afp/ap

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